Política Brasília

Dodge nomeia mais quatro procuradores para cargos que só serão ocupados em outubro

Para procuradores que acompanham a questão, o preenchimento antecipado dos cargos engessa áreas estratégicas do MPF
Raquel Dodge tem apenas mais duas semanas de mandato como procuradora-geral da República Foto: José Cruz / Agência O Globo
Raquel Dodge tem apenas mais duas semanas de mandato como procuradora-geral da República Foto: José Cruz / Agência O Globo

BRASÍLIA - A duas semanas do fim do mandato , a procuradora-geral da República, Raquel Dodge , nomeou quatro procuradores para atuar na Procuradoria Regional Eleitoral do Distrito Federal. A portaria com a nomeação foi publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira, mas só vale a partir de 1º de outubro, quando Dodge não estará mais no comando do Ministério Público Federal (MPF).

LEIA: Bolsonaro sabe que interinidade de PGR não atrapalha trabalho do MP, diz ministro

Para procuradores que acompanham a questão de perto, com o preenchimento antecipado de cargos de chefia, Dodge engessa áreas estratégicas do MPF e deixa pequena margem de manobra para o sucessor montar equipes, assim como para redefinir o perfil da atual categoria conforme sua linha de atuação.

Pela portaria 773, Dodge designou os procuradores Wellington Luis de Sousa Bonfim, Francisco de Assis Marinho Filho, Zilmar Antônio Drumond e José Jairo Gomes para "exercerem a titularidade dos ofícios de atuação concentrada em polo junto à Procuradoria Regional Eleitoral no Distrito Federal".

Na semana passada, com a portaria 770, Dodge nomeou as procuradoras Monica Dorotea Bora e Eloisa Helena Machado para os "ofícios de atuação concentrada em polo" junto à Procuradoria Regional Eleitoral do Paraná. A portaria também só produzirá efeitos a partir de 1º de outubro. Ofícios de atuação concentrada são funções a serem exercidas pelos procuradores.

Procuradores designados para estes "oficios" passam a atuar como fiscais eleitorais. Eles têm mandatos de dois anos, contados a partir do momento em que assumem as funções. Os procuradores indicados foram escolhidos em eleições internas com base numa antiga portaria baixada durante a gestão do ex-procurador-geral Claudio Fonteles.

Dodge também já recebeu dos estados listas para a indicação da maioria dos chefes das procuradorias da República nos estados e no Distrito Federal. Com base nas informações, ela pode, a qualquer momento, nomear estes chefes como já vem fazendo, desde a semana passada, em relação às procuradorias regionais eleitorais.

Desgaste interno

Para procuradores que acompanham de perto a questão, Dodge vem "violando" o direito do sucessor de escolher os chefes estaduais e regionais do MPF. Dodge fez as nomeações com base numa norma administrativa. Mas a lei complementar 75/93 define que a indicação dos chefes regionais e estaduais é competência exclusiva do procurador-geral da República.

- Uma norma administrativa não pode se sobrepor a uma lei complementar. Se o próximo procurador-geral quiser indicar seus próprios nomes, como é que fica ? - pergunta um procurador.

Uma corrente interna entende que, se quiser, o próximo procurador-geral pode desfazer as nomeações de Dodge e redefinir o perfil dos indicados. Mas, depois do fato consumado, eles teriam um enorme desgaste interno. A tendência é que os eventuais afastados se rebelem contra a indicação de novos nomes.

As disputas não se limitam ao exercício de um cargo de chefia ou busca por status. As chefias e as tarefas de fiscalização eleitoral rendem gratificações mensais de aproximadamente R$ 7 mil. Em alguns casos, o valor extra a ser incluído no contra-cheque pode bater à casa dos R$ 15 mil.

As primeiras informações sobre preenchimento antecipado de cargos estratégicos por Dodge foram divulgadas pela "Folha de S. Paulo" no sábado. Numa entrevista coletiva, o presidente Jair Bolsonaro disse que recebeu informações similares. O presidente criticou a decisão de Dodge.

- Eu tive uma informação aqui. Estão nomeando cargos nos estados a partir de outubro. Eu não posso ter um procurador-geral da República, que não defini ainda. Suponha que (Dodge) não seja reconduzida. Uma pessoa que vai chegar e vai estar com todo o ministério montado com mandato - questionou.

Numa conversa no início da tarde desta segunda-feira, um ministro do Supremo Tribunal Federal criticou as nomeações antecipadas de Dodge. Para o ministro, a procuradora-geral deveria deixar para o sucessor a tarefa de indicar os futuros ocupantes de cargos de chefia. Ele entende que não há há razão para a pressa, afinal os novos mandatos só começam em outubro.

- Foi, no mínimo, uma indelicadeza com o próximo procurador-geral - resumiu o ministro, numa conversa com um amigo, depois de ler reportagem sobre o assunto no GLOBO.