Política Lava-Jato

Lava-Jato investiga relação de repasses da Oi a empresas ligadas a filho de Lula com sítio de Atibaia

Operação deflagrada nesta terça apura repasses de R$ 132 milhões da empresa de telefonia para Fabio Luis, filho do ex-presidente Lula
Agentes da PF cumprem mandado de busca e apreensão na OI, do Leblon Foto: Gabriel de Paiva / O Globo
Agentes da PF cumprem mandado de busca e apreensão na OI, do Leblon Foto: Gabriel de Paiva / O Globo

SÃO PAULO - Em uma nova fase da Operação Lava-Jato , a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público investigam pagamentos suspeitos de R$ 132 milhões da Oi para empresas ligadas ao filho do ex-presidente Lula, Fábio Luis Lula da Silva, o Lulinha . Segundo as apurações, parte desses recursos pode ter sido usada para a compra do sítio de Atibaia, também em benefício do ex-presidente. O sítio é pivô de uma das duas condenações já impostas a Lula na Lava-Jato, que tratou apenas do custeio de reformas na propriedade.

Fabio Luis é sócio de Fernando Bittar , Kalil Bittar e do empresário Jonas Suassuna em pelo menos nove empresas. Bittar e Suassuna aparecem como proprietários dos dois terrenos que, juntos, formam o sítio de Atibaia.

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Segundo os investigadores, há a suspeita de que Bittar e Suassuna tenham utilizado parte dos valores recebidos do Grupo Oi/Telemar para a aquisição da propriedade.

– A investigação se inicia a partir do aprofundamento de uma ação penal na qual o ex-presidente Lula foi denunciado e condenado por ter participado de um esquema criminoso que envolveu o repasse por duas empreiteiras de valores para reforma no sítio de Atibaia – lembrou o procurador Roberson Pozzobon, do MPF.

– A maior parte do dinheiro empregado para a aquisição (do Sítio de Atibaia) pode ter tido origem nos recursos repassados pelo grupo Oi/Telemar para um complexo de empresas criadas por Fabio Luis Lula da Silva, Jonas Suassuna, Kalil e Fernando Bittar – continuou.

Na operação desta terça-feira, a juíza Gabriela Hardt, substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba, autorizou o cumprimento de 47 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Distrito Federal.

De acordo com o despacho da juíza, ao analisar as movimentações bancárias de Fernando Bittar e Jonas Suassuna, o MPF identificou indícios de que o dinheiro usado por Bittar e Suassuna para a compra de propriedades rurais pode ter como origem recursos ilícitos recebidos por intermédio de empresas vinculadas a Oi/Telemar.

Hardt lembrou que Suassuna fez uma transferência de R$ 1 milhão em outubro de 2010 para a aquisição do sítio Santa Denise, nome de registro de um dos terrenos do sítio de Atibaia. A magistrada destacou ainda que os recursos mantidos nas contas de Suassuna tinham origem de transferências de empresas do Grupo Gol, em particular a PJA Empreendimentos LTDA. Por sua vez, tal empresa recebeu recursos do Grupo Oi/Telemar.

A magistrada lembrou, também, que Bittar movimentou em sua conta recursos originários de empresas como G4 Entretenimento, Gamecorp, Editoral Gol e Coskin, das quais é sócio, para comprar o sítio Santa Bárbara - segundo terreno que integra o sítio de Atibaia - por R$ 500 mil.  A defesa de Bittar alega que na mesma época, ele recebeu uma doação do pai, Jacó Bittar, no mesmo valor, e que esta seria a real origem do pagamento pelo sítio.

A operação desta terça foi um desdobramento da 24ª fase da Lava-Jato, que levou o ex-presidente Lula para depoimento . A Polícia Federal e o MPF investigam os crimes de corrupção ativa e passiva, organização criminosa, tráfico de influência internacional e lavagem de dinheiro.

De acordo com o Ministério Público Federal, tais pagamentos foram realizados sem justificativa econômica plausível enquanto o grupo Oi/Telemar foi beneficiado por diversos atos praticados pelo Governo Federal.

Os benefícios ocorreram principalmente nas mudanças legislativas patrocinadas pelo governo e que permitiram a aquisição, pelo grupo Oi/Telemar, da Brasil Telecom.

— Enquanto fazia isso (defendia mudanças legislativas), realizou pagamentos para a empresa que era sócio o filho do ex-presidente da República para serviços que não foram prestados em muitos casos — afirmou Pozzobon.

Segundo procuradores, o então presidente Lula teria indicado também um conselheiro para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) que atuava como "braço avançado" do complexo de empresas controladas por Lulinha e seus sócios.

— O grupo Oi Telemar exerceu forte influência na indicação de um conselheiro da Anatel, que era vinculado aos quadros da Brasil Telecom e uma pessoa muito próxima a Fabio Luis e seus sócios. Ele atuou no processo que permitiu que a Brasil Telecom fosse adquirida pela Oi — disse o procurador Athayde Ribeiro.

