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Mortes por Covid-19 no Brasil aumentam até sete vezes no início do ano

Houve uma alta de 71% dos óbitos no país comparando o total ocorrido entre novembro e dezembro de 2020 com todos os registrados entre janeiro e fevereiro deste ano
Cemitério Nossa Senhora Aparecida em Manaus, Amazonas, estado que registrou maior crescimento de mortes em 2021. Foto: MICHAEL DANTAS / AFP
Cemitério Nossa Senhora Aparecida em Manaus, Amazonas, estado que registrou maior crescimento de mortes em 2021. Foto: MICHAEL DANTAS / AFP

RIO e SÃO PAULO — Um levantamento feito pelo GLOBO a partir de dados do consórcio de veículos de imprensa formado pelo jornal e pelo Extra, G1, Folha de S.Paulo, UOL e O Estado de S. Paulo mostra como a pandemia de Covid-19 acelerou nos últimos quatro meses. Comparando o total de mortes ocorridas entre novembro e dezembro de 2020 com todos os óbitos registrados entre janeiro e fevereiro deste ano, houve um aumento de 71% no Brasil. No Amazonas houve a maior alta: 662%.

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Já os diagnósticos positivos da doença aumentaram 34%, comparando os mesmos períodos. Um crescimento que assusta pela rapidez e é ressaltado por dados diários: ontem, o Brasil bateu um novo recorde de média móvel de mortes (1.223) . É o terceiro dia consecutivo e o quarto em uma semana que o cálculo ultrapassou seu maior patamar desde o início da pandemia. Já são 255.836 óbitos e 10.589.608 de infectados no país.

Os estados não seguem o mesmo ritmo na variação de mortes e casos. Os que apresentaram maior percentual de aumento de óbitos no primeiro bimestre do ano foram, além do Amazonas, Roraima (229%), Pará (225%), Rondônia (187%), Minas Gerais (129%), Tocantins (112%), Alagoas (104%) e Ceará (102%).

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Segundo epidemiologistas, a explosão na mortalidade pela doença no país tem relação com diversos fatores, e o espalhamento da nova variante do vírus que emergiu em Manaus, usada como justificativa pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para explicar os números, é um fator minoritário.

— Uma outra coisa que aconteceu foram as festas de Natal e Réveillon, que resultaram em situações de aglomeração. Estamos pagando por isso agora, e vamos pagar pelo carnaval também, por um bom tempo — diz o epidemiologista Paulo Lotufo, professor da Faculdade de Medicina da USP.

Cientistas não contestam que a variante de Manaus seja uma preocupação importante, mas ela ainda não seria um fator dominante para explicar o rápido crescimento. Para Márcio Bittencourt, especialista do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da USP, o número de problemas que contribuem para o agravamento da pandemia é grande.

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— A gente não está fazendo testagem ampliada, a gente não está fazendo busca ativa de casos, não está fazendo busca ativa de contatos, não testa os assintomáticos, não faz isolamento de casos, não fazemos quarentenas de familiares e seus contatos. Fazemos mau uso das máscaras e de medidas de bloqueio, não fazemos as medidas de controle de fluxo de estabelecimentos, não temos medidas de controle de fronteira nem controle de transporte... — enumera.

Lockdown não é solução mágica

Santa Catarina (-2%), Distrito Federal (1%), Espírito Santo (8%) e Rio Grande do Sul (13%) apresentaram queda ou menor aumento nos óbitos na comparação entre os períodos analisados. Os estados do sul, por exemplo, tiveram um pico de mortes no último bimestre de 2020 e, por isso, um crescimento relativo menor no início deste ano. Mesmo assim, permanecendo num patamar alto, a região está num momento grave da pandemia.

A rede de atendimento à saúde em vários municípios gaúchos está perto do esgotamento de leitos hospitalares.

— Este é o pior dia da pandemia, estamos atrás de pessoas para ajudar na UTI — disse, ontem, Lucia Campos Pellanda, reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

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A comparação entre os bimestres também mostra que o número de casos confirmados, não apenas as mortes, estão subindo bruscamente. Os diagnósticos positivos mais que dobraram no Amazonas (193%) e em Rondônia (122%). O aumento de casos foi significativo no Mato Grosso (91%), em Alagoas (90%) e Minas Gerais (81%).

Além de apontar a falta de medidas de vigilância epidemiológica necessária para frear a pandemia, os pesquisadores ouvidos pela reportagem criticam a proposta do lockdown como uma solução mágica para conter a epidemia.

— É difícil entender o que querem quando falam ‘lockdown’, porque nós nunca fizemos um lockdown de verdade no país, com exceção daquele que está sendo feito agora em Araraquara (SP) — diz Lotufo.

Para Bittencourt, o poder público deveria pensar, antes, em medidas básicas:

— Se a gente vai fechar a cidade inteira ou não é um detalhe. A gente vai fazer a medida que custa mais caro e continuar não fazendo o resto. O lockdown pode ajudar, mas não conserta tudo — diz o médico.