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Economia

Queda de braço entre equipe de Guedes e Planalto trava reforma administrativa

Auxiliares de Bolsonaro defendem 'timing político' para enviar texto a Congresso. Para Economia, objetivo é blindar servidor
Reforma administrativa: avaliação no Planalto é que proposta defendida por Guedes pode acabar com as carreiras de Estado e que, por isso, é preciso passar um pente-fino no texto Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo
Reforma administrativa: avaliação no Planalto é que proposta defendida por Guedes pode acabar com as carreiras de Estado e que, por isso, é preciso passar um pente-fino no texto Foto: Daniel Marenco/Agência O Globo

BRASÍLIA — O vaivém do governo em torno do envio da proposta própria de reforma administrativa ao Congresso tem como pano de fundo uma queda de braço entre a equipe econômica e ministros que estão na "cozinha" do Palácio do Planalto.

Pessoas próximas ao ministro da Economia, Paulo Guedes, têm atribuído o impasse à atuação de auxiliares mais próximos ao presidente Jair Bolsonaro, entre os quais o chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira.

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De acordo com relatos, Jorge teria o apoio dos ministros da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, e da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, para segurar o texto.

Embora em alas opostas no Planalto, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, também teriam se juntado ao time dos que trabalharam para convencer o presidente de que o texto não está redondo e que é preciso cautela antes de enviá-lo ao Congresso.

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Ministros ponderam que o chefe da Economia tem perfil mais técnico e pouca experiência política e, portanto, precisa esperar o tempo certo, que será dado pelo presidente. Bolsonaro é conhecido por usar as redes sociais como termômetro do sentimento das ruas. A avaliação é que ele está buscando o momento ideal para isso.

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Na Economia, a avaliação é que o discurso do timing político é apenas uma desculpa para blindar os servidores públicos.

Ou seja, de acordo com integrantes da equipe econômica, o Planalto estaria atuando de maneira corporativista para evitar a implantação das novas regras que podem alterar, entre os outros pontos, o regime de contratação e planos de carreira.

A avaliação no Planalto, no entanto, é que a proposta defendida por Guedes pode acabar com as carreiras de Estado e que, por isso, é preciso passar um pente-fino no texto.

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Em conversas reservadas, integrantes do governo dizem que, no fundo, a intenção do ministro da Economia era privatizar o serviço público.

Nesse contexto, a atuação de Jorge Oliveira tem sido classificada como a de um zagueiro — fundamental para segurar arroubos na proposta. Pessoas próximas ao ministro dizem que ele não é contra o projeto, mas está preocupado em preservar carreiras tidas como fundamentais para o Estado, como as jurídicas e as diplomáticas.

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Como o impasse em torno do texto está longe de ser solucionado, auxiliares de Bolsonaro no Planalto dizem ver as digitais de Paulo Guedes nos movimentos desta terça-feira, quando foi vazada a possibilidade de o governo abrir mão de sua proposta própria e oferecer "sugestões" a uma outra PEC já tramitando no Congresso.

A avaliação é que Guedes tem feito pressão para que a reforma comece a tramitar no Congresso antes do Carnaval.

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Nesta terça-feira, Guedes teria tido uma conversa com Bolsonaro no gabinete presidencial para pedir que a proposta fosse enviada ao Legislativo ainda nesta quarta-feira. O texto já estava concluído, sinalizando que a equipe econômica cumprira sua parte no processo.

O presidente tem indicado a aliados, no entanto, que só pretende entregar o texto em março.

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Guedes tem pressa em enviar o projeto ao parlamento. A preocupação do ministro tem motivo: 2020 é ano eleitoral e deputados e senadores dedicam grande parte da agenda do segundo semestre à disputa. Assim, a discussão poderia ficar prejudicada se não fosse dada a largada imediatamente.

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Além disso, como a reforma também atinge servidores de Estados e municípios, há o temor de que parlamentares não tenham disposição de tratar de um tema que pode lhes prejudicar em suas bases eleitorais.

Ontem, após divulgada a intenção do governo de desistir do envio da proposta, deputados e senadores se rebelaram contra a tramitação de um texto próprio da Câmara. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) pressionou o governo, deixando claro que não aceitaria a alternativa proposta. O governo foi forçado a vir a público comunicar que vai mandar o projeto próprio.

O discurso era a de que haverá "vícios de iniciativa" caso o Congresso avance em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que deveria ser encaminhada pelo Executivo. Ou seja, só o poder executivo teria competência para propor ao Congresso alterações nas regras da sua gestão.