Economia

Fogo na Amazônia: Macron diz que Bolsonaro mentiu, e Europa ameaça retaliar Brasil

França e Irlanda falam em suspender acordo UE-Mercosul. Finlândia quer banir carne brasileira. EUA se dizem 'preocupados'
Queimada na região de Humaitá, no Amazonas Foto: Ueslei Marcelino- Reuters
Queimada na região de Humaitá, no Amazonas Foto: Ueslei Marcelino- Reuters

PARIS — Com as queimadas na Amazônia e a forte repercussão internacional para proteger a floresta, países europeus já ameaçam retaliar o Brasil. O presidente francês, Emmanuel Macron, disse que o presidente Jair Bolsonaro mentiu sobre compromissos climáticos e afirmou que será contrário ao acordo entre União Europeia (UE) e Mercosul.

Um porta-voz do governo da Alemanha, no entanto, afirmou que a decisão de Macron "não é a resposta apropriada".

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- O fracasso da conclusão do acordo UE-Mercosul não contribuiria para reduzir o desmatamento no Brasil - acrescentou o porta-voz em entrevista à agência France Presse, que destacou ainda que o acordo "contém um capítulo ambicioso sobre o desenvolvimento sustentável, com regras estritas sobre a proteção do clima.

- A selva amazônica tem uma importância capital paa proteção do clima e da biodiversidade - destacou o porta-voz com a condição de se manter no anonimato. - A gravidade dos incêndios é alarmante. Estamos dispostos a apoiar o Brasil em seus esforços para superar rapidamente esta grave crise.

Em Washington, uma autoridade do governo Trump afirmou que o país está "profundamente preocupado" com as consequências dos incêndios.

A Irlanda também ameaçou votar contra o acordo. E o governo finlandês, que está na presidência rotativa da UE, pediu que o bloco avalie a possibilidade de banir a carne bovina brasileira.

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O motivo para o posicionamento francês, de acordo com as autoridades locais, é a forma como o Brasil está lidando com a política ambiental. Macron disse nesta sexta-feira que, diante do atual cenário, a França se opõe ao acordo de livre comércio entre UE e Mercosul.

"Tendo em conta a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da República só pode constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na ocasião da cúpula (do G-20) de Osaka", disse o governo francês em nota, acrescentando que "o presidente Bolsonaro decidiu não respeitar seus compromissos climáticos nem se engajar na questão da biodiversidade."

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"Sob essas condições, a França se opõe ao acordo do Mercosul (com a UE) no estado atual", complementou a nota.

Debate no G-7

Nesta quinta-feira, Macron já havia convocado os países do G-7 (grupo das sete maiores economias entre os países desenvolvidos), a discutir a questão da Amazônia na reunião deste fim de semana, na França.

A chanceler alemã, Angela Merkel, considerou que os incêndios constituem uma "situação urgente" e concordou que o assunto deve ser debatido no encontro do G-7. O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau , também já se manifestou a favor de levar o assunto para a cúpula.

O primeiro-ministro da Irlanda, Leo Varadkar, por sua vez, ameaçou votar contra o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul se o Brasil não respeitar seus "compromissos ambientais".

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"De maneira alguma a Irlanda votará a favor do acordo de livre comércio UE-Mercosul se o Brasil não cumprir seus compromissos ambientais", declarou Varadkar em comunicado divulgado na quinta-feira à noite.

Varadkar se disse "muito preocupado porque neste ano houve níveis recordes de destruição por incêndios na floresta amazônica", e considerou que "os esforços do presidente Bolsonaro para culpar ONGs ambientalistas pelos incêndios são orwellianos", aludindo ao escritor inglês George Orwell (1903-1950) e à sua denúncia sobre totalitarismos.

EUA também demonstram preocupação

O governo americano também está profundamente preocupado com os incêndios na Amazônia, disse uma autoridade da Casa Branca nesta sexta-feira, à medida que cresce o temor internacional com o número recorde de queimadas neste ano.

"Estamos profundamente preocupados com o impacto dos incêndios na Floresta Amazônica sobre as comunidades, a biodiversidade e os recursos naturais da região", disse a pessoa, pedindo para não ser identificada.

Reino Unido: 'profundamente entristecido'

Após 20 anos de negociações, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai assinaram recentemente com a UE um acordo que prevê eliminar, em 15 anos, mais de 90% das tarifas comerciais.

Para entrar em vigor, porém, é necessário que os países do bloco europeu tenham o aval de seus parlamentos, além do sinal verde do Parlamento Europeu, um processo que deve levar dois anos.

"Ao longo desses dois anos, vamos monitorar de perto as ações ambientais do Brasil", advertiu Varadkar.

Já o governo da Finlândia pediu nesta sexta-feira que a UE avalie a possibilidade de banir a carne bovina brasileira devido à devastação causada pelas queimadas na Amazônia. O Brasil é o maior exportador de carne do mundo.

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“O ministro das Finanças, Mika Lintila, condena a destruição da Floresta Amazônica e sugere que a UE e a Finlândia devem considerar urgentemente a possibilidade de banir a importação de carne bovina brasileira”, informou o Ministério das Finanças em comunicado.

O Reino Unido disse estar “profundamente entristecido pelo aumento de incêndios na floresta amazônica“. “O impacto da trágica perda desses preciosos habitats será sentido em todo o mundo", disse o governo britânico.

Mas as autoridades britânicas reforçaram seu compromisso com financiamentos de programas de proteção ambiental no Brasil. "Continuamos comprometidos em proteger as florestas tropicais do mundo e continuaremos a fazê-lo no Brasil por meio de nossos programas internacionais de financiamento climático”, disseram em nota.

Bolsonaro se reuniu com oito ministros para discutir medidas a serem anunciadas nesta sexta-feira contra as queimadas.

Macron: gestão melhor para acabar com  "ecocídio"

Pouco antes da reunião de cúpula do G-7, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse que a Amazônia precisa de uma melhor gestão para acabar com o "ecocídio" que está ocorrendo na floresta tropical:

“Temos um verdadeiro ecocídio que está se desenvolvendo em toda a Amazônia e não apenas no Brasil“, afirmou o presidente francês.

Continuando um confronto com o presidente brasileiro Jair Bolsonaro, ele criticou a administração do Brasil na Amazônia:

“Precisamos encontrar uma boa governança da Amazônia. Isso significa que precisamos envolver ONGs e populações locais muito mais do que agora, e precisamos parar o desmatamento industrial que está acontecendo em todos os lugares“.

Em um tweet na quinta-feira, Macron disse que os incêndios são "uma crise internacional", já que as florestas da Amazônia são os pulmões do planeta, produzindo 20% de seu oxigênio.

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“As pessoas esquecem, o presidente brasileiro esquece, mas a França está na Amazônia. A maior fronteira externa da França é entre Guiana e Brasil, então estamos lá", acrescentou, referindo-se ao território ultramarino francês na costa norte da América do Sul.

Macron disse que no G7 tentaria mobilizar líderes mundiais para obter financiamento para reflorestar a área o mais rápido possível e desenvolver mecanismos para prevenir incêndios florestais.

Na manhã de hoje, o escritório de Macron disse em comunicado que a França se oporia ao acordo de agricultura UE-Mercosul entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai porque Bolsonaro estava mentindo quando minimizou as preocupações com a mudança climática na cúpula do G20. no Japão em junho.

Na quinta-feira, Bolsonaro rejeitou irritadamente as preocupações de Macron sobre os incêndios florestais.