Exclusivo para Assinantes
Mundo

Análise: Resultado de prévias foi catastrófico para Macri, que corre risco real de perder reeleição

Há dois anos, ninguém duvidava na Argentina de que o presidente do país ganharia outro mandato

Macri vota nas primárias da Argentina deste domingo: à noite, presidente reconheceu derrota
Foto:
JUAN MABROMATA/AFP
Macri vota nas primárias da Argentina deste domingo: à noite, presidente reconheceu derrota Foto: JUAN MABROMATA/AFP

RIO - Catástrofe. Sem exagero, essa foi a palavra que se impôs neste domingo entre membros do governo do presidente da Argentina, Mauricio Macri , em estado de choque pelo resultado das Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias (Paso), teste eleitoral prévio às presidenciais do próximo dia 27 de outubro. Com 98,67% dos votos apurados, o presidente que ainda pretende se reeleger obteve 32,08% contra 47,65% do agora grande favorito, Alberto Fernández, companheiro de chapa da senadora e antecessora de Macri, a ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015).

Há dois anos, ninguém duvidava que Macri seria reeleito. A economia continuava em crise, mas ainda numa fase que não permitia à sua principal oposição, o kirchnerismo, construir um discurso sustentável capaz de ameaçar o poder a macrista. Em entrevista ao GLOBO em março do ano passado, o equatoriano Jaime Durán Barba, principal consultor político do chefe de Estado, admitiu não subestimar Cristina e afirmou, ainda, que o resultado das próximas presidenciais dependeria da economia. “Se falharmos do ponto de vista econômico, o kirchnerismo pode voltar”, frisou, numa longa conversa em Buenos Aires.

Pois bem, a economia nunca decolou, a inflação continua sendo altíssima, o peso sofreu fortes e sucessivas desvalorizações, e hoje o presidente está diante do risco real e grandíssimo de perder a eleição. Sem disputa entre candidatos dos mesmos partidos, as Paso acabaram virando uma grande pesquisa nacional. E ela pesquisa mostrou que o kirchnerismo, aliado a grande parte do peronismo, está muito perto de retornar ao poder. O cenário mais provável é um triunfo de Fernández e Cristina no primeiro turno. Em Buenos Aires já se fala em “transição” .

Fernández superou amplamente a barreira dos 40% e deixou Macri numa posição muito desvantajosa para o primeiro turno. Para eleger-se, um candidato argentino precisa obter 45% dos votos ou 40% com uma vantagem superior a dez pontos percentuais.

Em 2015, Macri alcançou 30,12% nas Paso, contra 38,67% do então candidato kirchnerista Daniel Scioli. No primeiro turno, o presidente chegou a 34,15%, contra 37,08% de seu adversário. No segundo, o chefe de Estado virou o jogo e venceu com 51,34%, contra 48,66%.

Desta vez, seria praticamente impossível para o presidente reverter um primeiro resultado adverso. Macri diz que as pesquisas se enganaram, que é preciso redobrar esforços, e que o resultado de outubro definirá os próximos 30 anos da Argentina. A questão é como redobrar esforços num país em recessão, com uma das taxas de inflação mais altas do mundo e com um mercado que provavelmente enfrentará turbulências pelo temor que gera uma eventual volta de Cristina ao poder. Novas desvalorizações do peso poderiam ocorrer, o que alimentará ainda mais a inflação. O presidente está, claramente, diante de uma missão quase impossível. O voto castigo superou o medo ao kirchnerismo. Sobre isso não há dúvidas.