Entre algumas cotoveladas, Paulo Guedes conseguiu provar sua influência durante o ano inaugural de Jair Bolsonaro. O ministro contornou resistências políticas dentro do governo e dobrou até o próprio presidente para emplacar uma agenda amarga de ajustes nas contas públicas.
A ampliação da presença de militares em postos-chave do Palácio do Planalto deve lançar o chefe da equipe econômica numa nova competição. Ao cercar Bolsonaro, a ala fardada reforça também sua participação em decisões políticas que envolvem diretamente a pauta de Guedes.
Os representantes das Forças Armadas com assento no governo não chegam a discordar da cartilha liberal do ministro da Economia. Determinadas posições, no entanto, produzem pontos de atrito com alguns desses planos.
Partiram da ala militar, por exemplo, sinais de resistência que levaram Bolsonaro a hesitar no envio da reforma administrativa ao Congresso, ainda no ano passado.
O núcleo de inteligência do governo, dominado pela caserna, foi o responsável por levar ao presidente o alerta de que a proposta poderia ser o estopim de protestos como os que ocorriam no Chile naquela época.
A consolidação do grupo fardado no entorno de Bolsonaro cria um contraponto relevante nas discussões que ocorrem no centro do poder. O presidente ouvirá com cada vez mais peso vozes que tendem, em certas ocasiões, a se opor aos dogmas do ministro da Economia.
Confirmada a nomeação do general Walter Braga Netto para a chefia da Casa Civil, agora serão quatro os militares instalados em gabinetes que ficam a apenas alguns passos da cadeira presidencial.
A importância que Bolsonaro dá aos assuntos do grupo verde-oliva é evidente, ainda que eles se choquem com o rigor fiscal de Guedes. O governo, por exemplo, aumentou os investimentos no Ministério da Defesa num ano de penúria orçamentária e entregou uma reforma da Previdência que acabou favorecendo os militares.
Alguns integrantes da equipe econômica enxergam ainda, no núcleo fardado, os genes nacionalistas que marcaram a carreira política de Bolsonaro antes de sua conversão relâmpago ao liberalismo na eleição de 2018.
Seria exagero, entretanto, dizer que os ministros militares vão necessariamente torpedear a tentativa de Guedes de reduzir a participação do Estado na economia. Um almirante, afinal, vem tocando o processo de privatização da Eletrobras no Ministério de Minas e Energia —sob resistência do Congresso, e não das Forças Armadas.
Em governos passados, era comum a disputa entre a ala política e a equipe econômica pela chave do cofre da União. O primeiro time queria ampliar despesas para atender aliados e ampliar a popularidade do presidente, enquanto o segundo fazia questão de bloquear esses avanços para cumprir suas metas.
Guedes escapou de parte desses conflitos. Primeiro, obteve o status de superministro da área econômica, eliminando outras pastas que poderiam se tornar vozes dissonantes nessa disputa.
Depois, construiu uma aliança direta com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), reduzindo a necessidade de participação política do Palácio do Planalto nas negociações para a aprovação de suas reformas.
Fiador da agenda econômica do governo, Guedes teve relativa liberdade para executar esse trabalho ao longo do ano passado. Mas, como em qualquer relação de poder, o fortalecimento de um novo grupo pode acabar fechando espaços para outros.
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