Por Bárbara Muniz Vieira, G1 SP — São Paulo


O carnavalesco Chico Spinoza posa no barracão da Vai-Vai, onde prepara os carros alegóricos do desfile de 2020 da escola pelo Grupo de Acesso — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

A comunidade da Vai-Vai não está poupando esforços e fez até vaquinha para arrecadar fundos para o desfile pelo Grupo de Acesso da tradicional escola de samba do bairro do Bixiga, no Centro de São Paulo. Cheia de dívidas, a escola tenta voltar ao Grupo Especial fazendo um desfile "sem nem R$ 1", de acordo com o membro do conselho gestor Clarício Gonçalves. A escola conquistou 15 títulos e é a maior campeã do carnaval de São Paulo.

"Se a escola conseguir fazer o feito de entrar na avenida no domingo de carnaval já somos vencedores porque vamos fazer um carnaval sem nem R$ 1. Deixando claro que não estamos aqui como salvadores da pátria. Se a antiga gestão estivesse aqui, estaria com o mesmo comprometimento de recuperar a escola", afirma.

A Vai-Vai elegeu um conselho gestor formado por Clarício e Ana Murad desde que o presidente da escola Darly Silva, conhecido como Neguitão, anunciou que se afastaria da escola, em julho do ano passado.

Chico e o membro da comissão de carnaval Gabriel Mello fazem as contas no barracão: carnaval na ponta do lápis — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

Para conseguir fazer o desfile, a escola fez uma vaquinha que já arrecadou R$ 8 mil. Outra solução encontrada pelo conselho gestor da escola foi conseguir que os patrocinadores pagassem os fornecedores diretamente, já que todo dinheiro que cai na conta da Vai-Vai fica retido em juízo para pagar as dívidas, oriundas de fornecedores e direitos trabalhistas.

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A Vai-Vai vai retribuir o esforço da comunidade no desfile, a escola falará sobre os seus 90 anos e homenageará nomes importantes da sua trajetória. Cada carro alegórico vai relembrar um dos 15 títulos da campeã do carnaval paulistano, de acordo com o carnavalesco Chico Spinoza.

"Se não fosse a comunidade, não teria carnaval. A gente encontrou a escola arrombada. A cada loja que eu chegava para comprar material, o dono me recebia e eu escutava a conversa de que a Vai-Vai estava devendo. Eu disse que a escola confiou nas pessoas erradas, foram indivíduos que deram calote, não a agremiação", disse Chico durante entrevista no barracão da escola na Fábrica do Samba II, na Vila Guilherme, Zona Norte de São Paulo.

Os preparativos estão a todo vapor no barracão da Vai-Vai na Fábrica do Samba II, na Vila Guilherme, Zona Leste de São Paulo — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

Batizado de "De Corpo e Álamo", o enredo deste ano busca a superação. A palavra álamo em português significa árvore reta e frondosa, já em grego quer dizer "vitoriosos acima dos fortes."

"Fiz questão de buscar esse álamo. Queremos reacender o orgulho e o brio da Vai-Vai com essas estrelas. A escola tomou um baque, mas nascemos vitoriosos e vamos superar. A Vai-Vai é uma escola que enfrenta dificuldades desde a sua fundação. Já enfrentamos enchente, não temos quadra, a transição de bloco para escola foi difícil... E ainda assim, a escola consegue seguir sendo grande e tradicional. Em cada componente você vê um vitorioso. Iremos renascer das cinzas como Fênix", diz Spinoza.

Ensaio nas ruas do Bixiga da Vai-Vai: escola luta par se recuperar de crise financeira — Foto: Kleber Santos/Vai-Vai/Divulgação

Gabriel Mello, 31 anos, é membro da comissão de carnaval da escola. Ele diz que a vaquinha não encontrou resistência entre a comunidade, ao contrário do que imaginou inicialmente.

"Tínhamos medo da reação das pessoas, mas o pessoal das antigas disse que antes era assim mesmo que funcionava, passava o livro de ouro e cada um ia contribuindo. São essas pessoas que estão fazendo o carnaval sair do papel. Tudo foi com muita dificuldade, mas feito com muito amor. São os componentes que fazem o carnaval acontecer."

A menos de um mês do desfile, Clarício ainda se reúne com possíveis patrocinadores.

Clarício Gonçalves, do conselho gestor da Vai-Vai — Foto: Divulgação

"Não estou nessa batalha como salvador da pátria. O que estou fazendo é retribuir o que essa escola já me deu de alegria na vida. Tanto eu quanto nossos parceiros e a comunidade estamos retribuindo essa alegria. Estamos com nossos barracões dentro dos conformes, embalando o abre-alas e adereçando os demais carros e tudo isso está acontecendo graças aos parceiros. Eles estão colaborando com dinheiro direto na conta de nossos fornecedores, sem exceção", afirma Clarício.

A escola vai entrar na avenida sem rainha de bateria. Camila Silva deixou o posto em outubro de 2019. Ela foi eleita rainha do carnaval carioca no sábado (12). A rainha mirim Giuliana Teixeira segue na escola e a madrinha de bateria Verônica Bolani sai na frente da bateria.

Criatividade em alta

Para fazer o desfile sem dinheiro e no Grupo de Acesso, a Vai-Vai está tendo de se adaptar. De acordo com Spinoza, muito material foi reciclado dos anos anteriores e ele apostou no minimalismo.

"Todo carnavalesco que se preze tem suas manhas. Consegui um efeito muito positivo usando o minimalismo na decoração, que me deu a possibilidade de ter um resultado bom e criativo. Vou usar saco de lixo derretido com aquecimento no corrimão de um carro. Isso lembra o asfalto preto, que é onde a Vai-Vai faz seus ensaios, na rua. Estou brincando com todas as possibilidades. É um carnaval com menos dinheiro, mas com mais criatividade. E com muita elegância e sensatez!", garante Spinoza.

Verônica Bolani, madrinha de bateria da Vai-Vai, durante ensaio técnico realizado no Sambódromo do Anhembi, na zona norte da capital paulista, na noite de sábado (18). — Foto: NELSON GARIBA/AGÊNCIA F8/ESTADÃO CONTEÚDO

O carnavalesco fez questão de trocar as ferragens dos carros.

"Quando eu olhei pras ferragens dos carros e vi o estado que estava... Mas sorrateiramente acabei fazendo com que a escola, com o pouco de verba que tinha, me desse ferragens novas. Vamos ter carro de dez metros de altura com estrutura bem feita, o que que vai me garantir uma passagem decente na avenida. Todos os carros têm estrutura nova e bem feita", garante.

Chico Spinoza tem 34 anos de carnaval. No Rio, já foi campeão pelas escolas Estácio de Sá, Salgueiro, União da Ilha, Tijuca, Mocidade, Caprichosos de Pilares. Em São Paulo, só trabalhou com a Vai-Vai.

"A minha escola em São Paulo é a Vai-Vai, eu deixo claro e nenhuma outra me convida."

Os preparativos no barracão da Vai-Vai na Fábrica do Samba II, na Vila Guilherme, Zona Leste de São Paulo — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

Carro alegórico da Vai-Vai para desfile de 2020 — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

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