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Política Radar

MP faz busca em endereços de Queiroz e de ex-assessores de Flávio Bolsonaro

Agentes se encontram em locais na capital e também em Resende, no Sul do Estado do Rio, onde moram parentes da ex-mulher de Bolsonaro
Equipe do Ministério Público faz busca e apreensão no apartamento onde morava a filha de Queiroz, Evelyn Foto: Pablo Jacob / O GLOBO
Equipe do Ministério Público faz busca e apreensão no apartamento onde morava a filha de Queiroz, Evelyn Foto: Pablo Jacob / O GLOBO

RIO — O Ministério Público do Rio cumpre na manhã desta quarta-feira diversos mandados de busca e apreensão em endereços de ex-assessores do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ)  tanto na capital como em Resende, no Sul do Estado do Rio. Uma loja de chocolates de Flávio, em um shopping do Rio, também recebeu a visita de promotores . As medidas cautelares foram pedidas na investigação sobre lavagem de dinheiro e peculato (desvio de dinheiro público) no âmbito do antigo gabinete do senador quando era deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio . Foram alvo das medidas cautelares os endereços de Fabrício Queiroz , ex-chefe da segurança de Flávio, seus familiares e ainda parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro .

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As medidas cautelares desta quarta-feira atingem sobretudo ex-assessores que também tiveram sigilo fiscal e bancário quebrado pelo Tribunal de Justiça do Rio em abril. Ao todo, na ocasião, 96 pessoas e empresas foram alvo da decisão da 27ª Vara Criminal do Rio, cujo titular é o juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau. O MP confirmou, em nota, que "foram cumpridos hoje (18/12) 24 mandados de busca e apreensão" no âmbito da investigação que apura movimentações suspeitas envolvendo Fabrício Queiroz. Por conta do sigilo das investigações, o MP não forneceu mais informações.

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No Rio, uma equipe do MP esteve na manhã desta terça-feira no condomínio em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio, onde morava Evelyn Melo de Queiroz, filha do ex-assessor de Flávio. Ao chegaram ao local, porém, foram informados na portaria que "a pessoa (que mora atualmente) no apartamento não era o alvo da operação".

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O advogado de Flávio, Frederik Wassef, afirmou que só após ter acesso à ação que autorizou as buscas vai se manifestar. Ele criticou a atuação do MP no caso. "A empresa do meu cliente foi invadida, mas garanto que não irão encontrar nada que o comprometa". E considerou a ação uma “truculência desnecessária”.

— Houve uma truculência desnecessária, eles arrombaram a porta, não tinha nenhum funcionário. Chegaram cedo e arrombaram a porta causando um dano material grande. Pessoas estranhas adentram em propriedade privada e vão lá fazer busca e apreensão. Não há essa necessidade. Poderiam ter aguardado chegar uma funcionária que abriria a porta e eles procederiam a mesa diligência — disse Wassef à colunista Bela Megale.

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Na busca, foram apreendidos documentos contábeis da loja. Segundo testemunhas, os policiais chegaram a arrombar a loja para entrar, porque não havia ninguém no local.

Em nota, a defesa de Fabrício Queiroz informou ter recebido a notícia da busca "com tranquilidade e ao mesmo tempo surpresa". "É absolutamente desnecessária, uma vez que ele sempre colaborou com as investigações, já tendo, inclusive, apresentado todos os esclarecimentos à respeito dos fatos", disse.

