Por G1 e TV Globo — Brasília


Após demissão, Ministro da Ciência e tecnologia apresenta nova estrutura do Inpe

Após demissão, Ministro da Ciência e tecnologia apresenta nova estrutura do Inpe

Técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) escreveram em uma carta, no último dia 7 de julho, que existe uma "estrutura paralela" no órgão.

Segundo esses técnicos, a "estrutura paralela" criada "incluiu a verticalização e unificação de comando aos moldes das estruturas militares".

O Ministério da Ciência e Tecnologia informou que comentará o assunto nesta terça (14), em uma entrevista coletiva na qual explicará a "nova estrutura do Inpe".

"Nos últimos dois meses, vivemos uma situação peculiar e única na história do Inpe. Existe uma estrutura administrativa oficial, a que está no regimento atual e válido, e uma estrutura paralela, que opera , governa e decide sobre o Inpe, mas que não existe na regulação administrativa. É importante ressaltar que essa estrutura paralela de gestão incluiu a verticalização e unificação de comando aos moldes das estruturas militares, claramente na contramão das tendências atuais de pesquisas em redes colaborativas com liberdade acadêmica e autonomia científica", escreveram os pesquisadores.

Segundo os autores da carta, o atual diretor interino do instituto, Darcton Damião, tem pedido aos servidores a apresentação de planos de trabalho para a instituição, podendo utilizar a "estrutura paralela" para "promover a construção de seu plano de trabalho, documento que precisa ser apresentado ao Comitê de Busca".

"Isso lhe proporciona clara vantagem sobre os outros postulantes [ao cargo de diretor], uma vez que utiliza informações institucionais fundamentais relativas à reestruturação da gestão técnico-científica ora em curso, que só ele possui e às quais não foi dado o direito de acesso a outros candidatos", afirmam os técnicos.

Governo exonera a responsável pelo monitoramento da Amazônia no Inpe

Governo exonera a responsável pelo monitoramento da Amazônia no Inpe

Polêmicas no Inpe

Mais cedo, nesta segunda-feira (13), o governo exonerou a coordenadora-geral de Observação da Terra do Inpe, Lubia Vinhas. O departamento é responsável pelo monitoramento da devastação da Amazônia.

A exoneração de Lubia Vinhas foi publicada três dias após o Inpe ter informado que a Amazônia registrou novo recorde nos alertas de desmatamento em junho.

Lubia afirmou à TV Globo que é servidora concursada do Inpe há 23 anos e, por isso, deve seguir no instituto, mesmo sem o cargo de gestão. Ela também afirmou não saber o motivo da exoneração e disse que ficou sabendo da mudança pelo "Diário Oficial da União".

De acordo com o Inpe, Lubia será remanejada para outro cargo. Segundo o instituto, ela será "chefe da Divisão de Projeto Estratégico, que tratará implementação da nova Base de Informações Georreferenciadas ("BIG") do INPE, uma demanda do Ministro Pontes".

Procurado pelo G1 nesta segunda-feira (13), o Inpe informou, nesta terça (14), que a manifestação do instituto sobre a carta é a mesma divulgada após a exoneração da coordenadora-geral de Observação da Terra.

Na nota (leia a íntegra mais abaixo), o órgão afirma que seu processo de reestruturação tem como principal objetivo buscar sinergias e otimizar os recursos humanos e de infraestrutura para um funcionamento mais eficiente.

"Nesse sentido, desde o início das conversas sobre a reestruturação, já estava prevista a relocação da Dra. Lubia Vinhas do cargo de Coordenadora-Geral da CGOBT para o cargo de Chefe da Divisão de Projeto Estratégico, que tratará implementação da nova Base de Informações Georreferenciadas ("BIG") do INPE, uma demanda do Ministro Pontes. Esta, por sinal, é a área primária de formação e expertise da Dra. Lubia Vinhas", cita a nota.

O instituto afirmou ainda que as atividades associadas ao monitoramento do desmatamento da Amazônia, bem como as demais atividades operacionais, "continuarão sendo realizadas e tendo como premissas os critérios técnicos e científicos de praxe".

Queda do ex-diretor

Além disso, em 2019, o então diretor do Inpe, Ricardo Galvão, deixou o cargo após uma polêmica com o presidente Jair Bolsonaro.

