Por Marina Pinhoni e Patrícia Figueiredo, g1 SP — São Paulo


Pessoa realiza teste rápido de Covid-19 nesta segunda-feira (3), na Zona Oeste de São Paulo. — Foto: ALOISIO MAURICIO/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

Mesmo com o apagão de dados de casos e mortes por Covid-19 nas últimas semanas, outros indicadores apontam que a contaminação pela doença voltou a aumentar no estado de São Paulo. Internações, filas em postos de saúde e hospitais e testes positivos de Covid em farmácias cresceram nos últimos dias.

Desde que o Ministério da Saúde afirmou ter sofrido um ataque hacker em dezembro, estados enfrentaram dificuldades para extrair as informações sobre a doença dos sistemas oficiais.

Nesta terça-feira (4), o governo de São Paulo afirmou que a extração dos dados começou a ser normalizada. No entanto, especialistas afirmam que as informações represadas durante o período de instabilidade podem não ter sido divulgadas completamente. Para eles, os governos ainda estão em um "voo cego" no acompanhamento dos dados de Covid-19 (leia mais abaixo).

Enquanto o acompanhamento da tendência da pandemia por estes índices segue prejudicado, o aumento das internações e crescimento do fluxo de pessoas com sintomas gripais nos postos de saúde indica recrudescimento da doença. Na capital paulista, também há relatos de dificuldade para realização de testes nas farmácias.

A média diária de novas internações por suspeita ou confirmação de Covid-19 em enfermaria e UTI dobrou em um mês, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde computados pelo Censo Hospitalar. Na segunda-feira (3), foram 561 novas internações, contra 290 no dia 1º de dezembro de 2021. Embora seja menor do que os dos piores momentos da pandemia, o número já se aproxima do verificado em setembro de 2021.

A média do total de internados em UTI voltou a crescer no estado em dezembro após 6 meses de queda ininterrupta. Nesta terça-feira (4), 1.120 pacientes com suspeita ou confirmação de Covid-19 ocupam leitos de UTI no estado.

A média de pacientes internados em UTI havia caído mês a mês ao longo do segundo semestre de 2021. Em junho, havia 11 mil internados nessas unidades. O número passou para 3 mil em agosto, então para 1.600 em outubro, e 1.000 em novembro. Mas, segundo dados da Fundação Seade, desde o dia 22 de dezembro o índice voltou a crescer.

Índice de internações por Covid-19 no estado de SP volta a crescer após 6 meses de queda

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Os especialistas alertaram que, como o dado oficial considera pacientes internados em leitos de enfermaria ou UTI com suspeita ou confirmação de Covid-19, é possível que uma parte deles estejam com o vírus da gripe (Influenza) e sejam contabilizados na estatística de novas internações por coronavírus.

Normalização dos dados

Brasil vive apagão de dados oficiais sobre a Covid

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Embora o governo do estado alegue que já houve normalização dos dados, para os pesquisadores do Observatório Covid-BR, os números de casos graves (computados no sistema Sivep-Gripe) e leves (inseridos na plataforma E-SUS) ainda não estão disponíveis para consulta. Os pesquisadores, que fazem análises diárias destes dados, explicam que os números não são atualizados há 25 dias.

Por conta disso, os dados analisados pelo grupo são os do Censo Hospitalar, uma ferramenta criada pelo governo de São Paulo para complementar os dois sistemas oficiais do governo federal. Essa ferramenta permite obter informações sobre o fluxo de internados nas unidades de saúde, mas os dados não são detalhados o suficiente para análises mais precisas, explica Paulo Inácio Prado, pesquisador do Instituto de Biologia (IB) da USP e membro do Observatório Covid-19 BR.

“A grande maioria dos estados brasileiros não está publicando uma planilha confiável com os dados de Covid-19 desses dois sistemas oficiais do Ministério da Saúde, o E-SUS e o Sivep. Para São Paulo especificamente, o Censo Hospitalar até fala de hospitalização, mas não sabemos se pode ser um caso que ainda não foi testado e, posteriormente, acabou sendo positivo para Influenza e negativo para Covid-19", disse Prado.

O pesquisador destacou ainda a gravidade da falta de informações completas em meio a um período de agravamento da pandemia.

“Estamos em um voo cego, e isso é gravíssimo porque a gente teve, ou está tendo ainda, um surto de Influenza. Se a gente não souber quanto desses casos são Covid-19, como que a gente coordena ações?”, questionou.

