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‘Seria irresponsável’ dar data de início da vacinação contra Covid-19, diz secretário do Ministério da Saúde

Ministro do STF deu 48 horas para governo informar datas do plano de vacinação
Coronel Elcio Franco, que é secretário do Ministério da Saúde, com o presidente Jair Bolsonaro Foto: Jorge William/24.08.2020 / Agência O Globo
Coronel Elcio Franco, que é secretário do Ministério da Saúde, com o presidente Jair Bolsonaro Foto: Jorge William/24.08.2020 / Agência O Globo

BRASÍLIA — Em vídeo publicado nas redes sociais do Ministério da Saúde neste domingo, o secretário-executivo da pasta, Elcio Franco, afirmou que seria “irresponsável” fixar uma data para o início da vacinação contra Covid-19 no Brasil. Ele afirmou também que nenhum laboratório iniciou o processo de registro de imunizante na Anvisa.

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A declaração ocorreu no mesmo dia em que o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu prazo de 48 horas neste domingo para que o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, informe a previsão de data para começar e para terminar o plano nacional de vacinação contra o coronavírus. Ele quer saber inclusive a previsão de duração de cada uma das fases do planejamento.

— Seria irresponsável darmos datas específicas para o início da vacinação, porque depende de registro em agência reguladora, posto que só saberemos da segurança completa quando finalizados os estudos clínicos da fase 3. Vale ressaltar, mais uma vez, que nenhum dos laboratórios sequer iniciou o processo de autorização para uso emergencial em caráter experimental — disse, no vídeo.

Franco disse que a vacina que está sendo produzida pelo Instituto Butantã em parceria com o laboratório chinês Sinovac será comprada pelo governo federal e incluída no Plano Nacional de Imunização (PNI), caso ela tenha suas condições de “segurança e eficácia” confirmadas.

— Esclareço ainda que a vacina anunciada pelo Butantã, maior fornecedor de vacinas para o Ministério da Saúde, ao ser registrada e aprovada pela Anvisa, confirmando suas condições de segurança e eficácia, será também adquirida e adicionada ao Plano Nacional de Vacinação contra a Covid-19.

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A vacina está no centro de uma disputa entre o governador de São Paulo, João Dória, e o governo federal. O secretário-executivo do Ministério da Saúde atacou o governador paulista, que anunciou um plano prevendo o início da vacinação no estado em 25 de janeiro.

— Tudo isso contradiz o governador de São Paulo, João Dória, que se equivocou, talvez por desconhecimento do marco regulatório sanitário brasileiro — disse Franco. — Como estabelecer um calendário se a vacina estará liberada para uso com a certeza de sua segurança e eficácia? — acrescentou.

O Ministério da Saúde não informou quando o vídeo foi gravado. Nele, Franco classifica como um "devaneio" o plano de Dória, apresentado na segunda-feira.

— O que foi aprovado na TV no dia de hoje é apenas um devaneio do governador de São Paulo, que está sonhando acordado. Não será com discursos de ódio ou tendenciosos que serão encontradas soluções. O Brasil não será dividido — disse o secretário, acusando o governador paulista de “brincar com a esperança” dos brasileiros.

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— Senhor João Dória, não brinque com a esperança de milhares de brasileiros, não venda sonhos que não possa cumprir, prometendo uma imunização com um produto que sequer possui registro nem autorização para uso emergencial. Lembro que o governo federal garantirá o direito à vacina, de um produto seguro, regularizado e eficaz — afirmou.

Elcio Franco ainda afirmou que a autorização para uso emergencial de vacinas por agências dos Estados Unidos, da União Europeia, da China e do Japão não garante a autorização automática da Anvisa. Uma lei de fevereiro obrigou a Anvisa a avaliar em até 72 horas, ou três dias corridos, "quaisquer materiais, medicamentos, equipamentos e insumos da área da saúde sujeitos à vigilância sanitária" que tenham sido aprovados pelas quatro agências estrangeiras. Segundo Franco, essa prerrogativa pode ser aplicada apenas nos casos de registro definitivo.

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— A autorização emergencial concedida em uma das quatro agências de referência internacional, prevista na lei 13.979, de fevereiro de 2020, não é um registro definitivo e não cumpre os requisitos para autorização excepcional pela Anvisa. Assim, os respectivos fabricantes devem também solicitar à agência autorização temporária para uso emergencial — disse ele, afirmando que ainda não há pedido de registros por parte dos laboratórios junto à Anvisa.

Franco afirmou ainda que o Ministério da Saúde já possui logística para a distribuição, citando como exemplo a vacina contra a gripe, que imunizou 80 milhões de brasileiros neste ano:

— Os brasileiros que podem ser vacinados terão o direito garantido, de forma segura, eficaz e gratuita. Isso, no momento em que a Anvisa aprovar, seguindo os princípios dos SUS, e os conhecimentos científicos. Destaco que não há segurança para vacinar grupos que não participaram dos testes clínicos, como por exemplo grávidas e crianças.

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O prazo de 48 horas só passa a contar a partir da intimação judicial à pasta — no domingo, dia sem expediente, isto não ocorreu. Procurado pela reportagem do GLOBO, o Ministério da Saúde disse que "aguarda ser notificado para responder em tempo solicitado".

No sábado, Lewandowski pediu a retirada de pauta de duas ações que pediam para o governo federal apresentar o plano de vacinação depois que o plano foi enviado ao tribunal. O julgamento estava marcado para começar na quinta-feira. A pedido do relator, o presidente do STF, ministro Luiz Fux, adiou o julgamento .

Os processos começaram a ser julgados em novembro no plenário virtual, um sistema em que os ministros postam seus votos sem a necessidade do encontro entre eles. Fux interrompeu o julgamento para que o caso fosse examinado no plenário físico - que, durante a pandemia, se reúne por videoconferência. Agora, o julgamento deve ocorrer só em 2021, já que o STF realiza na próxima sexta-feira a última sessão deste ano antes do recesso.

Plano é alvo de contestação

Lewandowski já tinha votado no sentido de determinar ao governo a apresentação em até 30 dias de um plano detalhado para assegurar o fornecimento de vacinas contra a Covid-19. Dias depois, o governo federal apresentou um plano preliminar para imunizar 109,5 milhões de pessoas.

Em seguida, foi publicado o “Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19”, assinado pelo Ministério da Saúde, com a previsão de imunizar 51,4 milhões de pessoas no primeiro semestre de 2021. O texto, porém, não apresenta uma data para o início dos trabalhos.

Mais de 30 pesquisadores que constavam na elaboração deste plano divulgaram nota pública, no sábado, afirmando que não tiveram acesso à versão final do documento antes de sua divulgação.