Na ocasião, Bolsonaro criticou o Inpe por divulgar dados sobre desmatamento na Amazônia.

Íntegra

Leia a íntegra da carta dos técnicos do Inpe:

Para nós, abaixo assinados, Pesquisadores e Tecnologistas seniores do INPE (ativos e aposentados-colaboradores), reside em V.S.ª uma oportunidade de evitar uma tragédia no campo das instituições públicas do estado brasileiro, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Em agosto próximo, quando o INPE completará 59 anos, talvez seja também o primeiro aniversário do início de seu fim como o conhecemos.

O INPE é uma instituição civil, do Estado brasileiro e não a serviço de governos. Que passou pelos turbulentos anos pré-golpe civil-militar de 1964, produziu com independência e autonomia científica durante todo o período da ditadura e chegou aos anos da redemocratização. Neste período, o INPE construiu espaços de transparência e maior participação de sua comunidade em órgãos colegiados e nas escolhas de seus dirigentes e gestores. A própria escolha do Diretor através de um Comitê de Busca (CB) foi um avanço deste período recente.

Em apenas 10 meses após sua nomeação como Diretor Interino do INPE, após a exoneração do Dr. Ricardo Galvão, o Coronel da Aeronáutica Darcton Policarpo Damião (na reserva), está prestes a concluir a primeira fase de um projeto de transformação institucional.

O Diretor interino que, comunicou que apresentará sua candidatura para o processo de seleção em curso, tem prosseguido, em virtual sigilo, com uma reestruturação da instituição sem qualquer critério, técnico ou de gestão, aceitável. Em uma decisão totalmente autoritária, sem se saber de onde veio, estabeleceu uma nova estrutura de gestão, que está sendo implantada via um novo Regimento Interno, o documento maior que estabelece as normas de funcionamento institucional. Mais grave, nos últimos dois meses vivemos uma situação peculiar e única na história do INPE. Existe uma estrutura administrativa oficial, a que está no regimento atual e válido, e uma estrutura paralela, que opera , governa e decide sobre o INPE, mas que não existe na regulação administrativa. É importante ressaltar que essa estrutura paralela de gestão incluiu a verticalização e unificação de comando aos moldes das estruturas militares, claramente na contramão das tendências atuais de pesquisas em redes colaborativas com liberdade acadêmica e autonomia científica.

Com isso, o diretor interino tem demandado dos servidores a apresentação de planos de trabalho para a instituição, e poderia, assim, utilizar esta estrutura paralela para promover a construção de seu plano de trabalho, documento que precisa ser apresentado ao Comitê de Busca. Isso lhe proporciona clara vantagem sobre os outros postulantes, uma vez que utiliza informações institucionais fundamentais relativas à reestruturação da gestão técnico-científica ora em curso, que só ele possui e às quais não foi dado o direito de acesso a outros candidatos.

É claro que esta situação coloca o Diretor interino com uma vantagem competitiva, mas em nossa perspectiva, no mínimo antiética, em relação a qualquer outra candidatura. Os outros candidatos NÃO tiveram acesso às propostas sendo urdidas em silêncio e, aparentemente, em acordo com o MCTI. Em um concurso com igualdade de condições, TODOS os candidatos deveriam estar alertados de que deveriam apresentar seus Planos de Trabalho com base no Regimento Interno vigente, já que este é o Regimento Interno oficial e válido. O Regimento sendo gestado, segundo o Diretor interino, com apoio do MCTI, em realidade é desconhecido da comunidade e, pasme, este Comitê de Busca, provavelmente, também desconhece.

Isto aponta para um favorecimento do MCTI à possível candidatura do Diretor interino considerando o fato de que qualquer outra candidatura não tem acesso e desconhece os arranjos sendo feitos entre a Direção interina e o Ministério para a transformação do Regimento interno e da atual Estrutura de Gestão, ficando estas candidaturas impossibilitadas de acomodar em seus Planos propostas que abordem o INPE a partir desta perspectiva.

Neste momento, seria fundamental com a ajuda de V.S.ª, que todos os membros do CB pudessem ser alertados desta situação e das dificuldades que ela cria para um processo de seleção sem vieses e sem questionamentos.