Para o integrante do Observatório Covid-BR, o estado de São Paulo pode estar vivendo um aumento de casos leves, que não aparecem nos dados de hospitalização, em meio à propagação da variante ômicron.

“Um outro problema é que a ômicron, aparentemente, tende a ter menos casos graves, então pode ser que tenhamos muitos e muitos casos leves e a gente não está nem sabendo, porque a gente não tem o dado correto do caso leve, que depende de testagem. Além de não ter a normalização das bases, é lamentável a gente ter uma política de testagem tão pobre no estado mais rico do Brasil. Aqui, a testagem deveria estar na mesma casa da que é praticada em países europeus”, afirmou.

Dados represados

Profissionais da saúde atendem paciente com Covid-19 em leito na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital do bairro Imirim, na zona norte de São Paulo — Foto: MISTER SHADOW/ASI/ESTADÃO CONTEÚDO

Durante o período de instabilidade dos sistemas do Ministério da Saúde, o governo de São Paulo incluiu 7.642 casos novos, o que corresponde a uma média de 386 casos de Covid por dia, entre os dias 9 e 31 de dezembro.

Já entre os dias 1 e 4 de dezembro, foram reportados 2.581 casos novos, o que equivale a 645 casos por dia. Segundo a secretaria de estado da Saúde, neste período a extração de dado já havia sido normalizada.

No entanto, a média móvel de casos de Covid-19 registrada no estado às vésperas do apagão dos dados era maior do que a média durante o apagão e também à verificada após a normalização, com 1.005 dados reportados na média do dia 8 de dezembro.

Para os especialistas, essa diferença pode significar que os casos que ficaram represados durante o período de falha nos sistemas ainda não foram contabilizados. Isto porque o aumento nas internações dá indícios de que houve aumento também na média de casos confirmados por dia durante o período do apagão.

Profissional de saúde guarda amostra de teste de paciente com suspeita de Covid-19 em centro de testagem — Foto: Mauro Pimentel/AFP

Por telefone, a secretaria da Saúde de São Paulo disse que não é possível verificar se os dados represados ao longo do período de falha já foram contabilizados nos últimos dias, e que essa atualização depende do Ministério da Saúde.

Em nota, a pasta declarou que "não constatou hoje nenhuma anormalidade no funcionamento da API, nem no processo de extração dos dados de casos e óbitos do E-Sus e Sivep-Gripe" e que "o sistema federal Sivep-Gripe, onde todos os municípios do Brasil notificam os casos graves e óbitos de vírus respiratórios como Covid-19 e gripe, apresentou falhas de 9 a 31 de dezembro".

"A instabilidade prejudicou os Estados na extração e publicação dos dados notificados pelos municípios. Vale lembrar que SP concentra o maior volume de estatísticas de COVID-19 do país e, portanto, possui a maior base de dados para análise", completou o governo, em nota.

Hospitais cheios

Emergência de hospital particular em São Paulo cheia de pacientes com sintomas gripais, no dia 20 de dezembro. — Foto: Marina Pinhoni/g1

Hospitais públicos e privados da cidade de São Paulo têm registrado aumento no fluxo de pessoas com sintomas gripais nas últimas semanas, o que tem provocado filas e maior tempo de espera por atendimento. Em prontos-socorros municipais, pacientes afirmam que a espera pode chegar a 6 horas.

O Hospital Municipal da Brasilândia, referência no atendimento, registrava, nesta segunda (3), 71% de ocupação dos leitos de UTI e enfermaria.

Os hospitais São Camilo, Beneficência Portuguesa, Einstein e Santa Catarina confirmaram aumento repentino de pacientes. Ao menos sete cidades da Grande São Paulo montaram "gripários" para atender alta demanda de pacientes.

Procura por testes rápidos de Covid mais que dobrou no final de ano

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O crescimento de casos de Covid e de Influenza na capital nas últimas semanas também fez com que aumentasse a procura por testes nas farmácias. Muitas já estão sem kits para realizar os exames ou sem horários disponíveis no mesmo dia para agendamento.

Também aumentaram os diagnósticos positivos de Covid-19, segundo levantamento da Associação Brasileira de Redes de Farmácia. No dia 1º de dezembro, cerca de 5% dos testes rápidos apontavam resultados positivos. Já no dia 29 de dezembro, 20% dos resultados de testes realizados foram positivos para Covid.

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