Contratos e notas fiscais citadas em documentos que embasaram a operação demonstrariam que as empresas do grupo Oi/Telemar contrataram as empresas de Lulinha sem cotação de preços e com pagamentos acima dos valores contratados e praticados no mercado, bem como teriam realizado pagamentos por serviços não executados, de acordo com o MPF.

"Entre 2005 e 2016 o grupo Oi/Telemar foi responsável por 74% dos recebimentos da  Gamecorp", lembrou o MPF, citando uma das empresas de Lulinha.

De acordo com a Lava-Jato, as evidências apontam que os serviços contratados pelo grupo econômico foram contratados em patamares ínfimos ou sequer foram prestados.

"O montante dos repasses apurado até o momento chega a R$ 193 milhões, ocorridos entre 2005 e 2016", afirma a Polícia Federal.

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Segundo o MPF, o grupo Oi/Telemar teria sido beneficiado pelo Governo Federal em algumas decisões políticas e administrativas.

Também foram alvos da investigação outras empresas que contrataram serviços de empresas de Fabio Luis, com suspeita sobre a razão de repasses. São elas a Cervejaria Petrópolis, o canal de vendas de joias Mil e Uma Noites, o Shopping Iguatemi  e a empresa Corancla Cinema.

Além dos pagamentos para empresas ligadas ao filho do ex-presidente Lula, a Lava-Jato também apura pagamentos para a RT Serviços Especializados, empresa que teria sido utilizada para o custeio de despesas do ex-ministro José Dirceu.

O advogado de José Dirceu, Roberto Podval, afirmou que não viu a integra da representação do MPF, mas que todos os recebimentos de Dirceu foram esclarecidos em ações penais em andamento. De acordo com Podval, não há um recebível de Dirceu que não tenha sido dissecado pela Receita Federal.

O caso do sítio de Atibaia levou à condenação do ex-presidente Lula — em primeira e segunda instância — por ter se beneficiado por meio de reformas no sítio pagas por empreiteiras como OAS e Odebrecht. Em fevereiro de 2019, o ex-presidente foi sentenciado pela juíza substituta Gabriela Hardt a 12 anos e 11 meses de prisão. Em novembro passado, a pena do petista foi aumentada para 17 anos, um mês e dez dias de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

OUTROS LADOS

Em sua conta oficial no Twitter, o ex-presidente afirmou que a operação é uma “demonstração pirotécnica de procuradores viciados em holofotes”. A defesa de Lula também sustenta que não há provas de que ele beneficiou OAS e Odebrecht em troca de contratos da Petrobras. Nesse sentido, os advogados que a Lava-Jato não conseguiu comprovar qualquer contrapartida do líder petista para as empresas.

A defesa de Fernando Bittar viu a operação desta terça com estranheza.

– O próprio MPF já reconheceu que o dinheiro para a compra do sítio veio do pai do Fernando e do Kalil. Estranho que esse caso venha à tona justamente agora – declarou Alberto Toron. – De qualquer modo vamos esperar o resultado da diligência da Polícia Federal para nos manifestarmos.

Em entrevista coletiva nesta segunda-feira, o diretor de operações da Oi, Rodrigo Abreu, afirmou que a empresa de telefonia tem colaborado com as investigações Ministério Público Federal (MPF), além de ter instituído "grupos de auditoria forense" internamente para checar a natureza das operações feitas com a Gamecorp. O atual Conselho de Administração tomou posse em setembro de 2018, depois que a empresa já havia entrado em recuperação judicial.

— Não cumpre à companhia fazer observações detalhadas sobre nenhum dos fatos investigados pelo MPF. Cabe à companhia fazer processos de auditoria interna e disponibilizar as informações solicitadas pelas autoridades. Vamos averiguar internamente se houve falhas de controle, para que não se repitam - declarou Abreu.

O diretor de operações afirmou ainda que a empresa de telefonia "não se beneficiou de maneira nenhuma de qualquer fato" no âmbito da investigação pela Lava-Jato, que apura se os recursos pagos à Gamecorp tiveram, entre suas contrapartidas, a autorização para a fusão da Oi com a Brasil Telecom. Abreu argumentou que este acordo foi um dos fatos que levou a empresa a perder liquidez e entrar em recuperação judicial.

A Oi informa que atua de forma transparente e tem prestado todas as informações e esclarecimentos que vêm sendo solicitados pelas autoridades, assegurando total e plena colaboração com as autoridades competentes.

Também alvo da operação, a Telefônica informou que vai fornecer todas as informações solicitadas pela Polícia Federal e diz que continuará contribuindo com as autoridades. A empresa diz que reitera seu compromisso com elevados padrões éticos de conduta em toda sua gestão e procedimentos.