Economia Brasília

Ford 'ganhou bastante dinheiro' no Brasil e poderia ter 'retardado' saída, diz Mourão

Maia aponta 'falta de credibilidade do governo'. Ministério da Economia lamenta decisão da montadora de suspender produção no Brasil e cobra avanço das reformas para melhorar ambiente de negócios
O vice-presidente Hamilton Mourão, em entrevista à imprensa Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo
O vice-presidente Hamilton Mourão, em entrevista à imprensa Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo

BRASÍLIA — O vice-presidente Hamilton Mourão afirmou nesta segunda-feira ter ficado surpreso com a decisão da Ford de encerrar a fabricação de automóveis no Brasil. Para ele, a montadora lucrou muito no Brasil e poderia ter adiado a saída do país.

— Não é uma notícia boa. Eu acho que a Ford ganhou bastante dinheiro aqui no Brasil e me surpreende essa decisão que foi tomada aí pela empresa.  Empresa que está no Brasil há quase 100 anos, desde 1921. Eu acho que ela poderia ter retardado isso daí mais é aguardado. Até porque o nosso mercado consumidor é muito maior do que outros aí — disse Mourão, que voltou ao trabalho nesta segunda-feira depois do afastamento de duas semanas com Covid-19.

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A produção da Ford será interrompida imediatamente em Camaçari (BA), Taubaté (SP) e, até o fim do ano, na da Troller, em Horizonte (CE). A marca vai continuar vendendo carros no Brasil, mas apenas modelos importados de países como Argentina e Uruguai.

Maia aponta 'falta de credibilidade' e Wajngarten rebate

O anúncio da Ford levou o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a afirmar, em um post no Twitter, que a saída da Ford do  Brasil "é uma demonstração da falta de credibilidade do governo brasileiro, de regras claras, de segurança jurídica e de um sistema tributário racional".

Maia, que tem sido um dos principais articuladores da reforma tributária no Congresso, disse que o sistema de pagamento de impostos no Brasil "se tornou um manicômio nos últimos anos, que tem impacto direto na produtividade das empresas".

O deputado disse ainda esperar que a decisão da Ford sirva de alerta para o governo e para o Congresso sobre a necessidade de "avançar na modernização do Estado e na garantia da segurança jurídica para o capital privado no Brasil".

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O secretário especial de Comunicação Social do governo, Fábio Wajngarten, respondeu à mensagem de Maia no Twitter. Afirmou que a saída da Ford do Brasil "não tem nada a ver" com a situação política e econômica do país.

"A verdade dos fatos: a Ford mundial fechou fábricas no mundo porque vai focar sua produção em SUVs e picapes, mais rentáveis. Não tem nada a ver com a situação política, econômica e jurídica do Brasil. Quem falar o contrário, mente e quer holofotes", disse Wajngarten.

Pasta de Guedes pede reformas

Entre os motivos para a decisão da Ford, o presidente da Ford na América do Sul, Lyle Watters, citou um "ambiente econômico desfavorável" agravado pela pandemia.

A montadora vai manter sua sede para a América do Sul no Brasil, mas passará a atender seus clientes na região com um portfólio de automóveis provenientes da Argentina, do Uruguai e de outros mercados.

Em nota, o Ministério da Economia afirmou que "lamenta a decisão global e estratégica da Ford de encerrar a produção no Brasil".

A pasta, liderada por Paulo Guedes, afirmou que "a decisão da montadora destoa da forte recuperação observada na maioria dos setores da indústria no país, muitos já registrando resultados superiores ao período pré-crise".

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Disse ainda que trabalha para a redução do chamado Custo Brasil, mas admitiu que "isto reforça a necessidade de rápida implementação das medidas de melhoria do ambiente de negócios e de avançar nas reformas estruturais".

Criticado por ICMS, Doria lamenta

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também se manifestou nas redes sociais. "Lamento decisão da Ford d eencerrar sua produção de automóveis no  Brasil", afirmou, observando que "foi decisão global da Ford Motors" o fechamento das fábricas em São Paulo, Bahia e Ceará. Ele afirmou que serão mantidos 700 empregos na capital paulista e em Tatuí, no interior do estado.

Na semana passada, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) mostrou preocupação com o enfrentamento da crise causada pela pandemia, a fragilidade do mercado de trabalho e o aumento da carga tributária, além de questões logísticas e de oferta.

Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, criticou fortemente o impacto do aumento do ICMS em São Paulo para o setor: o ICMS subirá, a partir de 15 de janeiro, de 12% para 13,3% para carros novos e de 1,8% para 5,53%, no caso de automóveis usados adquiridos em lojas ou concessionárias.

A Anfavea afirmou que não vai se pronunciar sobre a decisão da Ford.  Porém a entidade tem alertado, desde abril de 2019, sobre o custo Brasil.

Governador da Bahia busca outra montadora na Ásia

O governador da Bahia, Rui Costa (PT), também lamentou a decisão da Ford, mas afirmou que criou um grupo de trabalho para atrair uma nova montadora para o estado. Ele atribuiu a decisão da montadora a uma onda de fechamento de empresas no país em meio à crise gerada pela pandemia e criticou o governo federal.

Costa afirmou que já está em contato com embaixadas de outros países, particularmente da Ásia, para convidar montadoras para ocupar o espaço deixado pela Ford. Ele estimou que o fechamento da fábrica da Ford em Camaçari deixará seis mil pessoas sem emprego na Bahia

“A saída da Ford do Brasil significa milhares de desempregados, sendo cerca de 6 mil demissões somente na Bahia. Significa aumento da pobreza em nossa nação. Infelizmente, são centenas de indústrias que vão fechando, semana após semana, já que temos um país que não cuida da sua economia, não garante segurança institucional a seus investidores e não faz as reformas necessárias – inclusive a tributária de que tanto precisamos. Ficamos indignados e tristes, pela falta de gestão, de competência e de trabalho, em nosso país. Infelizmente, enquanto uns, dia após dia, só fazem politicagem, nosso país vai perdendo centenas de investidores e postos de trabalho”, afirmou o governador, em nota do governo da Bahia.

O secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa, afirmou que a pandemia de Covid-19 impediu que ações do governo “surtissem efeito a tempo”.

“Lamento o encerramento das atividades fabris da Ford. Quando assumimos, a indústria vinha em frangalhos, apesar de bilhões gastos por governos anteriores. Temos reduzido o custo Brasil que herdamos, 22% do PIB. Mas a pandemia impediu que nossas ações surtissem efeito a tempo”, disse o secretáiro numa rede social.