No limite, o Comitê de Busca terá que enfrentar o dilema entre desclassificar o atual Diretor interino, por eventualmente apresentar um plano de gestão completamente desalinhado ao INPE que hoje existe oficialmente, ou desclassificar os demais candidatos, por apresentarem planos em desacordo com a estrutura prestes a ser implantada.

Seria importante que QUALQUER alteração no Regimento interno em curso e, portanto, na estrutura de gestão atual só fosse conduzida APÓS a nomeação do novo Diretor efetivo da instituição pelo MCTI, a partir da escolha de um dos nomes da lista tríplice produzida por este Comitê de Busca, no qual depositamos plena confiança.

Também que fosse dado amplo acesso aos documentos secretos relativos a esta nova estrutura e Regimento para toda a comunidade, para o CB e para todos os postulantes homologados. Desta forma, poderemos ter um pouco de luz sobre propostas urdidas em segredo, que contemplam mudanças estruturais muito sérias e profundas, capazes de paralisação institucional e de inviabilizar o INPE no seu aniversário de 59 anos.

Atenciosamente,

Acioli Antonio de Olivo, Dr. – LABAC/COCTE

Antonio Miguel Vieira Monteiro, DPhil – DPI/CGOBT

Antonio Lopes Padilha, Dr. – DIDGE/CGCEA

Evlyn Márcia Leão de Moraes Novo, Dr. - DSR/CGOBT

Fernando Manuel Ramos, Docteur - LABAC/COCTE

Gino Genaro, Dr. DIDSE/ETE

Maria Isabel Sobral Escada, Dr. - DPI/CGOBT

Maria Virgínia Alves, Dra. – DIDGE/CGCEA

Nandamudi Lankalapalli Vijaykumar, Dr. – LABAC/COCTE

Ricardo Cartaxo Modesto de Souza, Eng. Senior - DPI/CGOBT

Ronaldo Arias, Dr. – DIDEA/ETE

Sergio Rosim, Dr. - DPI/CGOBT

Solon Venâncio de Carvalho, Docteur – LABAC/COCTE

Leia a íntegra da nota do Ministério da Ciência e Tecnologia sobre e entrevista desta terça (14):

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) esclarece que a exoneração da Dra. Lubia Vinhas publicada no Diário Oficial da União é parte de sua realocação do cargo de Coordenadora-Geral da CGOBT para o cargo de Chefe da Divisão de Projeto Estratégico, a ser criado no âmbito da reestruturação do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que está sendo executada em sintonia com o MCTI.

A reestruturação que será apresentada em coletiva de imprensa realizada nesta terça-feira (14), tem o objetivo de buscar sinergias e otimizar os recursos humanos e de infraestrutura do Instituto para um funcionamento mais eficiente. A Dra. Lubia Vinhas tem participado desse processo e está de acordo com as mudanças, que eram previstas e não tem qualquer relação com a produção e a divulgação dos dados de desmatamento, que continuarão a seguir os mesmos procedimentos com qualidade e transparência.

Nesta terça-feira (14) será realizada uma coletiva de imprensa na sede do MCTI, em Brasília, para apresentar a nova estrutura do Inpe, com a participação do ministro do MCTI, astronauta Marcos Pontes, e o diretor do Inpe, Darcton Damião.

Leia a íntegra da nota do Inpe sobre a exoneração da Coordenadora-geral de Observação da Terra:

O processo de reestruturação do INPE, em curso e sob demanda do ministro do MCTI Astronauta Marcos Pontes, tem como principal objetivo buscar sinergias e otimizar os recursos humanos e de infraestrutura do Instituto para um funcionamento mais eficiente. O INPE completará no dia 3 de agosto de 2020 seus 59 anos de idade tendo assumido a partir de 2010, como uma de suas duas missões principais ao lado da reconhecida área espacial, a área de monitoramento ambiental do território nacional. A missão finalística do INPE, portanto, não diz respeito somente ao estudo do espaço exterior e suas conexões com o planeta e o desenvolvimento de tecnologias espaciais nacionais com repasse à nossa indústria, mas também o que se denominava até há pouco de "aplicações espaciais" para o estudo do ambiente terrestre. Nesse contexto, juntamente com a Coordenação de Observação da Terra (CGOBT), o INPE criou e mantém a Coordenação Geral do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) e o Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CCST). Com o suporte de vários campi do INPE em várias cidades do País, o INPE também mantém centros de controle e rastreio de satélites, recepção de imagens e observatórios espaciais.

