RIO — Um novo relatório divulgado pelo Observatório do Clima demonstrou que as emissões brasileiras de gases de efeito estufa caíram 2,3% em 2017 em relação ao ano anterior, passando de 2,119 bilhões para 2,071 bilhões de toneladas.
Um dos principais motivos para essa retração foi a fiscalização acirrada do Ibama sobre o desmatamento na Amazônia, que recuou 12% em apenas um ano. No Cerrado, porém, o resultado foi o oposto — a devastação aumentou 11%. Isso impediu uma queda ainda maior no índice total de emissões do país.
Ane Alencar, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e uma das autoras do estudo, ressalta que a redução das emissões "não foi tão baixa quanto gostaríamos":
— Ainda temos a maior taxa de desmatamento de florestas e outros tipos de vegetação nativa no mundo. É um dado alarmante e preocupante.
Os primeiros sinais de recuperação da economia, após dois anos de recessão, provocaram um aumento nas emissões de outras áreas. Foi o que aconteceu, por exemplo, no setor de energia, sobretudo no transporte (de carga e individual de passageiros) e na geração de eletricidade.
O setor de resíduos sólidos — que tem, entre seus destaques, o lixo urbano — também viu as emissões crescerem com a retomada econômica. Reduzir as emissões provocadas por esses resíduos implicaria em medidas como aumentar a cobertura do saneamento básico, o que tem ocorrido em um ritmo lento.
O aumento do PIB também faz o brasileiro consumir mais carne e, assim, cresce o abate bovino, reduzindo as emissões ligadas à agropecuária.
— As emissões diminuíram sem cair a renda do agronegócio. Isso quer dizer que o crescimento econômico não impede a produtividade no campo — destaca Tasso Azevedo, coordenador técnico do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg), do Observatório do Clima. — Se aumentarmos o número de cabeças de gado por hectare, podemos pegar áreas de pastagem e usá-las na agricultura. Depois recuperamos as áreas degradadas e elas são novamente transformadas em florestas.
As mudanças de uso da terra correspondem a quase metade da liberação de poluentes do país. O desmatamento também é o motivo para o brasileiro ter uma emissão per capita maior do que a média mundial — aqui, são dez toneladas de CO2 por habitante; no planeta, 7,1 toneladas de CO2.
— Entre 2015 e 2016, o Ibama conseguiu recompor parte do orçamento com os recursos provenientes do Fundo Amazônia, cuja principal fonte é o governo norueguês. Precisamos continuar com esta fiscalização para reduzirmos o desmatamento — reivindica Azevedo, que é professor do Instituto de Física da USP. — Neste relatório, fazemos uma avaliação técnica sobre as emissões, não é a hora de fazermos uma análise política. Mas há ministros do governo Bolsonaro posicionando-se contra o Fundo. Com isso, pode ser que as emissões cresçam novamente nos próximos anos.
O relatório destaca que, somando-se as emissões indiretas, por desmatamento, e as diretas, principalmente pelo metano do rebanho bovino, o agronegócio responde por 71% das emissões totais do país: "Se fosse um país, o agro brasileiro seria o oitavo maior emissor do mundo, à frente do Japão".
Azevedo destaca que a concentração das emissões em um setor da economia pode trazer muitas oportunidades.
— Não há nenhum país do mundo com tanta possibilidade para seguir a economia de baixo carbono — sublinha. — Temos o maior potencial de produção de energia solar, eólica e hídrica. As florestas e bacias hidrográficas contribuem para o cultivo agrícola. Investir nesses recursos é um bom negócio.
Membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Paulo Artaxo ressalta que a redução das emissões constatada no estudo ainda é insuficiente para impedir que o aumento da temperatura global permaneça em um nível considerado tolerável.
— Se as emissões não forem reduzidas, a previsão é que a temperatura aumente de seis a oito graus Celsius — alerta. — Limitar esse movimento requer uma transição sem precedentes em todas as áreas, como energia, urbanização, infraestrutura e indústria, mas principalmente na agricultura. E ainda não temos a resposta sobre como isso será feito.
No Acordo de Paris, o governo brasileiro se comprometeu a reduzir, até 2025, as emissões de gases estufa em 37%, em relação aos níveis de 2005. Segundo Azevedo, o país deverá se esforçar para cumprir o que foi prometido:
— Estamos na marca do pênalti. Qualquer suspiro no desmatamento nos desviará da meta.