Exclusivo para Assinantes
Política Lava-Jato

Delatores da Lava-Jato devolveram R$ 1,8 bilhão aos cofres públicos

Valor corresponde a quase 60% dos R$ 3,1 bilhões prometidos em acordos de colaboração
Familiares do doleiro Dario Messer já entregaram R$ 270 milhões, que estavam escondidos no exterior Foto: Reprodução
Familiares do doleiro Dario Messer já entregaram R$ 270 milhões, que estavam escondidos no exterior Foto: Reprodução

SÃO PAULO — Cinco anos e meio após a Lava-Jato desbaratar o maior esquema de corrupção já registrado no país, quase 60% do dinheiro que delatores prometeram devolver já entrou nos cofres públicos no Rio e no Paraná. De acordo com levantamento feito pelo GLOBO, cerca de 221 delatores ressarciram R$ 1,837 bilhão de um total de R$ 3,1 bilhões. Não foram levados em consideração os valores pagos por empresas em acordos de leniência com as forças-tarefas dos estados.

Na semana passada, parentes de Dario Messer, apontado como o doleiro dos doleiros, depositaram na Justiça do Rio o equivalente a US$ 7 milhões. É a última parcela do acordo fechado pela família. Os três filhos Dan, Débora e Denise, além de Rosane, ex-mulher de Messer, devolveram, em dinheiro, um total de R$ 270 milhões, recursos que estavam escondidos em contas bancárias abertas fora do Brasil. Outros R$ 100 milhões estão bloqueados em bens como apartamentos na Zona Sul do Rio de Janeiro, joias e 10 quadros do artista Di Cavalcanti.

Messer segue preso em Bangu 8, onde não descarta a possibilidade de uma delação. Em décadas de atuação, o doleiro se aproximou de empresários, atletas e políticos, inclusive no exterior. Ele era muito amigo, por exemplo, do ex-presidente do Paraguai Horácio Cartes.

Quando o assunto é a devolução de dinheiro aos cofres públicos, a família Messer já é a recordista na Lava-Jato. O levantamento realizado pelo GLOBO aponta que, em segundo lugar no ranking, aparece Eduardo Plass, que ficou conhecido por lavar dinheiro de joias do ex-governador Sergio Cabral e por se tornar um dos principais delatores do empresário Eike Batista.

Delação bilionária
Delatores da Lava-Jato no Paraná e no Rio se comprometeram a devolver parte do dinheiro desviado
Valor que deve ser devolvido
Valor já devolvido
pelos delatores
pelos delatores
R$ 3,1 bilhões
R$ 1,837 bilhões
é o total
é o total
R$ 2,1 bilhões
R$ 892 milhões
nos acordos homologados
no Paraná
nos acordos homologados
no Paraná
R$ 1,0 bilhão
R$ 945 milhões
nos acordos homologados
no Rio de Janeiro
nos acordos homologados
no Rio de Janeiro
Acordos de delação premiada homologados no Paraná
Acordos de delação negociados no Paraná e homologados no STF
Acordos de delação premiada homologados no Rio
48
136
37
TOP 10
As maiores devoluções registradas
Família Messer
Eduardo
Plass
Pedro
Barusco
Julio
Faerman
Paulo
Roberto Costa
(ex-mulher Rosane, e os filhos Dan, Débora e Denise )
(ex-diretor da Petrobras)
(lobista)
R$ 370
bilhões
R$ 320
milhões
R$ 199
milhões
R$ 145,5
milhões
R$ 80,7
milhões
10º
Sergio
Machado
Marcelo
Odebrecht
Hamilton
Padilha Jr
Emílio
Odebrecht
Alberto
Youssef
(doleiro)
(lobista)
R$ 76,8
milhões
R$ 73,4
milhões
R$ 70
milhões
R$ 68,7
milhões
R$ 52
milhões
total
R$ 1, 4 bilhões
Fonte: Ministério Público Federal do Paraná e do Rio de Janeiro
Delação bilionária
Delatores da Lava-Jato no Paraná e no Rio se comprometeram a devolver parte do dinheiro desviado
Valor que deve
ser devolvido
Valor já
devolvido
pelos delatores
pelos delatores
R$ 3,1
bilhões
R$ 1,84
bilhões
é o total
é o total
R$ 2,1
bilhões
R$ 892
milhões
nos acordos
homologados
no Paraná
nos acordos
homologados
no Paraná
R$ 1,0
bilhão
R$ 945
milhões
nos acordo
homologados
no Rio de Janeiro
nos acordo
homologados
no Rio de Janeiro
48
Acordos de delação premiada homologados no Paraná
136
Acordos de delação negociados no Paraná e homologados no STF
37
Acordos de delação premiada homologados no Rio
TOP 10
As maiores devoluções registradas
Família Messer
Eduardo
Plass
(ex-mulher Rosane, e os filhos Dan, Débora e Denise )
R$ 370
milhões
R$ 320
milhões
Pedro
Barusco
Julio
Faerman
(lobista)
R$ 199
milhões
R$ 145,5
milhões
Sergio
Machado
Paulo
Roberto Costa
(ex-diretor da Petrobras)
R$ 76,8
milhões
R$ 80,7
milhões
Marcelo
Odebrecht
Hamilton
Padilha Jr
(lobista)
R$ 73,4
milhões
R$ 70
milhões
10º
Emílio
Odebrecht
Alberto
Youssef
(doleiro)
R$ 68,7
milhões
R$ 52
milhões
Fonte: Ministério Público Federal do Paraná e do Rio de Janeiro

