Por Gustavo Garcia e Gabriel Palma, G1 e TV Globo — Brasília


Moro vai à Câmara falar sobre supostas trocas de mensagens publicadas por site

Moro vai à Câmara falar sobre supostas trocas de mensagens publicadas por site

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, afirmou nesta terça-feira (2), ao participar de audiência na Câmara para esclarecer o conteúdo de mensagens atribuídas a ele e a procuradores da República, que houve "invasão" de celulares de autoridades para tentar invalidar, criminosamente, as condenações da Operação Lava Jato.

A audiência conjunta das comissões de Constituição e Justiça (CCJ), Direitos Humanos e de Trabalho, de Administração e Serviço Público transcorreu em clima tenso e teve vários bate-bocas entre apoiadores de Moro e parlamentares da oposição.

‘O que existe é uma tentativa criminosa de invalidar condenações’, diz Moro

‘O que existe é uma tentativa criminosa de invalidar condenações’, diz Moro

Diante das discussões acaloradas, o presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), ameaçou encerrar os trabalhos caso os deputados não acalmassem os ânimos.

Ao se manifestarem, deputados da oposição teceram várias críticas à conduta de Sérgio Moro na época em que ele era o juiz responsável pelos processos da Lava Jato no Paraná.

O ex-magistrado voltou a dizer que não reconhece a autenticidade das mensagens divulgadas pelo site The Intercept e que as conversas do aplicativo Telegram não estão mais arquivadas no celular dele. E dando continuidade à narrativa que adotou desde que vieram à tona as supostas conversas trocadas com integrantes do Ministério Público Federal (MPF), ele disse, mais uma vez, que "é comum" juízes falarem com procuradores e advogados sobre processos.

Nas últimas semanas, o The Intercept publicou uma série de reportagens que revela supostas mensagens trocadas entre Moro e o coordenador da força-tarefa da Lava Jato.

Segundo o site, o ministro orientou a atuação de procuradores da República na época em que era o responsável pelos processos da Lava Jato na Justiça Federal do Paraná. O ministro e os integrantes do Ministério Público não reconhecem o conteúdo das mensagens.

"A meu ver, o que existe é uma tentativa criminosa de invalidar condenações, e o que é pior: a minha principal suspeita é de que [o objetivo] seja evitar o prosseguimento das investigações. Criminosos que receiam que as investigações possam chegar até eles e estão querendo se servir desses expedientes [as invasões e as mensagens] para impedir que as investigações prossigam", afirmou o ministro na audiência solicitada por parlamentares de três comissões da Câmara.

‘Não tem nada ali, é um balão cheio de nada’, diz Moro sobre mensagens

‘Não tem nada ali, é um balão cheio de nada’, diz Moro sobre mensagens

Na primeira fala aos deputados, Moro afirmou, mais de uma vez, que agiu "com correção e com base na lei" durante a condução dos processos da Lava Jato na primeira instância. O ex-juiz também disse que tomou as decisões como magistrado "sem qualquer espécie de desvio".

"Minha opinião é de que alguém com muitos recursos está por trás dessas invasões e o objetivo principal seria invalidar condenações da Lava Jato", voltou a sugerir Moro, a exemplo do que já havia afirmado quando, há duas semanas, prestou esclarecimentos no Senado sobre as mensagens divulgadas pelo The Intercept.

Embate com a oposição

Em um dos diversos embates de oposicionistas com o ministro da Justiça, a deputada Marcivania (PCdoB-AP) disse ao ex-juiz que "não se pode combater corrupção cometendo novas irregularidades".

Integrante da bancada do PT, o deputado Helder Salomão (PT-ES) declarou no plenário da CCJ que, na avaliação dele, Moro cometeu crime ao divulgar diálogos dos ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva em 2016. A decisão de Moro foi criticada, à época, até pelo ministro Teori Zavascki, que era o relator da Lava Jato no Supremo até morrer em um acidente aéreo em janeiro de 2017.

