RIO — A Justiça decretou as prisões temporárias dos três suspeitos de terem espancado até a morte o congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, de 24 anos, na semana passada, no quiosque Tropicália, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. Fábio Pirineus da Silva, o Belo, Aleson Cristiano de Oliveira Fonseca, o Dezenove, e Brendon Alexander Luz da Silva, conhecido como Tota, estão detidos desde terça-feira na Delegacia de Homicídios da capital (DHC). Imagens de câmera de segurança do quiosque mostram três homens espancando Moïse na noite do dia 24 de janeiro . O vídeo, obtido pelo GLOBO, flagra os agressores dando socos, chutes e até golpes com pedaços de pau no estrangeiro.
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As prisões foram decretadas no plantão judiciário noturno pela juíza Isabel Teresa Pinto Coelho Diniz, após pedido feito pela DHC. Os três foram flagradas por câmeras de segurança cometendo os crimes. Os homens foram transferidos no início da tarde desta quarta-feira para a Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica, e ficarão à disposição da Justiça.
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A promotora Bianca Chagas deu parecer favorável ao pedido de prisão e ressaltou a crueldade do crime:
"Frise-se, ainda, que as imagens comprovam toda a ação delituosa em seu mais alto grau de crueldade, perversidade e desprezo pela vida – o bem jurídico mais importante de todo ordenamento”, escreveu ela.
O trio de agressores foi identificado pelo proprietário do Tropicalia através de apelidos. O proprietário, que não estava no local no momento das agressões, cedeu as imagens de câmeras de segurança para a polícia e não teve participação no crime, de acordo com os investigadores.
Belo e Totta trabalhavam em barracas na areia da praia. Dezenove era funcionário do quiosque vizinho. Os três alegam que teriam agredido Moïse, que, segundo eles, já estaria embriagado, após o congolês tentar pegar cervejas da geladeira do Tropicalia. A vítima havia se refugiado no Brasil em 2011, fugindo dos conflitos armados que assolam a República Democrática do Congo há décadas.
Depoimentos citam que Moïse estava 'alcoolizado'
Os três presos prestaram depoimento ao longo da última noite e da madrugada desta quarta-feira na DHC, na Barra da Tijuca. Todos os três disseram que Moïse estaria alcoolizado e que tinha um histórico de confusões com outros funcionários e banhistas no local. Segundo eles, a briga foi iniciada pelo fato de o congolês querer consumir bebidas de graça e não por ter ido cobrar um suposto pagamento atrasado do dono do estabelecimento, conforme alega a família da vítima.
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Dezenove declarou que trabalhava com Moïse no quiosque Biruta. No depoimento, ele, que disse ser garçom e cozinheiro no estabelecimento, e aparece no vídeo da morte com uma camisa do Flamengo, afirmou que o congolês, que antes trabalhava somente para o Tropicália, passou a prestar serviço também para o Biruta três semanas antes do crime. Para justificar sua participação no espancamento fatal, ele disse que bateu em Moïse com socos e depois com um taco de beisebol para "extravasar a raiva que estava sentindo" do congolês, pois o estava "perturbando havia alguns dia". Após as agressões, ele contou ter ligado para o Samu, e permanecido no local, enquanto os demais autores fugiram.
Já Tota, que aparece nas imagens imobilizando Moïse com um mata-leão e depois amarrando os pés e as mãos da vítima, disse que conhecia o congolês de vista, pois trabalhava em uma barraca na areia, que seria de mesma propriedade dos donos do Biruta. Praticante de jiu-jítsu, ele se envolveu na confusão pois viu que Moïse tentava agredir Jaílton e saiu em defesa dele, usando suas técnicas de luta para imobilizar o congolês. Ele afirmou que ficou segurando o estrangeiro por cerca de oito minutos e que pedia para que Belo e Dezenove não o agredissem. Ele afirmou, ainda ter tomado a decisão de amarrá-lo para que Moïse não corresse atrás dele. Ao perceber que o congolês não respirava, Tota disse ter tentado reanimá-lo. Acreditando que uam equipe de socorro conseguiria ajudar Moïse, ele decidiu sair do local, só tomando conhecimento da morte no dia seguinte.
Por último, Belo, seguiu a mesma linha dos demais autores, dizendo que Moïse era usuário de drogas e consumia muitas bebidas alcoólicas. Fábio disse que estava em uma Kombi quando viu a confusão no quiosque Tropicália e pegou um taco de beisebol e foi até Moïse, iniciando as agressões. Em seguida, ele alegou ter dito para os demais pararem as agressões e foi embora do local.
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Outros depoimentos importantes foram os de um casal de namorados, que testemunhou o crime. A jovem, que aparece no vídeo das agressões, disse que foi ao local e viu Moïse apanhando do grupo e que, ao chegar perto, Dezenove a mandou se afastar do local e que uma moça que atendia no quiosque estava muito nervosa, e tinha pedido para os agressores pararem. Ela disse ter saído dali e chamado dois guardas municipais que estavam em ronda na praia, mas que eles não foram averiguar a denúncia.
Já o namorado da testemunha disse que, ao ver as agressões, tentou se aproximar do local, quando Tota teria dito para ele não olhar, pois Moïse seria ladrão e estaria praticando furtos na região. Mesmo assim, ele e a namorada se aproximaram e viram que a pulsação do congolês estava fraca, no momento em que os agressores chamaram socorro e tentaram reanimá-lo, sem êxito. No entanto, quando o Samu e a polícia chegaram, continuou a testemunha, Tota disse que não sabia o que havia ocorrido e que o corpo estava no local havia 40 minutos, fugindo pouco depois.
Na chegada à Delegacia de Homicídios, nesta quarta-feira, às 13h29, a comerciante Lavy Ivone contou ao GLOBO que não consegue assistir o vídeo em que o filho aparece sendo espancado .
— Eu vi pouco e não consegui acabar. Eu vou vendo devagar. Não imaginava que o meu filho apanhou tanto. Eu não imaginava. Eles bateram muito no meu menino — diz a mulher, que completa:
— É normal alguém ver uma pessoa apanhando e não fazer nada? Quando eu passo na rua e vejo uma pessoa passando mal, eu compro uma água para ajudar. Tento fazer alguma coisa. Vendo aquela cena (das pessoas batendo e outras assistindo) parece que indiretamente eles participam da morte do meu filho. Não me conformo — desabafou a cabeleireira, que foi à especializada para prestar depoimento.
Além dela, o irmão de Moïse, um tio e um primo também estão na DH para falar com a polícia.
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O congolês sofreu traumatismo do tórax, com contusão pulmonar, provocado por ação contundente, de acordo com laudo do Instituto Médico-Legal (IML). Moïse agonizou por dez minutos antes de morrer , avaliou um perito.
— O laudo e o vídeo demonstram que trata-se de uma vítima fatal de espancamento, com vários hematomas pelo corpo, e com uma repercussão grave das agressões no pulmão, o que causou uma hemorragia. Nesses casos, a aspiração do sangue leva a dificuldade respiratória, como em uma asfixia, e a morte não se dá de maneira imediata. Estima-se em dez minutos o tempo de sofrimento respiratório que o fez agonizar antes de morrer — explicou o perito Nelson Massini, professor titular de Medicina Legal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).