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Saúde Coronavírus

Sem acordo local, vacina da Pfizer contra Covid-19 ainda é promessa distante para população brasileira

Resultados anunciados são considerados 'promissores' mas, para o país, também há entraves na produção, armazenamento e transporte; notícia cria euforia no mercado financeiro
Enfermeira administra vacina da Sinovac contra Covid em voluntária em São Paulo Foto: AMANDA PEROBELLI / Reuters
Enfermeira administra vacina da Sinovac contra Covid em voluntária em São Paulo Foto: AMANDA PEROBELLI / Reuters

RIO - A notícia da eficácia de 90% da vacina da Pfizer/BioNTech em resultados preliminares do seu teste de fase 3 é, segundo especialistas, “promissora”. No entanto, ainda não há perspectivas de acesso a essa possível vacina para a população brasileira. No momento, há acordos no país com os imunizantes testados contra a Covid-19 comandados pela Universidade de Oxford e AstraZeneca e a Sinovac e o Instituto Butantan.

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No entanto, na tarde desta segunda, a divisão brasileira da Pfizer anunciou em comunicado que pretende reatar as negociações com o governo brasileiro para compra antecipada de lotes de sua vacina para Covid-19. E a notícia de que a vacina da Pfizer tem mais de 90% de eficácia na prevenção contra a Covid-19 trouxe uma dose de ânimo extra ao mercado financeiro , que já vinha tendo um dia de otimismo global depois que o democrata Joe Biden venceu as eleições presidenciais americanas . Na Europa, as Bolsas subiram até 7%. A Bolsa brasileira seguiu esse movimento. O Ibovespa chegou a subir mais de 4%, pela manhã, mas fechou com alta de 2,57%, aos 103.515 pontos.

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Mais cedo, a Pfizer Brasil havia informado ao GLOBO que não há nenhuma parceria acertada entre a farmacêutica e instituições ou governos no país. A empresa afirma que ofereceu a possibilidade de acordo com o governo federal, mas jamais obteve resposta. Procurado, o Ministério da Saúde ainda não retornou.

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Redes privadas

Sem acordo formal, uma vacina não é oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

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A vacina da Pfizer também não faz parte do programa internacional Covax, criado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) com o objetivo de acelerar o desenvolvimento de imunizantes candidatos contra a Covid-19 e ajudar a garantir acesso universal às futuras fórmulas. O Brasil faz parte da iniciativa.

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— É uma boa notícia, dá esperança de que essa vacina e outras possam realmente funcionar. Também é o primeiro resultado de fase 3, mas ainda é (um resultado) parcial. E, para o Brasil, provavelmente vamos contar mais com outras vacinas com as quais temos acordo bilateral ou com a Covax — afirma a presidente do Instituto Questão Ciência (IQC) e colunista do GLOBO, Natália Pasternak.

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Não é impossível que a vacina, uma vez aprovada em seus países de origem e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), possa ter lotes importados para serem vendidos em redes privadas, como hospitais e até farmácias. No entanto, as empresas já têm acordo fechado para oferecer de imediato 100 milhões de doses aos EUA e outras 200 milhões para a União Europeia. Também foram fechados acordos com os governos do Japão, Canadá e Reino Unido.

Complicações logísticas

O presidente da Sociedade Brasileira de Imunologia, Ricardo Gazzinelli, alerta que, como a vacina é feita com uma nova tecnologia, a partir do RNA mensageiro, a produção é mais complexa.

— As nossas fábricas ainda não sabem produzir esse tipo de vacina. Na verdade, muito poucas unidades no mundo dominam o processo, nunca foi feito, não há infraestrutura disponível — afirma Gazzinelli.

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A compra de lotes de eventual vacina Pfizer/BioNtech esbarraria em outras dificuldades: transporte e armazenamento.

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O imunizante da Pfizer precisa ser mantido a –70 graus Celsius. É um freezer muito mais potente do que os que os postos de saúde costumam ter.

Os equipamentos geralmente preservam material a –20 graus Celsius ou até a –4 graus, na temperatura de geladeira, nos postos.

— Armazenar a -20 em lugares remotos é complicado, mas possível. O problema é o –70. É uma situação que quase pode inviabilizar a vacina (no Brasil), mas os cientistas devem estar, agora mesmo, tentando reverter isso, para melhorar a estabilidade — diz Gazzinelli.

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Assim, essa eventual vacina precisaria ser transportada com gelo seco. Para a pneumologista da Fiocruz Margareth Dalcomo a candidata exige uma "rede de frio" extremamente complexa:

— Para um país continental, com as dificuldades logísticas que já enfrentamos, é complicado. O importante é que é mais uma vacina (com resultados positivos).

Para Dalcomo, é importante seguir na torcida:

— Sinovac e Oxford no Brasil também estão terminando seus estudos e devemos ter análises provisórias de fase 3 daqui a um mês. Com a AstraZeneca, por exemplo, já temos 30 milhões de doses encomendadas e a Fiocruz já iniciou o processo produtivo. Teremos vacina de razoável proteção e várias disponíveis no mercado, é preciso pensar em escala.