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D de desespero

Pazuello coage médicos no Amazonas a prescrever remédios inúteis para a Covid

Ofício enviado às unidades de saúde do Amazonas, impondo uso de remédios desaconselhados por infectologistas no combate ao vírus da Covid

Sem oxigênio, com recorde de mortos e o sistema de saúde em colapso, o Amazonas sofre coação explícita do governo Bolsonaro para adotar tratamento precoce contra a Covid-19. Especialistas estão chocados com o ofício do Ministério da Saúde datado de 7 de janeiro (que ilustra este post). O texto ordena médicos a prescrever remédios que sabidamente não funcionam "como forma de diminuir internamentos e óbitos". São “saquinhos de ilusão”, segundo infectologistas.

O ofício federal mente ao dizer que existe “comprovação científica” de resultado positivo de “medicações antivirais orientadas pelo Ministério da Saúde”. Um médico que não quis se identificar me disse que o Brasil “está cheio de entubados com as barriguinhas cheias desses remédios inúteis”. O governo brasileiro fracassou do início ao fim no combate à pandemia, eximindo-se da coordenação nacional e desestimulando uso de máscaras e distanciamento. Agora, diz ser “inadmissível” que médicos não adotem o tratamento precoce com vermífugos e afins. 

Não há menção, na carta, ao uso da cloroquina – já desmoralizada, apesar da forte propaganda de Jair Bolsonaro. O Brasil estava com um estoque, em julho, de mais de 4 milhões de comprimidos de cloroquina. Encalhados. Parados. Comprados por nós e doados pelos Estados Unidos de Trump. Começaram a ser distribuídos aos estados. A cloroquina só está no "protocolo do Ministério da Saúde" para combater a Covid. Por que será?

O ministro Pazuello, em visita a Manaus ontem (11 de janeiro), prometeu enviar equipamentos e insumos e abrir leitos de UTI no Amazonas. E aproveitou para defender publicamente remédios que não são endossados pelos infectologistas e pela Fiocruz. “Senhores, senhoras, não existe outra saída: nós não estamos mais discutindo se esse profissional ou aquele concorda. Os conselhos federais e regionais já se posicionaram, os conselhos são a favor do tratamento precoce, do diagnóstico clínico”, disse Pazuello. 

Os conselhos são sabidamente comandados, em sua maioria, por bolsonaristas e por militares, que não ousam contestar a linha oficial. Está claro em três colunas publicadas aqui. Sociedade de Medicina do Rio acusa governantes: “homicidas”. A política de quartel na Saúde. A Anvisa e o porquê de nossa ansiedade, nossa angústia.

Perguntei à Dra Margareth Dalcolmo, autoridade e referência no tratamento à Covid, o que ela acha desse ofício do Ministério às unidades do Amazonas: “Qualquer profissional da Saúde – e em particular os médicos – não pode ser coagido a usar medicamentos ou adotar qualquer procedimento nos quais não acreditem, exatamente por respeitar as melhores informações científicas. Se já existe hoje um excesso de uso dito 'off label' (fora da prescrição em bula), como sabemos, desses fármacos, isso não justifica a coação”. A Dra Margareth cansou de alertar para um janeiro trágico diante das aglomerações de fim de ano pelo país afora. Um comportamento irresponsável e criminoso de parcela da população, estimulado pelo próprio presidente da República. 

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