Por Jéssica Sant'Ana e Jamile Racanicci, g1 e TV Globo — Brasília


O Ministério da Economia informou nesta sexta-feira (29) que a proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, se aprovada pelo Congresso, abrirá um espaço no Orçamento de 2022 de R$ 91,6 bilhões para novas despesas.

A PEC é uma das apostas do governo federal para viabilizar o Auxílio Brasil de R$ 400, programa social que deve substituir o Bolsa Família. O texto já foi aprovado na comissão especial da Câmara, mas ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado, com voto favorável de 3/5 dos parlamentares em dois turnos.

O lider do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), prevê que a votação na Casa aconteça na próxima semana. O feriado, no entanto, pode dificultar a obtenção do mínimo de 308 votos a favor da PEC.

De acordo com o material divulgado pelo governo, os R$ 91,6 bilhões incluem:

  • R$ 44,6 bilhões decorrentes do limite a ser estipulado para o pagamento das dívidas judiciais do governo federal (precatórios);
  • R$ 47 bilhões gerados pela mudança no fator de correção do teto de gastos, incluída na mesma PEC.

Segundo o ministério, o dinheiro será usado para:

  • ajuste dos benefícios vinculados ao salário mínimo
  • elevação de outras despesas obrigatórias;
  • Auxílio Brasil;
  • despesas de vacinação contra a Covid;
  • vinculações do teto aos demais poderes e subtetos.

Ainda de acordo com o Ministério da Economia, R$ 6 bilhões dessa "folga no orçamento" já serão consumidos por despesas que também estão vinculadas ao método de cálculo do teto de gastos – e, por isso, também serão revistas pela PEC.

Esses R$ 6 bilhões, pelo novo cálculo, vão para despesas em saúde e educação e para emendas parlamentares individuais e de bancada.

Segundo o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Esteves Colnago, cerca de R$ 50 bilhões vão para reforçar o orçamento do programa Auxílio Brasil, que vai substituir o Bolsa Família, e R$ 24 bilhões para ajustar os benefícios vinculados ao salário mínimo.

Cerca de R$ 10 bilhões poderão ser gastos "de acordo com as demandas da sociedade", segundo Colnago.

Ainda segundo Colnago, as alterações que estão sendo discutidas na PEC dos precatórios não têm relação direta com emendas de comissão e de relator.

O governo enviou o Orçamento de 2022 não prevendo recursos para emendas de comissão e de relator, mas o Congresso quer dinheiro para esses dois tipos de emendas.

"A discussão vai ser travada quando for discutido a formação do Orçamento final, com relator Hugo Motta [relator da PEC] e demais parlamentares", disse Colnago.

O secretário admitiu, porém, que o Congresso pode optar por usar parte dos R$ 10 bilhões que vão "sobrar" no novo espaço aberto no teto. Caso contrário, teriam que reduzir as despesas discricionárias (investimento e custeio da máquina pública).

"Pode tanto usar esse espaço que sobra, eventualmente esses R$ 10 bi supondo que não tenha mais despesa obrigatória e outras prioridades, como também pode reduzir nossas despesas discricionárias, que estão em torno de R$ 98 bilhões", explicou. "Vai ser uma decisão do Congresso", completou.

A PEC, ainda segundo o ministério, tem potencial de ampliar o espaço dentro do teto de gasto no Orçamento deste ano em R$ 15 bilhões. O dinheiro será usado para despesas de vacinação contra a Covid-19 ou "despesas relacionadas a ações emergenciais e temporárias de caráter socioeconômico".

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A proposta

Em linhas gerais, a PEC fixa um limite, a cada exercício financeiro, para as despesas com precatórios —dívidas da União já reconhecidas pela Justiça.

Além disso, a PEC altera a regra de correção do teto de gastos. Hoje, ao enviar o projeto de orçamento do ano seguinte ao Congresso, em agosto, o Executivo se baseia na inflação acumulada nos 12 meses anteriores (entre julho e junho).

Com a mudança, o governo passará a usar uma projeção da inflação entre janeiro e dezembro, o que, especificamente neste ano, permite ampliar os gastos. Essa alteração não estava prevista na PEC original, mas foi incluída como forma de "contornar" o teto de gastos.

A estimativa do relator, Hugo Motta (Republicanos-PB), é que as mudanças liberem quase R$ 84 bilhões para despesas no ano que vem, ano eleitoral. Na prática, a proposta abre margem para o governo contornar o teto de gastos, aprovado em 2016.

Técnicos do Congresso já calculavam que esse espaço orçamentário em 2022 pode ser ainda maior.

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Segundo estimativas dos técnicos do Congresso, cerca de R$ 50 bilhões seriam usados para turbinar o Auxílio Brasil, entre R$ 16 bilhões e R$ 20 bilhões para correção dos benefícios previdenciários atrelados ao salário mínimo e o restante para encorpar emendas parlamentares, como as de relator, criticadas pela falta de transparência e de paridade entre os congressistas, e para o fundo eleitoral.

A divisão exata do espaço liberado pela PEC no teto de gastos só será definida na votação do Orçamento de 2022.

Trajetória 'preservada'

Na primeira entrevista após a nomeação como secretário especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Esteves Colnago disse que a trajetória fiscal está preservada, mesmo que a PEC dos precatórios seja aprovada.

Especialistas em contas públicas afirmam que a PEC fragiliza o arcabouço fiscal brasileiro, além de ser "casuística", ou seja, pensada para viabilizar mais gastos em 2022, ano eleitoral.

"Quero deixar muito claro que a trajetória [fiscal] está preservada. O teto de gastos e as medidas fiscais adotadas por diversos governos e equipes técnicas estão mantidas", afirmou Colnago, que foi ex-ministro do Planejamento do governo Temer.

O governo Temer foi o responsável por propor ao Congresso a criação do teto de gastos, sinalizando ao mercado o compromisso com o controle dos gastos públicos. O teto foi aprovado em 2016 e entrou em vigor em 2017.

Também nomeado oficialmente nesta sexta, Paulo Valle, secretário do Tesouro Nacional, disse que os "fundamentos do teto" estão plenamente mantidos. Ele admitiu que a mudança na regra de cálculo do teto de gastos gera um impacto, mas disse que "não há prejuízo".

Questionados sobre a possibilidade de a PEC dos Precatórios não ser aprovada, Colnago afirmou que o Ministério da Economia não trabalha com outra possibilidade.

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