Salomão afirmou que, para ele, os diálogos revelados pelo The Intercept "confundem acusação com quem julga".

Já deputado Rogério Correa (PT-MG) gerou tumulto durante a audiência ao chamar o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, procurador Deltan Dallagnol, de "cretino". Indignados, deputados governistas pediram retratação ao parlamentar petista. Repreendido até mesmo pelo presidente da CCJ, Correa se retratou e alterou a fala, se dirigindo a Dallagnol como "o procurador da República".

Em outro momento, Márcio Jerry (PCdoB-MA) disse a Moro que a atuação do ministro da Justiça na condução da Lava Jato foi "parcial", tendo sido alvo de críticas, de acordo com o parlamentar do Maranhão, até de integrantes da magistratura.

Enquanto oposicionistas se revezavam nos microfones para criticar o ministro da Justiça, Moro era defendido por aliados do presidente Jair Bolsonaro. Os governistas acusaram os integrantes da oposição de fazer "ataques pessoais ao ministro".

Filiado ao partido de Bolsonaro, o deputado Coronel Chrisóstomo (PSL-RO) classificou Moro como "herói brasileiro".

Aliado do Palácio do Planalto, o deputado José Medeiros (Pode-MT) exaltou a Lava Jato. "O Brasil é o único país do mundo com a maior operação de combate à corrupção", enfatizou. Medeiros disse ainda que, a partir da deflagração da Operação Lava Jato, o Brasil foi "alçado a outro patamar".

Maria do Rosário

Sérgio Moro e a deputada Maria do Rosário (PT-RS) protagonizaram, ao longo da audiência, uma discussão. A confusão teve início quando a parlamentar gaúcha tentou, fora dos microfones, falar ao mesmo tempo que o ministro da Justiça.

Felipe Francischini pediu, então, que a deputada não interrompesse mais o ex-juiz. Incomodado, Moro disse a Maria do Rosário que não havia interferido quando foram feitas as indagações.

"Tratei vossa excelência com urbanidade e peço que eu seja tratado com a devida urbanidade. A imunidade parlamentar protege de ofensas, mas acho que elas deveriam ser evitadas", disse o ministro.

Ao responder, Maria do Rosário afirmou que Moro não estava respondendo às questões. "Pelo menos, se ele [Moro] não quiser responder, que ele diga que não quer. Porque, simplesmente, desconsiderar [não pode]."

"Eu fui convidado para falar sobre supostas mensagens hackeadas. Existe alguma mensagem hackeada relativamente àquela data apresentada? Não. Então, vossa excelência é que está fugindo do debate. Agora, a decisão que eu tomei na data está nos autos. Eu não vou entrar em um bate-boca", rebateu o ex-juiz.

A discussão só encerrou quando o presidente da CCJ passou a palavra ao próximo deputado inscrito para questionar Moro. Por conta dos tumultos na sessão, Francischini comparou a audiência com o ministro da Justiça ao programa humorístico "Escolinha do Professor Raimundo". “E o salário, ó!”, brincou Francischini, aproximando o polegar e o indicador direito, referindo-se ao bordão criado por Chico Anysio.

Troféu Boca Aberta

Deputado Boca Aberta entrega troféu a Moro por combate à corrupção

Deputado Boca Aberta entrega troféu a Moro por combate à corrupção

Em um momento inusitado da reunião, o deputado Boca Aberta (PSD-PR) entregou a Sérgio Moro um troféu que, segundo ele, celebra a atuação do ex-juiz no combate à corrupção no país.

Sob vaias de oposicionistas, Boca Aberta caminhou com o troféu em mãos até o ministro, na mesa diretora da CCJ, para entregar a homenagem. Moro recebeu a taça e, imediatamente, repassou o objeto a um assessor.

"O senhor, Sérgio Moro, merece em nome do povo brasileiro este troféu que equivale à Liga dos Campeões. É um troféu entregue pelo povo que não aguenta mais essa cambada de político safado, vagabundo, ordinário", afirmou o parlamentar do Paraná antes de entregar a taça a Moro.

