Economia

Bolsa cai 12,17%, maior baixa diária desde 1998. Dólar fecha em alta a R$ 4,728, mesmo após intervenção do BC

Foi acionado o mecanismo de 'Circuit breaker', quando as negociações na Bolsa são paralisadas após queda de 10%. Ação da Petrobras caiu mais de 30%
Cédulas de dólar Foto: GETTY IMAGES
Cédulas de dólar Foto: GETTY IMAGES

SÃO PAULO - A escalada de pânico que o coronavírus causou no mercado financeiro, nos últimos meses, foi amplificada com a guerra de preços do petróleo aberta pela Arábia Saudita contra a Rússia no último final de semana. O Ibovespa, principal índice do mercado de ações, fechou com baixa de 12,17% aos 86.067 pontos.  O dólar comercial subiu 2,03% a R$ 4,728, novo recorde histórico. Na máxima do dia, a divisa bateu em R$ 4,790.

É a maior queda diária desde 10 de setembro de 1998, quando o índice caiu 15,8%. A bolsa está no menor patamar desde 27 dezembro de 2018, quando o índice fechou aos 85.460 pontos.

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Na mínima, o índice bateu em 85.879 pontos e na máxima chegou a 97.982, uma variação de 12.103 pontos em apenas um pregão. Desde a máxima história do dia 23 de janeiro, quando o ibovespa atingiu 119.527 pontos, o índice já se desvalorizou 38,8%.

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O dia foi de nervosismo nos mercados globais, com fortes quedas nas bolsas europeias e asiáticas. A Rússia avisou que pode resistir a uma queda nos preços por até uma década .  Pesou também a decisão do governo da Itália de colocar 16 milhões de pessoas no norte do país em quarentena para conter a disseminação do vírus.

Para Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs, em Nova York, como se não bastasse o coronavírus trazendo incerteza ao mercado financeiro, a guerra de preços do petróleo acrescenta um fator a mais de insegurança aos investidores.

-  Embora os governos se esforcem em conter o avanço do coronavírus, haverá um impacto muito grande e caminhamos a passos largos para uma recessão global. E agora, haverá queda da demanda e aumento da oferta do petróleo. Um novo viés negativo para o mercado - disse Ramos

No mercado de câmbio, o Banco Central brasileiro vendeu US$ 3 bilhões em recursos à vista. À tarde, a autoridade monetária fez mais um leilão no mercado à vista e vendeu US$ 465 milhões. Mesmo assim, a divisa americana fechou com valorização, seguindo a tendência do dólar no exterior.

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Pela manhã, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) acionou o mecanismo de circuit breaker , que é quando o Ibovespa, seu principal índice, cai mais de 10% e as negociações são interrompidas por 30 minutos para acalmar os operadores e evitar perdas adicionais aos investidores.

Meia hora depois da abertura dos negócios no pregão, às10h31min, o Ibovespa já caía 10,02%, batendo em 88.178 pontos, e o mecanismo do circuit breaker foi acionado.

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Foi a primeira vez que a Bolsa brasileira entrou em circuit breaker desde o 'Joesley day', que é como ficou conhecido no mercado financeiro o dia em maio de 2017 em que o colunista Lauro Jardim, do GLOBO, revelou áudios do empresário Joesley Batista que comprometiam o então presidente Michel Temer. O mecanismo é acionado quando o índice cai 10% e já foi utilizado pelo menos 17 vezes na Bolsa.

- Os mercados já estavam tensos com a falta de informações sobre os impactos do coronavírus. No final de semana, o preço do petróleo despencou com a guerra entre Arábia Saudita e Rússia. É um choque dentro de outro choque, agravando o nervosismo dos mercados - diz o economista-chefe do banco BV, Roberto Padovani, que observa que o grande temor dos investidores são as consequências que a apidemia pode trazer aos outros dois motores do crescimento mundial, além da China, que são EUA e Europa.

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Nos Estados Unidos, as principais Bolsas também acionaram o circuit breaker após queda de mais de 7%, depois da abertura dos negócios. Os negócios ficam suspensos por quinze minutos. Os índices americanos fecharam em queda superior a 7%, no pior dia desde a crise financeira de 2008.

É a primeira vez que os negócios em Wall Street são interrompidos desde as eleições presidenciais de 2016, quando os mercados também caíram abaixo do limite diário de 5%.

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Em relatório, a agência de classificação de risco Fitch Ratings afirma que "os efeitos do choque do petróleo podem durar muito mais do que aqueles provenientes do coronavírus".

Gerdau e Eletrobras caem mais de 10%

Quando os negócios foram paralisados na Bolsa, os papéis ordinários da petrobras (com direito a voto) perdiam 24,61% a R$ 18,14, enquanto os preferenciais (PN, sem direito a voto) caíam 23,96% a R$ 17,36. PN tinham queda de 24%.  Em apenas 30 minutos de negociações, a Petrobras perdeu R$ 74,7 bilhões em valor de mercado, passando de R$ 307 bilhões para R$ 232 bilhões.

