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Bolsonaro faz comparação enganosa para atacar pesquisas de intenção de voto

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

10/02/2022 21h50Atualizada em 11/02/2022 06h56

O presidente Jair Bolsonaro (PL) fez uma alegação distorcida em sua live de hoje à noite para atacar a credibilidade de pesquisas de intenção de voto. Bolsonaro comparou os números de audiência de sua transmissão com os da live de aniversário do PT para alegar que, como seu público online era maior, isso significaria que as pesquisas "não batem com a realidade".

O presidente desconsiderou que pesquisas de intenção de voto são feitas com base em uma amostra da população que busca refletir a composição do eleitorado em todo o país, e que o universo de eleitores não é necessariamente o mesmo de usuários de internet. Há meses, Bolsonaro aparece em segundo lugar, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em levantamentos feitos por diferentes empresas. Leia a checagem:

Então, o líder das pesquisas com 50% tem 50 vezes menos assistindo a live dele do que a live nossa. É uma prova concreta de que isso é uma farsa. As pesquisas realmente não batem com a realidade."
Presidente Jair Bolsonaro

A declaração do presidente é distorcida, pois trata os dados citados de forma enganosa, dando a eles uma interpretação que confunde quem ouve as alegações.

"Vamos falar em números aqui, que números não dá para a gente distorcer. As nossas mídias sociais aqui, Facebook, YouTube, Instagram e Tiktok: 50 mil. Pingos nos Is e Jovem Pan News: 140 mil. Estou arredondando. Cento e noventa mil pessoas estão nos assistindo aqui. E para vocês que estão nos assistindo, quero fazer a propaganda agora do site do PT. No momento, o PT está fazendo uma live, aniversário do mesmo: 1.200 pessoas assistindo, contra 190 mil pro lado de cá. Isso dá 150 vezes", disse Bolsonaro antes de criticar as pesquisas.

O presidente citou estes números pouco antes de encerrar sua live, por volta das 19h40. Após o término de lives, as plataformas só deixam público o total de visualizações do vídeo, e não a evolução da audiência simultânea ao longo das transmissões. Mas mesmo partindo da premissa de que a audiência da live de Bolsonaro foi muito superior à do PT, não há qualquer sentido em usar tais dados para afirmar que, por causa deles, pesquisas de intenção de voto seriam "uma farsa".

Como o UOL Confere já mostrou, pesquisas de intenção de voto são feitas com uma amostra representativa do conjunto da população. Ou seja, as empresas entrevistam um grupo de pessoas cujas características (idade, gênero, escolaridade, entre outras) reflitam o eleitorado como um todo (veja mais sobre isso no site do Datafolha).

Os universos de pessoas que Bolsonaro mistura em sua fala — usuários de internet e eleitores — não são necessariamente iguais.

Segundo os dados mais recentes disponíveis no site do TSE, em janeiro, o Brasil tinha 147,1 milhões de eleitores. A idade mínima para ser eleitor é de 16 anos, e não há idade máxima para exercer o direito de votar (a obrigatoriedade vale para quem tem entre 18 e 70 anos).

O número de pessoas com acesso à internet no Brasil era maior: 152 milhões de pessoas, segundo a pesquisa TIC Domicílios divulgada em agosto. No entanto, a pesquisa levou em conta indivíduos de 10 anos ou mais.

Além disso, é possível que uma fatia importante do eleitorado esteja sub-representada entre os usuários de internet.

A pesquisa TIC Domicílios mostra que 32% dos domicílios com renda familiar até um salário mínimo e 15% dos domicílios com renda entre um e dois salários mínimos não tinham acesso à internet. E segundo a amostra da última pesquisa Datafolha, em dezembro, é justamente nestas faixas de renda que a maioria dos eleitores se encontra — 51% têm renda familiar mensal até dois salários mínimos.

Ou seja: não é possível considerar que o universo de usuários de internet no Brasil seja o mesmo de eleitores. Além disso, a participação na audiência de uma live é espontânea, e não há nenhum controle para que o público online sirva como uma referência do eleitorado como um todo.

A declaração distorcida de Bolsonaro ocorre em um período de desvantagem para o presidente nas pesquisas de intenção de voto.

Quatro pesquisas do Datafolha feitas entre maio e dezembro, com cenários diferentes de candidatos, mostram o ex-presidente Lula à frente de Bolsonaro (veja aqui, aqui, aqui e aqui). Com algumas diferenças nos percentuais, este panorama vem se repetindo neste ano, como mostram as pesquisas Genial/Quaest, PoderData, Paraná Pesquisas, Ipespe/XP, Modalmais/Futura Inteligência e Exame/Ideia.

Nos últimos meses, o UOL Confere publicou pelo menos duas checagens (aqui e aqui) em que apoiadores do presidente buscavam atacar a credibilidade de pesquisas. O Projeto Comprova, do qual o UOL faz parte, também desmentiu três boatos que buscavam colocar Bolsonaro em suposta vantagem em levantamentos de opinião pública (veja aqui, aqui e aqui).

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