Economia
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Por Glauce Cavalcanti e Carolina Nalin — Rio

O Brasil vem sobrevivendo a uma "pena de morte" ao se referir à alta taxa de juros no país, afirma o economista americano Joseph Stiglitz, ganhador do Nobel de Economia em 2001. Ele foi um dos críticos que fizeram coro pela redução da Selic, às vésperas da reunião do Banco Central para decidir a nota taxa.

— É chocante a (taxa de juros) de vocês. Os números de 13,75% ao ano, ou de 8% de taxa real, são do tipo de taxa de juro que vai matar qualquer economia. Na verdade, o impressionante no Brasil é que o país sobreviveu ao que seria de fato uma pena de morte.

Ele participa do seminário realizado pelo BNDES na manhã desta segunda-feira. O evento é organizado pelo banco, Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e Fiesp.

Para Stiglitz, as políticas macroeconômicas precisam ser acertadas ou não deixam espaço "para fazer mais nada". A razão para o Brasil estar sobrevivendo à "pena de morte" da taxa de juro nas alturas viria principalmente do fato de o país contar com bancos de desenvolvimento estatais.

— Historicamente, o Brasil teve taxas e juros mais altas que a média mundial, o que deu uma desvantagem competitiva ao país que tem de compensar isso com inovação e mais empreendedorismo — frisa o economista.

O dilema da inflação

Ele vai ainda além, dizendo que, caso o Brasil tivesse uma outra política monetária, estaria em um patamar de crescimento econômico muito maior. Ou seja, explica Stiglitz, esse teria sido um dos fatores que levaram a um desempenho fraco da economia nos últimos tempos.

A justificativa de que a alta de juros é ferramenta para frear a inflação, continua o economista, funciona de forma paradoxal.

— Na verdade, essas altas taxas de juros são contraproducentes e estão exacerbando a inflação — frisa.

A alta das taxas de juro, continua ele, não se justifica como resposta adequada ao crescimento da inflação.

— Mesmo no contexto do Brasil, com posição fiscal muito ruim. Não há caso em que se possa fazer isso, um lado fiscal aumentando a taxa de juros. É contraproducente. Isso custa para o governo, nas dívidas, faz com que os custos de serviços sejam maiores também — sustenta ele, que defende a redução da Selic, às vésperas da reunião do Banco Central para definir a nova taxa.

James Galbraith, da Lyndon B. Johnson School of Public Affairs, lembra ainda que as taxas elevadas de juros têm efeito profundo sobre distribuição de renda, além de ampliar a dívida do governo e conter investimentos por parte das empresas, avalia. Ele participou por videoconferência do seminário realizado pelo BNDES.

O economista, que realizou uma leitura sobre a economia brasileira e teceu perspectivas para o crescimento, disse que o país enfrenta baixo crescimento, desemprego elevado e queda do investimento público. Segundo ele, uma taxa mais baixa é indispensável para pensar em crescimento econômico:

— É uma taxa altíssima de juros. E taxas como essa tem efeito profundo sobre distribuição de renda, aumentando a riqueza daqueles que já tem e ampliando a desigualdade de uma sociedade que já é desigual. Isso também aumenta a dívida e contém investimentos. Juros são custos para os negócios, algo que acaba sendo repassado para o consumidor.

'Dinheiro para mais ricos'

O debate sobre a alta da taxa de juros passa pelo problema do desenvolvimento sustentável de longo prazo, porque reduz os recursos disponíveis no governo que deixa de fazer aportes em educação, tecnologia e em outras frentes que colaboram para aumentar o cresicmento econômico.

- Nesse sentido, mesmo pensando no cenário fiscal, aumentar a taxa de juros também será contraproducente. Então essa elevação não pode ser defendida sobre essas bases. Uma consequência séria, porque tem a justificativa de que os credores são aqueles que têm dinheiro, é que o dinheiro vai para os mais ricos, exacerbando um dos problemas mais antigos do Brasil, que é essa diferença a qualidade de vida - destaca o economista.

Na visão dele, o que está demonstrado é que "política de juros e austeridade exacerbam o problema fiscal".

Banco Central define a cada 45 dias a taxa básica de juros  — Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo
Banco Central define a cada 45 dias a taxa básica de juros — Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo

BC no Brasil é ' excessivamente independente'

Em um momento em que o debate sobre a independência do Banco Central tem ocupado os holofotes, como o presidente Lula criticando os rumos da política financeira, Stiglitz avalia que parte do problema do Brasil é que "herdamos um Banco Central excessivamente independente".

- Mesmo num mundo de bancos centrais independentes, temos uma noção de responsabilidade forte. Tem de justificar o que faz para a sociedade. O banco central independente, sem representação das pessoas e olhando só para a inflação não é o melhor refletindo o bem-estar da população como um todo - defende.

No caso do Brasil, ele reforça a importância da reforma tributária, com uma estrutura de tributos que não apenas reflita os valores da sociedade, mas que ajude a levar a economia adiante, com impostos que ajudem na promoção do crescimento com sustentabilidade.

Stiglitz sustenta que situações como a da pandemia da Covid-19 deixaram claro que o mercado não dá conta de resolver problemas societários sozinho. Daí, a necessidade de haver ações coletivas, de políticas públicas, incluindo os bancos centrais.

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