Equipe do MP faz buscas nas casas de Maria José de Siqueira e Marina Siqueira, tias da Ana Cristina Vale, ex-mulher de Jair Bolsonaro Foto: Fabiano Rocha / O Globo
Equipe do MP faz buscas nas casas de Maria José de Siqueira e Marina Siqueira, tias da Ana Cristina Vale, ex-mulher de Jair Bolsonaro Foto: Fabiano Rocha / O Globo

Evelyn foi uma das funcionárias contratadas pelo gabinete de Flávio na Alerj. Após as denúncias do esquema de "rachadinha" - como é conhecida a prática de funcionários devolverem parte dos salários - e da existência de funcionários fantasmas no gabinete, Queiroz adotou discrição e se afastou dos holofotes para tratar um câncer. Ele tem se consultado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

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Em Resende, são alvo os nove parentes de Ana Cristina Siqueira Valle que foram lotados no gabinete de Flávio durante algum período entre 2003 e o ano passado - tempo de seus quatro mandatos. José Procópio Valle, ex-sogro de Bolsonaro, Andrea Siqueira Valle, ex-cunhada de Bolsonaro, além dos primos Francisco Diniz, Daniela Gomes, Juliana Vargas e os tios Guilherme dos Santos Hudson e Ana Maria Siqueira Hudson.

Em um vídeo nas redes sociais, a ex-mulher de Bolsonaro afirmou que ela não está sendo investigada e que “acredita” que o cumprimento dos mandados de busca e apreensão na casa de seus familiares “é uma estratégia da mídia” para atingir o presidente.

— O Ministério Público veio a Resende, fez algumas buscas e apreensões em alguns familiares meus, mas o mais importante que eu quero dizer a vocês é que eu, Ana Cristina Siqueira Valle, não estou sendo investigada. Isso é fato. Então, eu acredito que isso seja uma estratégia da mídia para atingir o nosso presidente Jair Bolsonaro. Então, mais uma vez, eu, Ana Cristina Siqueira Valle, não estou sendo investigada. Agradeço muito. Brasil acima de tudo e Deus acima de todos.

O GLOBO foi até a casa de Ana Cristina duas vezes nesta quarta-feira. Nas duas oportunidades, ela não se encontrava.

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Equipes do MP também foram às casas de Maria José de Siqueira e Silva e Marina Siqueira Guimarães Diniz, tias da ex-mulher de Bolsonaro Ana Cristina Valle, mãe de Jair Renan.  Após cerca de 1 hora nos endereços, o MP deixou o local com celulares e documentos. As duas, que estavam em casa, não quiseram se pronunciar sobre a ação desta quarta-feira.

Já o tio de Ana Cristina, Guilherme Hudson, falou ao GLOBO, e disse que o processo corre em segredo de Justiça e que não iria comentar a ação:

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- Essa investigação transcorre em segredo de Justiça. O fato deles (MP) terem passado aqui e levado computador e celular é um ato administrativo normal. Levaram o que quiseram, praticamente nada - disse.

Questionado se havia trabalhado como assessor na Alerj, Guilherme afirmou que sim e que a informação é “mais conhecida do que bolacha Maria”.

- Eu não tenho nada a dizer sobre isso. Tem que achar é quem inventou essa história.

Os sem-crachá

Fabrício Queiroz, ex-assessor do gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj Foto: SBT / Reprodução
Fabrício Queiroz, ex-assessor do gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj Foto: SBT / Reprodução

Em junho, O GLOBO mostrou que o vendedor aposentado José Procópio Valle e Maria José de Siqueira e Silva, pai e tia de Ana Cristina, jamais tiveram crachá funcional da Alerj . Ele ficou lotado cinco anos e ela, nove.

Já Andrea Siqueira Valle foi fisiculturista em Resende durante todo o tempo em que constou como assessora e Francisco Diniz chegou a cursar faculdade integral de Medicina Veterinária em Barra Mansa, também no Sul do estado, no mesmo período em que foi nomeado assessor de Flávio na Alerj.

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A investigação foi instaurada em 31 julho do ano passado, meses depois que o antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras enviou espontaneamente um relatório ao MP com movimentação atípica de Queiroz num total de R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.

O caso ficou parado de julho até novembro aguardando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a legalidade do compartilhamento de informações sigilosas por órgãos como a Unidade de Inteligência Financeira (UIF, antigo Coaf) e a Receita Federal com o Ministério Público e órgãos policiais sem autorização judicial. O STF aprovou no mês passado a tese para o compartilhamento.