Política Brasília

Raquel Dodge pede que STJ e CNJ investiguem desembargador que mandou soltar Lula

PGR disse que ato foi 'orquestrado' e cita quase 20 anos em que Favreto foi do PT
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, durante sessão do STF Foto: Jorge William/Agência O Globo/03-05-2018
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, durante sessão do STF Foto: Jorge William/Agência O Globo/03-05-2018

BRASÍLIA — A procuradora-geral da República, Raquel Dodge , pediu a abertura de investigações no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para apurar a conduta do desembargador Rogério Favreto , do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). No domingo, na condição de desembargador plantonista, ele deu duas decisões pela liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre outras coisas, Dodge pede até mesmo a aposentadoria compulsória de Favreto.

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Nos pedidos, a procuradora-geral cita os quase 20 anos em que Favreto foi filiado ao PT , e diz que teria ocorrido um ato "orquestrado" com os deputados do partido que apresentaram o habeas corpus em nome de Lula. Afirma também que ele "desonrou a higidez e a honorabilidade de seu cargo"; que, por motivos pessoais, "pretendeu favorecer" o ex-presidente, agindo com parcialidade e desrespeitando a Constituição; e que suas condutas "afrontam a ética e a imparcialidade", além de terem sido impróprias a um magistrado.

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No STJ, Dodge pediu a abertura de inquérito para apurar se houve crime de prevaricação, que tem pena de três meses a um ano, mais multa. Segundo o Código Penal, prevaricação é "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal".

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No CNJ, a procuradora-geral pediu a condenação por infração disciplinar, com a consequente aposentadoria compulsória. Favreto teria violado normas regimentais sobre o plantão judiciário. Também teria afrontado a autoridade da 8ª Turma do TRF-4, que mandou prender Lula em abril, e do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), que negaram vários pedidos de liberdade.

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No domingo, Favreto, na condição desembargador plantonista do TRF4, determinou a soltura de Lula. Mas, segundo Dodge, ele não tinha poder para revogar a prisão, ordenada em abril deste ano pela 8ª Turma do TRF-4, composta por três desembargadores.

Ainda no domingo, o juiz Sérgio Moro, responsável pela primeira condenação do ex-presidente na Lava-Jato, foi contra a soltura de Lula. Assim, ele consultou o presidente do TRF-4, desembargador Thompson Flores, e o relator do caso na 8ª Turma, desembargador João Pedro Gebran Neto. Pouco depois, Gebran determinou a continuidade da prisão. Mas Favreto deu nova decisão pela liberdade. Em seguida, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), o presidente do TRF-4 determinou que valeria a decisão de Gebran, e não a de Favreto. Assim, Lula continuou detido.

"A escala de plantão do TRF4 para o mês de julho de 2018 foi publicada no final do mês anterior, junho. A partir daí, soube-se que o representado estaria de plantão a partir de 4 de julho de 2018. Ocorre, porém, que a impetração logo no fim do expediente do dia 4, a partir das 19 horas, não seria a melhor alternativa estratégica, pois uma decisão concertada com o representado seria prontamente revista pelo juiz natural a partir das 11 horas do dia 5. O ideal, portanto, foi protocolar o HC (habeas corpus) na noite da sexta-feira, para que o representado exercesse a jurisdição plantonista de forma ininterrupta, até segunda-feira, 11 horas", escreveu a procuradora-geral.

Sobre o tempo em que Favreto foi filiado ao PT, Dodge destacou os vários cargos que ocupou em administrações do partido na prefeitura de Porto Alegre e no governo federal.

“Este histórico profissional legítimo ganha relevância específica no contexto da infração praticada pelo representado, pois revela que o estreito e longevo vínculo com o partido político do réu, com sua administração e com a administração de outros próceres do mesmo partido, teve efeito na quebra da impessoalidade da conduta do magistrado. Este histórico revela que a conduta do representado não favoreceu um desconhecido, mas alguém com quem manteve longo histórico de serviço e de confiança e que pretendeu favorecer", avaliou Dodge.

Dodge também refutou o argumento de Favreto de que seria necessário libertar Lula em razão de um fato novo: sua pré-candidatura à presidência da República. Para o desembargador plantonista, seria necessário soltá-lo para ficar em igualdade de condições com os outros postulantes ao cargo.

"A autoproclamada condição de pré-candidato de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República está longe de ser fato novo. Muito pelo contrário, trata-se de fato público e notório, por todos conhecido há muito tempo – inclusive, obviamente, por todas as instâncias jurisdicionais que apreciaram as tentativas da defesa de obstar o início da execução da pena de Luiz Inácio Lula da Silva", escreveu a procuradora-geral, concluindo: "De fato, o que aconteceria se todo preso em regime fechado se anunciasse pré-candidato? Seriam todos soltos pelo representado em sede de plantão?"

Por meio da assessoria de comunicação do TRF-4, Favreto informou que não vai se manifestar sobre o assunto.