Economia Brasília

Governo estuda reajustar tabela do IR pela inflação, mas, em contrapartida, acabar com deduções

Medida seria incluída na reforma tributária. Faixas de renda não são ajustadas desde 2015
IRPF 2019 - Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física 2019 Foto: Thiago Freitas / Agência O Globo
IRPF 2019 - Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física 2019 Foto: Thiago Freitas / Agência O Globo

BRASÍLIA, SÃO PAULO E RIO - A equipe econômica estuda reajustar a tabela do Imposto de Renda (IR) pela inflação, reduzir alíquotas e acabar com deduções, como despesas médicas e gastos com educação. O plano faz parte da proposta de reforma tributária que deve ser apresentada pelo governo na semana que vem.

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Segundo o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, as mudanças do IR formariam um tripé de medidas, junto com a desoneração da folha de pagamento - com a criação de um tributo único sobre o consumo, o Imposto de Valor Agregado (IVA) - e a criação de uma contribuição previdenciária sobre movimentações financeiras.

Nesta quarta, em evento em São Paulo, o ministro da Economia, Paulo Guedes , não deu maiores detalhes sobre a proposta para o IR , mas afirmou que ela faz parte de uma série de iniciativas que devem ser colocadas em curso a partir de agora, uma vez que a reforma da Previdência já foi aprovada na Câmara e seguiu para o Senado.

— No Imposto de Renda, o melhor é tirar todas as deduções e reduzir as alíquotas. Vamos fazer coisas desse tipo — disse o ministro, em apresentação durante o 2º Macro Day BTG.

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Hoje, o limite de isenção do IR é de R$ 1.903,98. Em maio, Bolsonaro já havia mencionado a possibilidade de propor a correção pela inflação . Na campanha eleitoral, chegou a falar em aumentar a faixa de isenção para cinco salários mínimos, cerca de R$ 5 mil. A tabela do IR não é reajustada desde 2015. Um aumento na faixa de isenção provocaria perda da arrecadação.

O reajuste da tabela viria acompanhado de uma reestruturação completa do IR. A equipe econômica trabalha em um plano para diminuir a alíquota de 27,5% (para a faixa de renda acima de R$ 4.664,68) e, ao mesmo tempo, reduzir a possibilidade de deduções, que custam R$ 20 bilhões por ano, segundo dados da Receita Federal.

A ordem do ministro, segundo interlocutores, foi “limpar tudo”. A ideia da equipe econômica é que, ao diminuir a carga, a extinção das deduções não provocará brigas.

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O cálculo exato do imposto, no entanto, ainda depende de outras variáveis. Ainda não se sabe para quanto irá a tributação na última faixa. Outro fator que pode influenciar na alíquota efetiva é o plano da equipe econômica de criar uma nova faixa de tributação chamada de IR negativo. Rendimentos nessa faixa fariam jus não só à isenção, que já existe hoje, mas a um pagamento feito pelo governo e bancado pelo Tesouro.

Ministro Paulo Guedes confirma que estuda reajustar tabela do IR pela inflação Foto: Amanda Perobelli / Reuters
Ministro Paulo Guedes confirma que estuda reajustar tabela do IR pela inflação Foto: Amanda Perobelli / Reuters

Para especialistas, o corte nas deduções e o reajuste da tabela pela inflação tendem a beneficiar todos que estão sujeitos ao pagamento do imposto e a prejudicar a parcela que tem deduções maiores. O tributarista Ives Gandra alerta, porém, que aplicar apenas o reajuste da inflação deste ano, que deve ficar abaixo de 4%, não compensaria o corte total das deduções, o que, consequentemente, vai aumentar a carga tributária:

— Com a atualização da tabela, todos são beneficiados, e não só aqueles que deduzem gastos com saúde e educação. Mas, se aumentar só 4% e tirar as deduções, pode ficar pesado para quem deduz essas despesas.

De acordo com fontes da equipe econômica, o plano tende ainda a reduzir a burocracia. A avaliação é que, no modelo atual, os gastos dedutíveis com médicos ou dentistas, por exemplo, levam os contribuintes a juntar papeladas de forma anacrônica, causando “um inferno na vida das pessoas”.

A reforma do IR virá acompanhada de uma reestruturação dos tributos que incidem sobre o consumo e a produção no país. De acordo com Cintra, o projeto inclui propostas que dialogam com medidas atualmente em discussão no Congresso, como a introdução do IVA:

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— Será um espelho com as mesmas características da PEC 45 (projeto atualmente em discussão no Congresso, com base nas ideias do economista Bernard Appy). Porém, com uma característica que será um IVA federal, não terá estados e municípios em um primeiro momento. Vamos para o IVA dual, modelo do Canadá, onde o governo central apresenta o seu IVA. A tramitação pode ser mais simples, uma vez que depende apenas da articulação dos interesses federais.

A proposta tem o apoio de Guedes, que disse acreditar que o IVA seria uma forma de estimular os estados a apoiarem a reforma tributária.

‘Mesma espécie’ da CPMF

Cintra explicou ainda que a contribuição previdenciária, que será incorporada à proposta para compensar a desoneração da folha de pagamento, é “da mesma espécie” da antiga CPMF, mas será implantada de forma mais neutra.

— A contribuição previdenciária, que é o tributo sobre pagamentos que pretendemos mandar, está para a CPMF da mesma forma que o IVA está para o ICMS. São tributos da mesma espécie, tributo sobre pagamentos. Mas um é mal implantado, mal articulado, deformado, cheio de distorções, e o outro é implantado de forma mais pura, mais neutra.

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Rodrigo Orair, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acredita que, diante da situação fiscal do governo, com déficit público acima de R$ 100 bilhões, a arrecadação com o Imposto de Renda deve se manter. Nas propostas de reforma tributária sobre a mesa atualmente, não há espaço para compensações em outros impostos, portanto, a compensação tem que acontecer dentro do próprio IR.

— A criação de um IVA substituiria o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). E um imposto sobre fluxo financeiro permitiria a redução dos impostos na folha de pagamento. Já no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) não há outro imposto para compensação, teria que ser dentro do próprio IR — afirmou Orair.