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Diretor do Inpe será exonerado após questionamento de dados sobre desmatamento

Ricardo Galvão sairá do cargo mesmo com mandato até 2020
Ricardo Galvão, diretor do Inpe, que será exonerado Foto: Reprodução / TV Globo
Ricardo Galvão, diretor do Inpe, que será exonerado Foto: Reprodução / TV Globo

BRASÍLIA — O diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ( Inpe ), Ricardo Galvão , será exonerado. Sua saída foi confirmada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações ( MCTIC ), após a reunião de Galvão com o titular da pasta, Marcos Pontes .

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Apesar de Galvão ter mandato até 2020, essa foi a decisão do governo. Na quinta-feira, em entrevista coletiva, o ministro do Meio Ambiente , Ricardo Salles , e o próprio presidente Jair Bolsonaro questionaram dados do instituto.

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Nesta quinta-feira, Bolsonaro disse que não gostaria de fazer um "mau juízo" do diretor do Inpe, mas afirmou que a divulgação dos dados "está estranha". Ele lamentou ainda que o diretor tenha um mandato à frente do órgão, pois uma "medida mais drástica", referindo-se à demissão, iria gerar "uma confusão muito grande".

— Uma pessoa que passou informação duvidosa tem que ser responsabilizada, sim — disse Bolsonaro.

Bolsonaro questionou informações de órgão

Em julho, Bolsonaro questionou os dados que confirmavam um aumento na devastação na Amazônia. Na mesma ocasião, disse suspeitar que Galvão estaria "a serviço de alguma ONG".

— Com toda a devastação que vocês nos acusam de estar fazendo e de ter feito no passado, a Amazônia já teria se extinguido — disse Bolsonaro, à época. — Isso acontece com muitas revelações, como a de agora (...), e inclusive já mandei ver quem está à frente do Inpe para que venha explicar em Brasília esses dados que foram enviados à imprensa — completou.

No dia seguinte, Galvão rebateu as críticas e afirmou que não se demitiria.

— Fazer uma acusação em público esperando que a pessoa se demita. Eu não vou me demitir —, disse Galvão, que comparou sua situação à do ex-presidente do BNDES Joaquim Levy , que pediu demissão do cargo em junho após críticas de Bolsonaro.

Ao fim da reunião desta sexta, no entanto, ele disse acreditar que a maneira como se manifestou em relação às críticas de Bolsonaro criou um "constrangimento insustentável".

E ressaltou também que considera, a partir do encontro, que o Inpe será preservado.

— Eu tinha uma preocupação muito grande de que isso fosse respingar no Inpe. Isso não vai acontecer. O ministro, inclusive, nós discutimos em detalhes como vai ser a administração.

Apesar de ter mandato até 2020, Galvão afirmou que não há questionamentos jurídicos a partir da demissão.

— Temos mandato de quatro anos, mas "ad nutum" (termo latino que significa a demissão de funcionário por autoridade competente) , a decisão é do ministro.

Novo sistema de monitoramento

Nesta quinta, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles , anunciou que o governo terá um novo modelo de acompanhamento. Segundo ele, será contratado um sistema de imagens em alta resolução que permita uma análise diária.

O anúncio foi feito ao lado do presidente Jair Bolsonaro e dos ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores).

— Nós não estamos aqui para negar os números nem justificar coisas que tenham sido feitas de maneira ilegal. Estamos mostrando que precisa haver muita responsabilidade na divulgação de informações. E é isso que vamos construir em conjunto — disse Salles. — O que nós vamos fazer daqui para frente? (Contratar) Imagens que se pretendem contratar, de alta resolução, diária. Monitoramento em tempo real.

No Facebook, Marcos Pontes postou um vídeo com a fala de Galvão após a reunião e o agradeceu "pela dedicação e empenho" à frente do Inpe.

"Tenho certeza que sua dedicação deixa um grande legado para a instituição e para o país. Abraços espaciais ", escreveu o ministro.

Em nota, a assessoria do MCTIC também elogiou o "alto gabarito e currículo exemplar" de Galvão, anunciando que "a escolha do novo diretor do Inpe se dará de acordo com o mérito necessário ao cargo".

Escolhido pelo então titular do ministério, Gilberto Kassab, a partir de uma lista tríplice, Ricardo Galvão foi empossado na direção do Inpe em setembro de 2016. O mandato de Galvão à frente do instituto seria de quatro anos, ou seja, até o final do ano que vem.

A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva criticou a demissão de Galvão. No Twitter,  afirmou que  o diretor do Inpe foi demitido por sua "extrema competência, altivez" e  porque "não se acovardou diante das ameaças" de ministros e do presidente Jair Bolsonaro.

"Bolsonaro tenta destruir uma instituição de 50 anos  de existência, tentando impor  a lei da mordaça  e do autoritarismo", escreve a ex-ministra.

"Vida longa ao Dr. Ricardo Galvão, aos bravos cientistas do Inpe e aquela admirada instituição! Somos todos INPE! O ataque ao INPE é o ataque a honradez, à competência, à ciência, ao interesse público e à Constituição", conclui.

Galvão é mestre em Engenharia Elétrica pela Unicamp e doutor em Física pela Massachusetts Institute of Technology. Foi presidente da Sociedade Brasileira de Física e é membro titular da Academia de Ciências do Estado de São Paulo e da Academia Brasileira de Ciências, além do Conselho da Sociedade Europeia de Física.