Por Patrícia Figueiredo, G1 SP — São Paulo


Curva de mortes no estado de SP — Foto: Arte/G1

Pesquisadores que acompanham a evolução do novo coronavírus no estado de São Paulo alertam que a curva de mortes causadas pela doença, que chegou a entrar em processo de achatamento, teve forte aceleração nos últimos 15 dias. Os cientistas admitem a possibilidade de que o vírus não cause um pico de contaminação, mas sim um platô, como os especialistas classificam uma situação de pico contínuo, que demora a cair. Nesse caso, o número de novos casos por dia se mantém alto por várias semanas seguidas e a capacidade da rede hospitalar se esgota, levando ao colapso do sistema.

Nas últimas duas semanas o estado de São Paulo viu a taxa de contágio - que é o número de pessoas para as quais um infectado transmite o vírus - aumentar, o que causou recordes nos números de mortes e casos confirmados. Porta-vozes do governo, como o secretário da Saúde, José Henrique Germann, também demonstram preocupação com o aumento dos casos fora da capital: dados do governo estadual mostram que doença está se propagando 4 vezes mais rápido no interior e litoral.

Em 20 de março, o infectologista David Uip, ex-coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus em São Paulo, chegou a prever que o pico dos casos e mortes de coronavírus no estado ocorreria entre abril e maio. "O pico deve ser mais pro final de abril, meio de abril, e também maio. Isto é previsão", disse Uip.

Mas a imunologista Ester Sabino, que coordenou o primeiro sequenciamento genético do novo coronavírus no Brasil, avalia que a situação de São Paulo pode ser diferente daquela verificada em países como a China e a Coreia do Sul, que já tiveram uma primeira onda de casos e mortes por Covid-19.

“O que pode ocorrer é não termos um pico de mortes, mas um platô, uma curva que fica um tempão lá no alto, com muitas novas mortes por dia. A gente queria que esse platô de casos ficasse sempre abaixo da capacidade das UTIs, mas não é essa a tendência que está se desenhando em São Paulo”, afirma Sabino, que é professora na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Cemitério da Vila Formosa em São Paulo durante pandemia de coronavírus — Foto: REUTERS/Amanda Perobelli

Ela explica que países como a China e a Coreia do Sul tiveram um pico de casos seguido por uma rápida diminuição porque tomaram medidas drásticas para conter a propagação do vírus.

“Aqui a gente seguramente vai ter novas ondas, e eu não sei nem se vamos poder chamar de ondas, porque pode ser que esse vírus consiga ficar mais num formato de platô, que nunca chegue a terminar a primeira onda”, avalia. “Na Itália, só conseguiram fazer parar de subir com o lockdown”. O país restringiu a circulação em todo seu território no dia 9 de março.

O professor de física na USP, José Fernando Diniz Chubaci, acompanha os dados do estado de São Paulo desde o início da pandemia e também acredita que os picos de casos e óbitos podem ser duradouros.

“O que ocorre é que depois do pico o gráfico demora muito tempo para descer. Isso define que vai demorar muito mais para você deixar de ter casos novos. Você vê que o gráfico da Itália, por exemplo, tem repiques: mesmo depois da semana de pico você tem dias que superam os dias anteriores”, explica.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), durante coletiva de imprensa no Palácio dos Bandeirantes, na capital paulista, nesta sexta-feira, 15 de maio de 2020. — Foto: MISTER SHADOW/ASI/ESTADÃO CONTEÚDO

Segundo Chubaci, o crescimento de casos e óbitos em São Paulo acelerou nas últimas duas semanas.

“Analisando gráficos em escala linear pude ver que os casos em São Paulo tiveram uma inclinação na semana passada muito mais íngreme que em toda a história dos dias analisados. No gráfico em escala logarítmica dá para perceber que o crescimento é exponencial, ele parou de ‘baixar’ como nas semanas anteriores”, afirma Chubaci.

Projeções feitas pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) indicam que, se for mantida a taxa de contágio observada nos trinta dias anteriores a 10 de maio, São Paulo contabilizará 53,5 mil novas infecções por dia no final de junho.

Desses, 20,8 mil casos diários serão no município de São Paulo. O número de óbitos diários atingirá 2,5 mil no estado, dos quais 1,1 mil ocorrerão na cidade de São Paulo.

A projeção concluiu que a adoção de lockdown obrigatório no estado seria inevitável caso o nível de isolamento social não suba significativamente nas próximas semanas, segundo o matemático Renato Pedrosa, professor do Instituto de Geociências da Unicamp e coordenador do Programa Especial Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação da FAPESP.

As estimativas foram feitas com um modelo desenvolvido por Pedrosa que permite estimar a dinâmica de transmissão do vírus em diferentes locais, levando em conta variáveis climáticas, como temperatura e umidade absoluta, a densidade populacional e a linha do tempo da propagação da doença, com informações como a data em que o país ou a região atingiu a marca de 100 casos.

Curvas de casos de coronavírus em São Paulo — Foto: Arte/G1

Neste domingo (17), o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), enviou à Câmara pedido para antecipar feriados municipais para tentar fazer a cidade parar e ampliar o índice de isolamento da cidade.

Covas também anunciou a retomada do rodízio tradicional, após a medida mais restritiva não surtir efeito.

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