Dono do TAG Bank/Panamá e presidente da gestora de recursos Opus Investimento, Plass já tem acordo homologado pela Justiça do Rio, que prevê a devolução de R$ 320 milhões. Ele é acusado de ter usado seu banco em repasses de grandes somas de dinheiro ilegal.

A família Messer, Plass e o ex-gerente de Engenharia da Diretoria de Serviços da Petrobras Pedro Barusco fazem parte de um seleto grupo de 10 delatores que, ao final do pagamento de suas dívidas com a Justiça, terão devolvido o equivalente a R$ 1, 4 bilhão. Também estão no topo da lista o lobista Julio Faerman, o ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, o ex-presidente da Transpetro Sergio Machado, os empreiteiros Marcelo e Emílio e Odebrecht e o doleiro Alberto Youssef. Embora alguns deles ainda não tenham quitado os valores devidos, todos já saíram da cadeia.

Conhecido como o “delator de US$ 100 milhões”, Barusco levava à época dos desvios um altíssimo padrão de vida, que incluía uma adega com garrafas de vinho que chegavam a custar US$ 10 mil. Em 2015, o ex-gerente foi o primeiro a devolver um montante significativo: R$ 199 milhões. Em sua delação, afirmou que recebeu US$ 100 milhões em propina de empreiteiras.

No caso dos ex-funcionários da Petrobras, é possível aferir o quão incompatíveis são essas cifras em comparação aos rendimentos recebidos à época em que trabalhavam na estatal. Segundo o próprio Pedro Barusco declarou, durante sessão da CPI da Petrobras, em 2016, seu salário rendia, por ano, em torno de R$ 1, 2 milhão. Se mantivesse esse rendimento, levaria exatos 165 anos e nove meses para acumular os R$ 199 milhões que se viu obrigado a devolver.

Duque, o arrependido

Há mais de um ano, Barusco vive sem tornozeleira eletrônica. Enquanto isso, seu ex-chefe Renato Duque, ex-diretor de serviços da estatal, ainda está preso na carceragem da Polícia Federal de Curitiba. Em março de 2015, a Polícia Federal encontrou 131 obras de arte na cobertura duplex de Duque, na Barra da Tijuca.

O patrimônio chamou atenção e levou ao rastreamento de R$ 77 milhões em suas contas no exterior. Duque, inicialmente, permaneceu calado. Quando cogitou fazer delação, já era tarde.

Em depoimento à Justiça, na semana passada, ele disse que se arrependeu de “ter permanecido calado”. Em julho de 2017, Duque decidiu abrir mão dos valores descobertos no exterior pela Lava-Jato, segundo dizem seus advogados.

A devolução foi uma das contrapartidas para um acerto que lhe permitirá sair da cadeia após cumprir cinco anos (ele já cumpriu quatro anos e meio). O ex-diretor recebia cerca de R$ 2, 2 milhões anuais, em salário fixado em 2011, valor máximo que a estatal pagava para o cargo na época.

Dinheiro para pagar o 13º

Para o procurador regional da República José Augusto Vagos, que atua na força-tarefa do Rio, a recuperação de valores é complexa. E era ainda mais difícil antes da Lava-Jato. No escândalo de corrupção descoberto na Secretaria Fazenda do Rio, em 2002, por exemplo, não houve sucesso na recuperação de dinheiro.

— Os valores recuperados pelas colaborações premiadas sequer têm paralelo de comparação com outros processos criminais que nunca chegam ao fim no Brasil — disse Vagos.

Aos poucos, os valores devolvidos deixam a esfera do Judiciário e vêm sendo usados pelo poder público. Pelo menos R$ 250 milhões recuperados no Rio foram liberados para pagar o décimo terceiro atrasado de 146 mil aposentados e pensionistas do estado. No Paraná, pelo menos R$ 892 milhões pagos por parte dos delatores já retornaram à Petrobras.

Integrantes das forças-tarefas estimam que os valores devolvidos até agora alcançam um patamar razoável. Há ainda uma parte que foi parcelada para que os delatores tenham condições de se desfazer de patrimônio adquirido de forma ilegal.

Se não houver calote, esses pagamentos continuarão chegando aos cofres públicos ao longo dos próximos anos. Há ainda valores não contabilizados publicamente porque as informações sobre as colaborações são mantidas sob sigilo.