O podcaster Monark, perceptivelmente bêbado na transmissão em que defende a existência de um partido nazista legalizado, veio de cara limpa dizer que a cachaça o fez falar o indizível.
Na semana passada, os homens que espancaram Moïse Kabagambe até a morte tentaram se justificar com isto: a vítima andava bebendo demais e, por isso, havia se tornado ameaçadora.
São dois argumentos esfarrapados, capciosos para imputar na molécula CH₃CH₂OH –o álcool etílico– a responsabilidade de atos resultantes da estupidez e da maldade humanas.
É fácil botar na conta da cachaça estupros, agressões, crueldades, diarreias verbais. É socialmente aceito desde a descoberta da cerveja e do vinho.
Não pode mais ser assim.
Sem desdenhar das consequências nocivas dos excessos e da dependência química, é preciso reafirmar que substâncias não alteram o caráter de ninguém. Podem, e muito, despertar e assanhar demônios adormecidos ou reprimidos –mas que sempre estiveram lá.
A culpa não é da cachaça. Nem da maconha, da cocaína, de droga nenhuma.
A cachaça não induz ninguém a flertar com ideias que, sóbrio, considera absurdas.
Muita gente, aliás, bebe ou se droga justamente para fazer e dizer coisas que não tem coragem de fazer sóbria. Aí mora o perigo. É aí que dá merda.
Na outra ponta, a cachaça não transforma um rapaz boa-praça num superbandido que precisa de vários homens, um taco de beisebol e o anjo da morte para ser detido.
O efeito é o inverso: por mais que se torne um chato de galochas (efeito demasiado comum), o bêbado está fragilizado em sua ebriedade. Qualquer peteleco o põe a nocaute.
O mesmo vale para quem vê no crack o diabo, nos cracudos a podridão de caráter e, na cracolândia, um covil de degenerados. Será mesmo, meus considerados? Ou será que a sociedade toda está doente, e esse pessoal paga em dobro por isso?
Alguns tipos soltam os demônios no passeio de moto ou no clube de tiro. Culpar líquidos, ervas, comprimidos, pedrinhas e pozinhos pelo mal que a gente não consegue represar é moralismo hipócrita on the rocks.
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