O deputado do PROS informou que o troféu contém a inscrição "Sérgio Moro, a maior estrela do combate à corrupção brasileira".

Boca Aberta criticou a presidente do PT e deputada Gleisi Hoffmann, que também integra a bancada paranaense.

"Temos que escutar a tal da Gleisi, que está atolada até o pescoço na Lava Jato, sendo investigada, com o marido [o ex-ministro Paulo Bernardo] atolado até o fiofó, roubando o dinheiro do povo”, enfatizou.

Diante do "showzinho", parlamentares da oposição repreenderam Boca Aberta e o chamaram de “Boca Suja”.

Líder do PT na Câmara, o deputado Paulo Pimenta (RS) afirmou que o parlamentar do Paraná estava sendo covarde ao falar de Gleisi sem que a deputada estivesse presente à comissão para se defender dos ataques.

Em junho de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) absolveu Gleisi e o marido da acusação de corrupção e lavagem de dinheiro.

Em defesa da Lava Jato

O ministro da Justiça reafirmou aos deputados que as supostas "invasões a celulares" não devem ter sido feitas por um "adolescente com espinhas", mas por várias pessoas. Ele também já havia usado a mesma metáfora no Senado.

Sérgio Moro saiu em defesa da Lava Jato diante dos deputados. Para ele, "é inegável que a operação mudou a impunidade no Brasil".

O ministro disse aos deputados que a maioria das decisões dele como juiz responsável pela Lava Jato no Paraná foi submetida, por meio de recursos, a instâncias superiores. Ele citou alguns números:

  • Decisões mantidas sem alteração: 70 (39%)
  • Condenações mantidas com penas aumentadas: 45 (25%)
  • Penas diminuídas: 37 (21%)
  • Pessoas que foram absolvidas em primeiro grau, mas condenadas em segundo grau: 8 (4,55%)
  • Pessoas absolvidas em segundo grau: 10 (5,68%)

Moro diz que não mantinha relação com advogado de Lula: 'Ele adotou atitude beligerante'

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'Malvados' da Lava Jato

Sérgio Moro foi irônico ao comentar a possibilidade de anulação do processo que resultou na prisão do ex-presidente Lula no caso do tríplex do Guarujá (SP).

"Se ouve muito da anulação do processo do ex-presidente [Lula]. Tem que se perguntar realmente quem defende, então, Sergio Cabral, Eduardo Cunha, Renato Duque, todos esses ‘inocentes’ que teriam sido condenados segundo esse site de notícias”, ironizou o ministro.

"Nós precisamos de defensores também dessas pessoas, para defender que elas sejam colocadas imediatamente em liberdade já que foram condenados pelos malvados procuradores da Lava Jato ou desonestos policiais e [pelo] juiz parcial”, acrescentou o ex-juiz.

Ministro do Turismo

Em meio à audiência, Moro foi questionado sobre a situação do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL). Na semana passada, um assessor especial do ministro foi preso pela Polícia Federal (PF) em uma operação que apura supostas candidaturas laranjas do PSL. Integrantes da legenda de Bolsonaro são suspeitos de indicar falsas candidatas às eleições para desviar recursos.

"Ontem [segunda-feira], houve uma diligência envolvendo esse caso. A única orientação, quando eu assumi o Ministério da Justiça, [eu falei ao presidente]: 'Podem surgir casos que tenham que ser investigados envolvendo a nova administração. Qual será a postura?' Ele [Bolsonaro] orientou: 'Nós vamos investigar quem quer que seja', e é isso que está sendo feito. Houve uma diligência ontem. Está se dando autonomia e independência para a PF realizar bem o seu trabalho', disse Moro.

Mais cedo nesta terça, Bolsonaro afirmou que, 'por enquanto, não tem nada contra" o ministro do Turismo.

"Tem de assessor. Se o assessor falar e for confirmado que ele tem participação, daí a gente toma providência", declarou o presidente.

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