No início desta tarde, a queda dos papéis da petrolífera se acentou e tanto as ações ON quanto PN entraram em leilão, após perdas de superiores 28%. No final da sessão, as preferenciais perderam 31,23% a R$ 15,70, enquanto as ordinárias recuaram 31,01% a R$ 16,60.

Foi a maior queda da história das ações da Petrobras. No Joesley Day, as ações da petroífera fecharam com queda de 15%. Na Bolsa de Nova York, as ADRS da Petrobras tinham queda de 31,40% a US$ 7,21 no encerramento dos negócios no Brasil.

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O banco Goldman Sachs cortou a previsão para os preços do petróleo Brent para o segundo e terceiro trimestres de 2020 para US$ 30 o barril, “com possíveis quedas de preços para níveis de estresse operacional e custos de caixa bem próximos de US$ 20 o barril”, conforme relatório a clientes.

“Ainda estamos passando por um momento perigoso, com extrema volatilidade. Não bastasse a piora no quadro da epidemia de coronavírus ameaçar estancar todo o crescimento econômico previsto, neste final de semana tivemos a guerra aberta pela Arábia Saudita no front da produção de petróleo contra a Rússia”, chamou a atenção a equipe do BTG Pactual.

Todas as ações do ibovespa fecharam em queda. Os papéis ordinários da BR Distribuidora perderam 9,66% a R$ 22,25. As ações ordinárias da Gerdau recuaram 15,64% a R$ 11,81, enquanto as ON da Eletrobras perderam 14,96% a R$ 27,51. As ações ordinárias da Vale encerraram com perda de 14,82% a R$ 38,00.

Os papéis preferenciais de Itaú perderam 8,03% a R$ 27,47 e os PN do Bradesco recuaram 7,03% a R$ 26,60.

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As Bolsas asiáticas fecharam em queda de mais de 5% e, na Europa, chegaram a recuar 8% nas negociações ao longo do dia. Na Europa, as quedas foram generalizadas. Frankfurt recuou 7,94%; Londres perdeu 7,69%; Paris teve baixa de 8,39% e Milão perdeu 11,17%

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Câmbio: intervenções vão continuar

No Brasil, o BC resolveu mudar sua estratégia e atuar no mercado à vista. Até semana passada, ele vinha intensificando sua atuação no câmbio por meio de contratos de swap cambial, um instrumento financeiro que funciona como uma espécie de oferta de dólares no mercado futuro.

Na sexta-feira, o BC já havia anunciado que faria um leilão de US$ 1 bilhão nesta segunda. Hoje, antes da abertura dos mercados, após o nervosismo global com a forte queda no preço do petróleo, a autoridade monetária elevou a oferta para US$ 3 bilhões. Desde 20 de dezembro do ano passado, o BC não atuava no mercado de dólar à vista.

Para tentar acalmar os mercados, o Fed, Federal Reserve, banco central americano, anunciou que também vai elevar suas injeções diárias no mercado em US$ 50 bilhões para US$ 150 bilhões.

O diretor de política monetária do Banco Central, Bruno Serra, disse em evento em São Paulo nesta segunda-feira, que a autoridade monetária vai continuar a atuar no mercado de câmbio pelo tempo necessário e enquanto julgar que está disfuncional, como atualmente.

O pânico dos investidores se reflete no chamado risco-país medido pelos contratos CDS (Credit Default Swap), uma espécie de seguro contra calotes dos governos. O CDS subiu 40% nesta segunda e chegou a 200 pontos, retornando ao patamar de dezembro de 2018. No Joesley Day, a alta do risco-país havia sido de 29%.

A 'guerra de preços' no petróleo

A disparada nos preços do petróleo ocorreu após uma reunião entre a Opep (Organização dos Países Produtores de Petróleo) e a Rússia, outro gigante do setor, terminar sem acordo. O grupo vinha tentando costurar um acordo há semanas, pois a demanda por petróleo despencou com o menor apetite chinês. A China, afetada pelo coronavírus , é o maior importador global da matéria-prima.

Mas, em reunião no final de semana, a Rússia decidiu não cooperar com o grupo para reduzir a produção e, consequentemente, elevar os preços. Rússia e o cartel do petróleo mantinham uma cooperação desde 2016.

Em represália, a Arábia Saudita anunciou que cortaria seus preços em mais de 10% e que aumentaria a produção a partir de abril. Para os sauditas, um volume maior de produção permite manter a receita com o petróleo, mesmo com os preços mais baixos.

O desentendimento entre a Opep e a Rússia encerrou mais de três anos de cooperação para apoiar o mercado. O banco Goldman Sachs anunciou esperar uma contração na demanda global em 150 mil barris de petróleo por dia. Já a Agência Internacional de Energia afirmou esperar uma retração na demanda de 90 mil barris por dia. Será o primeiro retrocesso do consumo desde 2009.