Por Carolina Dantas, g1


Montagem com fotos do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips — Foto: Divulgação/Funai e Reprodução Twitter/@domphillips

A terra indígena Vale do Javari, região na qual estão desaparecidos Bruno Araújo Pereira, indigenista brasileiro e funcionário da Fundação Nacional do Índio (Funai), e o jornalista inglês Dom Phillips, do jornal "The Guardian", tem histórico de assassinato de um outro agente órgão federal e é palco de conflitos típicos da Amazônia: tráfico de drogas, roubo de madeira e avanço do garimpo.

A Vale do Javari fica na fronteira com o Peru e a Colômbia e está localizada no Amazonas. São 8,5 milhões de hectares demarcados, sendo a segunda maior terra indígena do país - a primeira é a Yanomami, com 9,4 milhões de hectares.

Além disso, tem a maior concentração de povos isolados do mundo, com acesso restrito por vias fluviais e aéreas.

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Insegurança constante

Bárbara Arisi, antropóloga e professora da Vrije Universiteit Amsterdam, trabalha com a Vale do Javari desde 2003. Ela estudou com os Matis, povo indígena da região, e aprendeu a língua Pano, original da população. Segundo ela, assim como entre os Yanomamis, a terra indígena do Vale do Javari está "sofrendo vários ataques".

"Há essa insegurança para as pessoas que trabalham lá, que vivem lá, principalmente pros povos indígenas e também para as pessoas que circulam, sejam elas indigenistas, jornalistas, pessoal de ONG que trabalha nessa região", explica.

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Em 2014, Arisi foi picada por uma cobra em meio à terra indígena e Pereira era coordenador da regional da Funai. Ele foi um dos que ajudou a salvar a vida da professora e dirigiu por mais de 25 km até um hospital geral em "péssima estrada", como descreve a antropóloga em artigo publicado no jornal "O Estado de S.Paulo".

Ao g1, a antropóloga disse que teme que Pereira tenha tido o mesmo fim que outro servidor da Funai: Maxciel Pereira dos Santos. Em setembro de 2019, época em que trabalhava no Vale do Javari, o homem foi assassinado em Tabatinga, no Amazonas. Ele dirigia uma motocicleta quando foi baleado com dois tiros na cabeça. Até hoje o crime não foi solucionado.

Arisi explica que a "sensação de impunidade na região" tem aumentado recentemente e, por isso, aguarda uma resposta com relação aos dois desaparecidos.

"Às vezes pode ser motivado por uma cobiça de pequeno nível, não empresarial, como é em geral, como é com garimpo. Mas pode ser de tudo. É tanto interesse ruim em jogo para destruir a Amazônia, que infelizmente pode ser de tudo", explica.

Tráfico de drogas e roubo de madeira

Antenor Vaz é indigenista, tem mais de 35 anos de experiência, e é consultor para povos isolados da América do Sul. É um conhecedor do Vale do Javari e explica que existem forças mais latentes recentemente: tráfico de drogas e roubo de madeira.

"A maioria das drogas sai do Peru, mas aí elas vão pra Colômbia e também para o Acre e para aquela região. Para sair, elas têm que cruzar a terra indígena, que é supostamente a área mais segura pros traficantes".

Além disso, ele conta que recentemente garimpeiros invadiram o território e chegaram a oferecer bebidas alcoólicas para as populações, incluindo uma mistura com gasolina.

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Além da hipótese de assassinato ou sequestro do jornalista estrangeiro e do indigenista, Vaz explica que é possível que Pereira, por ser experiente na região, pode ter ido por um "furo", um atalho pelo rio para corta caminho. Assim, eles podem estar perdidos e sem contato.

"Ou pode ser sequestro por parte desse crime organizado que envolve madeira, ouro, pesca e tudo", complementa. Segundo informações da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Pereira recebia constantes ameaças de madeireiros, garimpeiros e pescadores.

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