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Na contramão da região e da maior parte do mundo, Bolsonaro mantém silêncio sobre vitória de Biden

Na América do Sul, só Brasil e Suriname ainda não se manifestaram. Mundialmente, país faz parte de grupo seleto, ao lado de China, México e Rússia
(Mar a Lago - Flórida, 07/03/2020) Presidente da República Jair Bolsonaro cumprimenta o Senhor Presidente dos Estados Unidos Donald Trump.
Foto: Alan Santos/PR Foto: Alan Santos / Agência O Globo
(Mar a Lago - Flórida, 07/03/2020) Presidente da República Jair Bolsonaro cumprimenta o Senhor Presidente dos Estados Unidos Donald Trump. Foto: Alan Santos/PR Foto: Alan Santos / Agência O Globo

BRASÍLIA — O silêncio do presidente Jair Bolsonaro e do governo brasileiro no dia seguinte à confirmação da vitória de Joe Biden sobre Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos consolidou a posição do país em um clube cada vez mais restrito e isolado. Na América do Sul, por exemplo, apenas Brasil e Suriname não se manifestaram sobre o resultado do pleito até ontem à noite. Presidentes da Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Venezuela, Equador, Guiana, Paraguai, Peru e Uruguai, vários deles de direita, já parabenizaram Biden e a vice-presidente eleita, Kamala Harris.

No Palácio do Planalto, circula a justificativa de que não há o que fazer além de esperar um suposto "resultado oficial", apesar de tradicionalmente o desfecho das eleições ser decretado pela mídia americana. Não há nos Estados Unidos um órgão central da Justiça eleitoral. Um ministro ouvido pelo GLOBO destacou que "trata-se de uma posição que cabe exclusivamente ao chefe de Estado"  —no caso, Bolsonaro.

A decisão do presidente de não parabenizar Biden por sua eleição causou surpresa entre diplomatas. Após o discurso de vitória do presidente eleito, no último sábado à noite, alguns esperaram que o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, fosse chamado por Bolsonaro para uma conversa no Palácio do Alvorada, o que não ocorreu.

Além do Brasil, a China de Xi Jinping, a Rússia de Vladimir Putin e o México de Andrés Manuel López Obrador são alguns dos poucos países que não haviam reconhecido a vitória de Biden até a noite de ontem. O presidente mexicano afirmou que aguardará a resolução de "questões jurídicas" das eleições presidenciais para não ser imprudente e nem agir de forma leviana. Trump se recusou a aceitar a vitória do adversário e entrou na Justiça em alguns Estados americanos.

Até mesmo aliados de Trump, como os primeiros-ministros do Reino Unido, Boris Johnson, de Israel, Benjamin Netanyahu, e da Hungria, Viktor Orbán, já congratularam Biden pela vitória, assim como líderes da Alemanha, França, Canadá, entre outros.

Oficialmente, o Planalto e o Ministério das Relações Exteriores sequer responderam os contatos da reportagem sobre o resultado das eleições americanas. Por e-mail, o Itamaraty apenas acusou o recebimento da mensagem, "que será respondida com a brevidade possível", na tarde de ontem.

Nas redes sociais, nem o presidente, nem o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que preside Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, ou o próprio Araújo comentaram o resultado eleitoral. Um silêncio sepulcral tomou conta do Itamaraty, à espera de um posicionamento de Bolsonaro.

Ainda na noite de quinta-feira, quando a apuração já estava avançada, o assessor internacional da Presidência, Filipe Martins — considerado especialista em politica americana por Bolsonaro —, disse a interlocutores que esperava a vitória de Trump com 280 delegados, repetindo uma previsão transmitida em círculos da extrema direita internacional que não se concretizou. Na quarta-feira, o presidente voltou a manifestar torcida por Trump disse que "a esperança é a última que morre".

Trump é o principal aliado no cenário global de Bolsonaro, que, em quase dois anos no cargo, afastou-se de Argentina, União Europeia e China. Por diversas vezes o presidente quebrou a praxe diplomática e afirmou publicamente que torcia para o candidato republicano. O presidente eleito Joe Biden, por sua vez, já manifestou publicamente muitas vezes que pretende tomar ações pela preservação da Amazônia, indo contra a política ambiental do governo brasileiro.

Na sexta-feira, durante um discurso em Florianópolis, Bolsonaro pregou humildade e disse que Trump "não é a pressoa mais importante do mundo".

— Eu não sou a pessoa mais importante do Brasil, assim como Trump não é a pessoa mais importante do mundo, como ele mesmo diz. A pessoa mais importante é Deus, a humildade tem que se fazer presente entre nós — declarou.