Rio

Familiares enterram, neste domingo, vítimas de operação policial no Fallet Fogueteiro

Doze velórios foram agendados para este domingo no Cemitério São João Batista
Velórios acontecem no Cemitério São João Batista Foto: Thiago Soares
Velórios acontecem no Cemitério São João Batista Foto: Thiago Soares

Chacina e massacre foram as palavras usadas pelos moradores dos morros do Fogueteiro e Prazeres que estiveram, neste domingo, no Cemitério São João Batista, para enterrar os amigos e parentes mortos durante a operação policial realizada na última sexta-feira. Com 12 velórios programados, as capelas tiveram que ser compartilhadas. E em mais de um caso, uma mesma família chorou mais de uma perda.

Ao lado da capela onde eram velados Vitor Hugo Santos Silva e Roger dos Santos Silva, a família de Maikon e de David Vicente da Silva lamentavam. Na sala seguinte, estavam os primos Felipe Guilherme Antunes e Enzo Souza Carvalho.

— Eles foram executados, não tiveram chance de nada — disse um parente de Roger e Vitor Hugo: — A gente sabe que eles estavam em más companhias, mas eles se renderam. Como isso pode ser uma troca de tiros se nenhum policial sofreu nada?

Segundo moradores, todas as vítimas tinham entre 15 e 22 anos, reforçando a desconfiança da versão apresentada pela polícia.

— Eles querem acabar com uma geração antes que eles possam virar chefes do tráfico, mas não é assim que se faz as coisas. Cadê as escolas, os orfanatos, os programas sociais?

Sob um sol escaldante, as roupas pretas usadas contrastavam com cartazes coloridos confeccionados para denunciar a ação da polícia e esconder os rostos de quem tem medo de represálias. Os dizeres acusavam a existência de um "tribunal da morte da PM" e pedidos de paz.

Segundo parentes e vizinhos dos irmãos Maikon e David, os dois estavam dormindo em casa quando foram abordados pelos policiais.

— Eles encontraram um baseado, e começaram a esculachar os meninos, deram tiro na perna. A gente ouviu, mas não podia fazer nada, senão viriam para cima da gente — disse um vizinho.

A avó dos dois contou que, dias antes, o neto relatou que queria mudar de vida e casar com a namorada:

— Dias antes de morrer, ele me disse: "não se aperreia não, vó, a gente não fez nada de errado. Não vai acontecer nada com a gente". E hoje estou chorando pelos meus netos. Quantas mães mais vão precisar passar por isso?

A mãe de outro rapaz morto na sexta-feira contou que o filho estava com afundamento no crânio, e teve a barriga aberta por uma faca. Ela ainda denunciou o assédio policial depois do ocorrido, em visitas feitas a sua casa.

— Eles jogaram spray de pimenta no meu mais novo, que só tem 8 anos. E ainda zombaram, dizendo: bem-feito que o irmão dele morreu.

Ainda segundo moradores dos morros, policiais militares estiveram, neste domingo, na porta do São João Batista, fotografando quem compareceu aos velórios. Para amanhã, outros dois enterros estão programados, de jovens cujos corpos foram resgatados na mata por moradores. Embora o número oficial seja de 13 mortos, nas contas dos moradores são ao menos 16.

A mãe de Mateus Diniz, que tinha 22 anos e dois filhos pequenos, contou que foi a nora quem sentiu a falta dele. As duas então peregrinam pelo Hospital Souza Aguiar e pelo Instituto Médico Legal, sem sucesso. Foi quando os moradores se organizaram para buscar os corpos na mata, onde dois rapazes foram encontrados.

— Todo dia que tem operação é isso. Mas essa não é a solução. Mesmo no caso de um criminoso: lugar de bandido é na cadeia, não no cemitério — disse o amigo de uma das vítimas.