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União Europeia cria grupo de contato com objetivo de promover eleições na Venezuela

Ao contrário de EUA e de vizinhos americanos, bloco de países não reconheceu Juan Guaidó presidente interino do país
Federica Mogherini durante uma coletiva de imprensa em Bruxelas no dia 21 de janeiro de 2019 Foto: JOHN THYS / AFP
Federica Mogherini durante uma coletiva de imprensa em Bruxelas no dia 21 de janeiro de 2019 Foto: JOHN THYS / AFP

BUCARESTE - Ao fim de uma reunião em Bucareste para discutir a questão da Venezuela, a diplomata chefe da União Europeia, Federica Mogherini, afirmou que a União Europeia vai criar um grupo de contato para lidar com a crise na Venezuela, com o objetivo de levar a eleições livres e democráticas no país.

Em coletiva depois da reunião dos ministros das Relações Exteriores europeus, ela anunciou também que o Grupo de Contato Internacional, como foi chamado, será composto por países europeus, latino-americanos e pela UE.

Caso não haja progressos, o grupo será encerrado em 90 dias. Ela afirmou que o bloco europeu está preparado para aplicar mais sanções econômicas contra a Venezuela, caso não haja progressos.

— O objetivo, eu quero sublinhar, é claramente não abrir uma mediação formal, não abrir um dialogo formal, mas apoiar uma dinâmica política que o grupo possa então acompanhar e consolidar — afirmou. — O grupo ajudará a construir confiança e criar as condições que são necessárias para os venezuelanos determinarem o seu próprio futuro por meio da realização de novas eleições, com todas as garantias para um processo eleitoral livre e justo, supervisionado por observadores independentes.

Na coletiva, Mogherini anunciou que, ao contrário de Estados Unidos, Brasil e de mais 14 países das Américas, o bloco de 28 países não reconheceu Juan Guaidó como presidente interino do país sul-americano. O líder opositor se declarou chefe de Estado "encarregado" na semana passada, com o apoio da Assembleia Nacional.

Mogherini alegou que o reconhecimento não é prerrogativa europeia e que depende de cada Estado-membro fazê-lo. O reconhecimento exigiria uma posição consensual sobre o assunto, e o não reconhecimento sugere que há divisão sobre o tema.

A UE pretendia criar um grupo de contato com a Venezuela desde outubro, que nunca veio a existir. O bloco de países pretendia lançar a atual iniciativa em fevereiro, mas, em função do agravamento da crise, decidiu adiantá-la.

O prazo, segundo Mogherini, é para evitar que Maduro use o grupo "para ganhar tempo". Os europeus, ela acrescentou, buscam "criar confiança e as condições para que surja um processo confiável" que leve a eleições.

Na coletiva, Mogherini afirmou UE, Espanha, Portugual, Itália, Holanda, Alemanha, França, Suécia, Reino Unido, do lado europeu, e Equador, Uruguai, Costa Rica e Bolívia integrarão o grupo. Ela disse ainda que aguarda confirmação de "alguns" outros países latino-americanos, que espera confirmar nos próximos dias.

Ela disse esperar que a próxima reunião possa acontecer já na primeira semana, na América Latina, em nível ministerial. Mogherini disse também que a UE está disposta a aumentar a ajuda humanitária à Venezuela e aos países vizinhos.

Em decisão mais cedo, o Parlamento Europeu aprovou uma resolução em Bruxelas que reconhece Guaidó como presidente interino. A decisão contou com 439 votos a favor, 104 contra e 88 abstenções. O texto é não vinculante, isto é, os 28 Estados-membros da União Europeia não têm obrigação de segui-lo, e tem um caráter sobretudo simbólico, como instrumento de pressão sobre Maduro.

Nesta quinta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, fez uma crítica a países que falam em diálogo e grupo de contato como solução para a crise venezuelana, dirigindo-se indiretamente a Uruguai e México e aos europeus. Segundo Araújo, ao apostar em uma saída negociada entre o presidente Nicolás Maduro e Guaidó, esses países, "inconformados", acabam dando sobrevida à ditadura venezuelana.

A linguagem cautelosa da UE  pode ser atribuída à resistência dos dois lados a uma negociação. Maduro e seus ministros têm dito nos últimos dias que aceitam o diálogo, mas o próprio Maduro excluiu a possibilidade de convocação de eleições. Já Guaidó reafirmou nesta quinta que "nunca mais" a oposição participará de um "falso diálogo" com o governo, em uma referência às negociações fracassadas realizadas no ano passado na República Dominicana.

Eleições, de toda forma, representariam um desafio para os dois lados. A popularidade de Maduro está em 20%, e 78% querem que ele deixe o poder, de acordo com uma pesquisa realizada na semana passada em cinco cidades venezuelanas pelo instituto Idea Big Data. Já a oposição, embora atualmente unida pela liderança interna de Guaidó, tem dificuldades históricas de unificar-se para disputas eleitorais.

A possibilidade de qualquer diálogo que permita a Maduro continuar no poder, ainda que como parte de um processo de transição, também foi criticada pelo governo dos Estados Unidos e pelo secretário-geral da OEA, Luis Almagro.

— O oferecimento de mediação é ridículo porque essa não é uma questão para ser negociada entre duas partes, a questão é redemocratizar o país — disse. — A negociação do fim fa usurpação é a negociação que precisa ser feita.

Sob a condição de anonimato, um funcionário do governo americano disse a jornalistas que uma dúzia de funcionários do governo Maduro estava no caminho da transição e que a única conversa possível era sobre como ajudá-los a sair do país.