Rodrigo Peñaloza
2 min readNov 8, 2019

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ODERINT DUM METUANT
(Rodrigo Peñaloza, 4-X-2019)

É da peça Atreus, vv. 203–204, de Lucius Accius, o trecho que passou para a história como a definição do tirano: oderint dum metuant (“que odeiem enquanto temam”). Accius é da segunda metade do século II a.C. (170 a.C — c. 70 a.C.), compôs mais de 40 peças inspiradas na tragédia grega e pelo menos duas fabulae praetextae: Brutus e Decius Mus. Esse Brutus é o antigo fundador da República, não o que conspirou contra César, embora fosse dele descendente. Abrindo um parêntesis, é interessante como dois Bruti determinam a República Romana: um, sua fundação; outro, seu fim.

Accius escreveu também uma história em versos do teatro grego e latino, em 9 livros, Didascalica. No poema Annales, em hexâmetros, descreve os festivais religiosos que se celebravam anualmente em Roma. A famosa frase oderint dum metuant costumava usá-la o imperador Calígula. Cícero o considerava grande e importante. Velleius Paterculus (Historia Romana, I.17.1) dizia de Accius: In Accio circaque eum romana tragoedia est (“A tragédia romana está em Accio e em torno dele”).

Accius viveu num período muito conturbado da história de Roma, justamente aquele no qual os irmãos Tiberius e Gaius Gracchus estiveram envolvidos nas tentativas de reforma agrária — e em razão do que foram assassinados -, de diminuição do poder do Senado e de melhorias nas condições políticas e civis do povo romano e seus aliados.

Accius nasceu em Pisaurum, região da Úmbria, também terra do autor latino Plauto, famoso por suas comédias. Foi contemporâneo de Pacuvius, outro grande autor latino de tragédias.

Embora Accius e Pacuvius tivessem estilos distintos, têm em comum o fato de terem trazido para a cultura romana a tragédia grega. Foi esse o período inicial da helenização da cultura romana e, se bem me atrevo a opinar sobre isso, ambos tinham, de fato, essa missão espiritual perante o grandioso futuro destinado a Roma na formação da cultura ocidental.

Dicas de leitura:

Anthony James Boyle (2006): An Introduction to Roman Tragedy. Routledge, cap. 4 (Tragic apex: poetic form and political crisis).

Jordí Induraín Pons (ed.) (1012): Diccionario de Culturas Clásicas. Vox.

Maria Helena da Rocha Pereira (2013): Estudos de História da Cultura Clássica, vol. 2 — Cultura Romana. Fundação Calouste Gulbenkian, 5a ed., pp. 92–93.

Na gravura, a representação de uma cena da tragédia perdida Astyanax, de Accius, em que Astyanax (Ἀστυάναξ), filho do príncipe troiano Heitor (Hector, Ἕκτωρ) e de Andrômaca, é jogado, por Neoptólemo, filho de Aquiles, do alto do muro de Troia na presença da mãe. Essa cena é parte da mitocultura grega e está presente em outras tragédias relativas a Troia, como As Troianas, de Eurípedes. Não consegui encontrar o autor da gravura.

Clique aqui acessar o que resta da obra de Accius em Latim.

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Rodrigo Peñaloza

PhD in Economics from UCLA, MSc in Mathematics from IMPA, Professor of Economics at the University of Brasilia.