Loggi demite 15% dos funcionários após estagnação do comércio eletrônico

Startup de logística reestruturou o negócio diante de cenário global difícil; ‘unicórnio’ também anunciou troca no comando

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Por Bruno Romani
Atualização:

A Loggi é o mais novo ‘unicórnio’ (startup avaliada acima de US$ 1 bilhão) nacional a fazer demissões em massa. A startup especializada em logística desligou 15% dos 3,6 mil funcionários na manhã desta segunda, 8. Toda a companhia foi afetada pelo corte, incluindo as áreas operacional, administrativa e de tecnologia - as informações foram reveladas ao Estadão por Fabien Mendez, CEO e cofundador da companhia.

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“O mundo e o Brasil foram atormentados por grandes forças contrárias em 2022. Tivemos a volta da inflação, que foi amplificada pela guerra na Ucrânia, o colapso das bolsas de valores e o espectro de uma recessão global. Essas forças, que parecem distantes, estão tendo um impacto muito grande em nosso negócio “, diz o executivo francês à reportagem.

Mendez diz que a volta da inflação está causando estagnação no comércio eletrônico, o que impacta diretamente os negócios da Loggi, que se especializou na entrega de pacotes de vendas online - a companhia está presente em 4 mil municípios brasileiros. O executivo diz que, até fevereiro deste ano, o setor conseguiu operar com crescimento. Segundo ele, a estagnação se instalou e permaneceu inalterada a partir de abril.

Em novembro do ano passado, a companhia inaugurou um galpão de entregas em Cajamar (SP) de R$ 150 milhões - a previsão é que a instalação processaria 1 milhão de pacotes por dia até 2023. Esses números, porém, foram revistos.

Monica Santos, diretora de recursos humanos da Loggi, diz que os demitidos terão um pacote de benefícios, incluindo três meses do plano de saúde, incluindo dependentes, três meses de Zenklub para apoio psicológico, serviço de recolocação no mercado e flexibilização nas condições de participação de ações da empresa para funcionários que tinham pouco tempo de casa.

Essa não é a primeira vez que a Loggi realiza desligamentos em massa. A empresa passou por momentos de incerteza no início da pandemia, o que rendeu até 120 demissões em março de 2020. Com o desenrolar dos meses, porém, a empresa começou a crescer em ritmo acelerado. Um ano depois, a companhia levantou US$ 212 milhões, maior captação já realizada pela empresa.

Agora, a ideia da companhia é preservar os fundos levantados em sua última rodada de investimentos. Mendez promete que a companhia não terá novos cortes - algumas startups nacionais continuaram demitindo “à conta gotas” depois de grandes rodadas de desligamentos. O executivo também afirmou que, a partir de agora, a companhia será muito rigorosa em eventuais novas contratações.

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Fabien Mendez, fundador da Loggi, deixa o cargo de CEO para assumir o conselho da companhia  Foto: Divulgação


Loggi troca liderança

Além das demissões, a Loggi anunciou mudanças no comando da companhia. A partir desta terça, 9, Thibaud Lecuyer assume a cadeira de CEO - na empresa desde outubro de 2019, o francês era o diretor financeiro da companhia.

Já Fabien Mendez assumirá a presidência do conselho da companhia. “É um movimento que permitirá alavancar as forças de cada um. No meu caso, isso significa espírito empreendedor, pensamento estratégico, visão de longo prazo. E isso nos permite fazer emergir talentos que nutrimos dentro da empresa”, explica o fundador da companhia.

Na chegada, o novo chefe diz à reportagem quais são suas prioridades. “ Primeiro, vamos cuidar dos nossos funcionários. Segundo, vamos cuidar de nossos clientes, que confiam bastante na gente. As demandas no comércio eletrônico estão mudando, então precisamos ajudar a eles a se adaptarem. Em terceiro lugar, vamos melhorar nossa eficiência operacional”, diz Lecuyer.

“Thibaud é um executor muito focado e é um veterano do mercado de comércio eletrônico”, diz Mendez de seu sucessor.

Crise é severa entre gigantes

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Conhecidas por contratar centenas de funcionários ao mês, as startups têm realizado centenas de demissões pelo mundo — o fenômeno não é exclusivo do Brasil. O período tem sido batizado de “inverno das startups”, após a onda positiva causada pela digitalização da pandemia nos últimos dois anos.

Segundo especialistas consultados pelo Estadão nos últimos meses, as demissões ocorrem como reajuste de rota em meio à alta global nos preços e à guerra da Ucrânia, que desorganiza a cadeia produtiva mundial. Nesse cenário, investidores viram as costas para investimentos de risco, como startups. Com isso, levantar rodadas tem sido mais difícil do que durante a pandemia, quando a fonte do capital parecia infinita.

O processo tem sido especialmente duro com as startups maiores, que estão no momento conhecido como “late stage”. Nesse estágio de maturidade, as empresas queimam dinheiro velozmente na tentativa de crescer e ganhar mercado - sem o dinheiro, elas precisam preservar caixa para sobreviver.. Entre os unicórnios nacionais que já fizeram demissões em massa em 2022 estão QuintoAndar, Loft, Facily, Vtex, Ebanx, Mercado Bitcoin e Olist. A mexicana Kavak, maior unicórnio da América Latina, também fez cortes severos na operação brasileira.

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Fundos de investimento alertaram as startups sobre o cenário desafiador nos primeiros meses do ano. O investidor Masayoshi Son, presidente do SoftBank, um dos maiores investidores de startups no Brasil e investidor da Loggi, disse que o conglomerado japonês deve reduzir os investimentos em empresas de tecnologia neste ano.

Além do SoftBank, a aceleradora Y Combinator, uma das mais conhecidas no Vale do Silício, recomendou que as startups reavaliassem suas finanças e que ficassem prontas para cortar gastos. A medida, de acordo com a aceleradora, é uma forma de prever até 24 meses sem investimentos. “Crises econômicas geralmente se tornam grandes oportunidades para os fundadores que mudam rapidamente sua mentalidade, planejam com antecedência e garantem que sua empresa sobreviva”, afirmou a gestora na carta.

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