Infelizmente, desde 2010, o INPE perdeu mais de 600 servidores sem a devida reposição via concursos públicos. No mesmo período, ocorreu uma demanda cada vez maior de nossa sociedade por produtos singulares do INPE relativos à área de Ciência da Terra como a previsão numérica de tempo e clima, o monitoramento dos biomas brasileiros, dos oceanos e das áreas de agricultura e pecuária, o desenvolvimento de programas de mitigação para cenários de mudanças globais, estudos sobre o balanço de carbono terrestre e oceânico, poluição e eletricidade atmosféricas, assim como de ensino, pesquisa e extensão em áreas relacionadas ao sensoriamento remoto e previsão de tempo e clima. Esses eixos fundamentais de ameaça nos forçaram necessariamente a mudar, visando, em primeiro lugar, aumentar a eficiência dos nossos trabalhos e melhorar nosso atendimento às demandas do governo e da sociedade brasileira em geral.

Notou-se também que o INPE, devido às atribuições crescentes ao longo de sua história, carecia de uma maior integração transversal entre suas áreas, programas e operações. Notou-se, por exemplo, a partir da crise imposta pelo aumento do desmatamento verificado no bioma Amazônia em 2019, seguido de um aumento considerável de queimadas no mesmo bioma e período, que nossas equipes do Programa Amazônia e Demais Biomas (AMZ+) e Queimadas, respectivamente lotadas na CGOBT e CPTEC, poderiam render mais se trabalhassem juntas. Um outro exemplo da sinergia entre essas coordenações ocorreu durante a crise do derramamento de óleo no litoral brasileiro no final de 2019, quando o INPE, por meio do trabalho integrado da CGOBT e do CPTEC desenvolveu um trabalho extraordinário em apoio ao Grupo de Acompanhamento e Análise (GAA) do Ministério da Defesa, IBAMA e ANP, nas áreas de sensoriamento remoto dos oceanos e de previsão numérica de correntes marinhas. Do INPE partiu a hipótese principal de que a origem do óleo aportado às nossas praias teria origem em oceano profundo.

O processo de reestruturação do INPE, desenhado para modernizar o Instituto e adaptá-lo para melhor responder às pressões ora impostas, teve início em outubro de 2019. Desde então e até o final de fevereiro de 2020, ocorreram discussões internas com os servidores do Instituto sobre como o INPE poderia avançar científica e tecnologicamente, além de explorar as possíveis sinergias entre as áreas. Nas reuniões que ocorreram com os servidores da CGOBT, CPTEC e CCST, foi realizado um estudo sobre as sinergias das atividades dessas coordenações e foi estabelecida a criação da Coordenação-Geral de Ciências da Terra, que responderá por todo o trabalho da área ambiental do INPE. Nessa nova coordenação, nossos servidores, bolsistas e estagiários das áreas ligadas ao ambiente terrestre irão trabalhar juntos. Ali concentrar-se-ão servidores com formação nas áreas de ecologia, biologia, oceanografia, meteorologia, geologia, agronomia, engenharia florestal, computação científica, física e outras. O trabalho integrado desses servidores certamente permitirá avanços em atividades do INPE associadas ao melhoramento das previsões numéricas de tempo e clima, bem como a melhor estruturação de bancos de dados georreferenciados.

Nesse sentido, desde o início das conversas sobre a reestruturação, já estava prevista a relocação da Dra. Lubia Vinhas do cargo de Coordenadora-Geral da CGOBT para o cargo de Chefe da Divisão de Projeto Estratégico, que tratará implementação da nova Base de Informações Georreferenciadas ("BIG") do INPE, uma demanda do Ministro Pontes. Esta, por sinal, é a área primária de formação e expertise da Dra. Lubia Vinhas.

A Direção do Instituto reforça que as atividades associadas ao monitoramento do desmatamento da Amazônia, bem como as demais atividades operacionais do Instituto continuarão sendo realizadas e tendo como premissas os critérios técnicos e científicos de praxe.

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