Saúde Vacina

Após anunciar cronograma de entrega de vacinas, governo diz que não pode cumpri-lo por atraso do Butantan

Instituto rebate dizendo que 'desgaste diplomático causado pelo governo brasileiro em relação à China' gerou atraso na entrega de matéria-prima
Caixa da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan (21/01/2021) Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Caixa da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan (21/01/2021) Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

BRASÍLIA — O Ministério da Saúde anunciou nesta quinta-feira que não cumprirá o cronograma divulgado pela própria pasta na quarta. Segundo o ministério, o Instituto Butantan fornecerá apenas 2,7 milhões de doses em fevereiro, o que corresponde a 30% das 9,3 milhões de doses anunciadas inicialmente pelo governo federal. Em resposta, o Butantan afirmou que o órgão “ignora fatos”, disse que entregará 3,6 milhões de doses neste mês e citou “desgaste diplomático causado pelo governo brasileiro em relação à China” como causa de atraso da matéria-prima para produção de vacina.

Segundo nota do Ministério da Saúde, o órgão foi informado sobre a mudança no ritmo de entregas na tarde desta quinta, por meio de um ofício. O comunicado afirma que a “redução no número de vacinas quebra a expectativa do Ministério da Saúde de cumprir o cronograma divulgado ontem (17/2) pelo ministro Eduardo Pazuello”.

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Na quarta-feira, após reunião com governadores, a pasta prometeu o fornecimento de cerca de 220 milhões de novas doses de vacina contra Covid-19 até julho. A expectativa era de que já em fevereiro fossem fornecidas 11,3 milhões de doses, das quais 9,3 seriam CoronaVac e 2 milhões da vacina de Oxford.

"A dificuldade em manter o cronograma inicial, neste momento, está em o Butantan conseguir cumprir as entregas das doses previstas em contrato. Diante da situação, o Ministério da Saúde precisará rever a distribuição das doses das vacinas relativas ao mês de fevereiro, divulgada aos secretários de saúde dos estados e Distrito Federal", diz o texto.

Em resposta ao comunicado divulgado pelo Ministério da Saúde, o Instituto Butantan disse que, em todo o mês de fevereiro, vai entregar 3,6 milhões de doses da CoronaVac. Desse total, 1,1 milhão de vacinas foram entregues no último dia 5 e outras 2,5 milhões serão disponibilizadas entre os dias 23 e 28. Há outras 852 mil doses que devem ficar prontas na primeira semana de março. O número é menor que o previsto no acordo com o Ministério da Saúde.

O governo paulista alega que a diferença ocorre por causa do atraso na liberação de insumos que vêm da China. A matéria-prima da CoronaVac deveria chegar na primeira quinzena de janeiro, mas só desembarcou no Brasil nos dias 3 e 10 de fevereiro. Segundo nota do Butantan, o governo federal foi responsável pelo atraso ao provocar um “desgaste diplomático” com os chineses.

Em janeiro, o Ministério da Saúde assinou um contrato para comprar 46 milhões de doses da CoronaVac. O Butantan afirma que, em janeiro, cumpriu o acordo e entregou ao Ministério da Saúde, as 8,7 milhões de doses previstas.

Pasta ameaça rever grupos prioritários

Em vídeo, o secretário executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, cobrou o cumprimento do cronograma por parte do Butantan. De acordo com ele, diante do atraso, a pasta vai ter que rever os grupos prioritários e suspender a planilha com previsão de distribuição que havia sido repassada aos secretários estaduais de saúde.

— Fica muito difícil planejar sem nós termos a confirmação do que vamos receber, tudo previsto em contrato. Por isso, continuamos buscando, para mitigar situações como esta, contratos com outras empresas — disse Franco, acrescentando:

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—Temos conversado com mais seis fornecedores e, mesmo assim, manifestamos o interesse de aquisição de mais 30 milhões de doses no último trimestre de 2021 com o Instituto Butantan, de forma a disponibilizar vacinas para a população brasileira. Esperamos que os cronogramas sejam cumpridos para que possamos efetivar o nosso planejamento e a população brasileira seja atendida com a máxima presteza.

Os seis outros fornecedores com negociações em andamento, de acordo com o Ministério da Saúde, são a União Química, produtora da Sputink V; a Precisa, que produz a Covaxin; a Moderna; a Janssen; a Pfizer; e doses obtidas por meio do consórcio Covax Facility.

Segundo a pasta, o cronograma previa a inclusão de novos grupos prioritários na vacinação, como "povos e comunidades tradicionais ribeirinhas, quilombolas, pessoas de 80 a 89 anos e pessoas de 60 a 79 anos."

A pasta afirma que agora, no entanto, diante da informação prestada pelo Butantan, o governo "segue com as tratativas junto aos outros seis fornecedores visando ampliar a quantidade de vacinas disponíveis a população".

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'Falta de planejamento'

Em resposta ao comunicado divulgado pelo Ministério da Saúde, o Instituto Butantan atribuiu o atraso à ineficiência do governo em garantir a importação de Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA)necessário para a produção da vacina. O Instituto afirma que o envio da matéria-prima só ocorreu após "intervenções feitas pelo governo de São Paulo".

"O Ministério da Saúde omite e ignora fatos em seu comunicado oficial. Deixa de informar que, como é de conhecimento público, o desgaste diplomático causado pelo governo brasileiro em relação à China provocou atrasos no envio da matéria-prima necessária para a produção da vacina. Além disso, não houve qualquer empenho da União na liberação dos insumos junto ao Governo Chinês", diz o texto do Butantan.

O Butantan critica ainda o que chama de "falta de planejamento" da pasta. A previsão do Instituto é fazer oito entregas de 426 mil doses a partir do dia 23 de fevereiro, totalizando 3,4 milhões de doses de CoronaVac.

"É inacreditável que o Ministério da Saúde queira atribuir ao Butantan a responsabilidade pela sua completa falta de planejamento, que acarretou a falta de vacinas para a população em diversos municípios do país. O Butantan já entregou 9,8 milhões de doses da vacina contra o novo coronavírus ao Ministério da Saúde, o que corresponde a 90% de todas as vacinas usadas na rede pública do país."