Por Patrícia Marques, TV Globo


Carregamento da vacina Sputnik chega à Argentina. — Foto: REUTERS/Agustin Marcarian

O ex-diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Fernando Mendes foi contratado pela farmacêutica União Química, que pretende fabricar no Brasil a vacina russa Sputnik V contra o coronavírus. O Ministério da Saúde já anunciou intenção de compra de 10 milhões de doses.

Mendes assumiu o cargo de diretor de Relações Institucionais da farmacêutica depois de cumprir quarentena de 6 meses após o fim do seu trabalho na Anvisa - período previsto pela legislação brasileira para que diretores de agências possam atuar na iniciativa privada.

Ele exerceu o cargo de diretor da Anvisa por cinco anos, entre 15 de outubro de 2015 e 31 de março de 2020. A reportagem apurou, porém, que Mendes continua, mesmo após o fim do mandato, frequentando a Anvisa, tendo "trânsito livre" com integrantes da atual direção da agência.

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O executivo foi diretor-presidente, diretor de Coordenação e Articulação e diretor de Gestão da Anvisa.

Quando deixou a Anvisa, disse que iria sentir saudades, mas que desejava sucesso à agência na continuidade dos trabalhos.

"A vida é assim. Não há por que se iludir. Sentirei saudades, mas o momento não me é doloroso, porque considero ser natural, importante e inexorável a saída de cena, especialmente para quem sai, porque se reforça o entendimento de que a vida segue, independentemente da presença ou da vontade de quem quer que seja. Mantenham-se firmes no propósito de aumentar o acesso da população brasileira a serviços e produtos eficazes, seguros e de qualidade”, afirmou ao deixar o cargo.

A TV Globo pediu um posicionamento à União Química sobre o novo cargo de Mendes na iniciativa privada e a suposta influência dele no processo de aprovação da vacina russa no Brasil, mas, a empresa disse que "não comenta a seleção da área de RH dos seus quase seus 7 mil colaboradores”. Mendes também disse que não poderia falar sobre o assunto.

A Anvisa informou por meio de nota que "o ex-diretor Fernando Mendes, durante o período de quarentena, esteve na Agência resolvendo assuntos da área de recursos humanos, como devolução de documentos decorrente de seu desligamento".

"Após o período de quarentena, o ex-diretor cumpriu agenda institucional, sem realizar nenhuma reunião sobre processo de vacina. Quanto ao contrato do ex-diretor com uma empresa privada a Anvisa não irá comentar, por tratar-se de assunto pessoal", disse a agência.

Vacina Sputnik V no Brasil

No final de de novembro de 2020, a farmacêutica brasileira União Química anunciou acordo com o Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF) para produzir a vacina Sputnik V no Brasil. A União Química já está produzindo o IFA - ingrediente farmacêutico ativo - em Brasília. A empresa também pediu a realização de estudos clínicos da fase três no Brasil, instrumento necessário para que a vacina seja aprovada pela Anvisa, e aguarda maiores trâmites com a agência e com o governo federal para dar andamento ao processo.

A Prefeitura de Guarulhos, na Grande São Paulo, também se manifestou sobre a compra da vacina Sputnik V. Segundo a prefeitura, a fabricação da matéria-prima para produção do imunizante será feita em Brasília, depois o material seguirá para ser envasado e distribuído na fábrica da União Química, em Guarulhos.

Em janeiro deste ano, a revista científica "The Lancet" publicou que os estudos mostraram uma taxa de eficácia de 91,6% para a vacina Sputnik V.

Após negociações com empresas interessadas em vender vacinas no Brasil, a Anvisa anunciou que os testes de vacinas contra a Covid-19 em voluntários brasileiros deixaram de ser item obrigatório para empresas que desejam solicitar à agência a autorização para uso emergencial do imunizante.

Um dia depois, o Senado Federal aprovou, com mudanças, uma medida provisória enviada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), ainda em 2020 ao Congresso e que estabelece prazo de de até cinco dias para que a agência autorize o uso emergencial de vacinas contra a Covid-19 que já tenham aval de, pelo menos, 9 agências internacionais.

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Como houve alterações na medida provisória, ela foi convertida em projeto de lei e, agora, segue novamente para que Bolsonaro possa sancionar ou vetar o texto.

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), vem conversando com representantes do laboratório - um deles, o ex-deputado federal pelo PSD e ex-governador do DF Rogério Rosso, é apontado como o principal lobista da União Química na tentativa de conseguir a liberação da vacina.

Rosso é formalmente diretor de Negócios Internacionais da farmacêutica.

O presidente da União Química, Fernando de Castro Marques, defendeu o trabalho de Rosso.

"Não se trata de um lobista, é um executivo que por acaso entrou na política e agora voltou de forma efetiva a trabalhar como executiva na iniciativa privada. Precisava deixar bastante clara. A empresa, não trabalha não tem lobista, nós temos profissionais e todos envolvidos no projeto chamado Sputnik V, para atender essa tragédia que esta assolando o mundo inteiro”, declarou Castro Marques.

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