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Política

'O presidente não deveria ver pessoas que pensam diferente como inimigas', diz Ilona Szabó

Depois de conversa com presidente, Moro 'sentiu que não dava para manter nomeação', diz cientista política
Cientista política Ilona Szabó. 02/08/2018 Foto: Marcelo Régua / Agência O Globo
Cientista política Ilona Szabó. 02/08/2018 Foto: Marcelo Régua / Agência O Globo

BRASÍLIA — Uma das principais especialistas em segurança pública do país, a cientista política Ilona Szabó aceitou a missão recebida do ministro da Justiça, Sergio Moro , de integrar o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). Sua permanência no colegiado, no entanto, durou pouco mais de 24 horas. Crítica da liberação de armas à população, uma das principais bandeiras dos grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, ela foi desconvidada do cargo por Moro, após o próprio presidente ter interferido no assunto nesta quinta-feira. “Senti uma certa decepção ao ver que a opinião de grupos extremos tem um impacto tão grande na opinião do presidente da República, que é o presidente de toda a população", disse Ilona ao GLOBO. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Quem fez pressão para sua saída?

Tem grupos que são opostos a uma agenda de segurança pública baseada mais em evidências. Grupos que estão mais a favor da liberação completa de armas. Que não aceitam diferentes ideias. Grupos que têm opiniões radicais e não estão abertos a pessoas que pensam diferente.

O presidente pediu sua saída?

O que eu sei, pela conversa que tive com o ministro Moro, é que sim. Teve uma conversa entre ele e o presidente e ele (Moro) sentiu que não dava para manter a minha nomeação. Como foi essa conversa e o teor dela eu não sei. Para mim, o que eu lamento, é que a gente não deve ver pessoas que pensam diferente como inimigas. O presidente não deveria ver pessoas que pensam diferente como inimigas. Acho que a tolerância precisa ser mote de um governo que tem tantos desafios pela frente.

Qual foi sua reação ao saber que estava sendo excluída do conselho?

Eu lamentei muito porque ganha a polarização e perde o Brasil. A construção democrática que a gente tanto precisa para este país. Senti uma certa decepção ao ver que a opinião de grupos extremos tem um impacto tão grande na opinião do presidente da República, que é o presidente de toda a população.

O ministro Moro ligou para você?

Sim, ele me ligou. Temos uma relação de bastante respeito. A gente sabe que temos muitas convergências de agenda. Nosso diálogo continua independente dessa nomeação para o conselho. O que ele está tendo que voltar atrás é de voltar atrás a um convite por causa da pressão de grupos extremos da base do presidente da República. Mas nosso compromisso é continuar o diálogo. Ambos acreditamos que só diálogo e o trabalho conjunto vai nos tirar de tantas crises.

Você era a única mulher do conselho.

Em geral, a representação feminina nesse governo é muito baixa. Certamente eu tinha uma responsabilidade a mais, por ser mulher, para abrir espaço para mais mulheres. Somos mais de 50% da população. Obviamente, tanto o ministro Moro quanto o presidente têm uma chance de incluir uma mulher. Espero que o faça e o faça em maior número. Em geral, o governo tem um grande déficit de representação feminina. O que nesse ano que estamos, 2019, não é aceitável.