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Em reunião com empresários, Salles insiste em que Brasil deve receber fundos para evitar desmatamento

Encontro, do qual também participou a ministra Teresa Cristina, é indicativo do posicionamento do país na Cúpula do Clima, dizem participantes
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo (09/02/2021)
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo (09/02/2021)

SÃO PAULO — A reunião dos ministros Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Tereza Cristina, da Agricultura, com empresários nesta quarta, véspera da abertura da Cúpula de Líderes sobre o Clima, serviu mais como "prestação de contas" do que um debate, segundo presentes ao evento. Participantes que pediram sigilo ao GLOBO afirmaram que o encontro virtual foi um indicativo de qual será o posicionamento do governo brasileiro no evento convocado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Salles não teria dado mostras de grandes alterações de posicionamento defendido até agora, e que gera críticas de ambientalistas e da comunidade internacional.

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Um executivo do setor de varejo indicou que Salles voltou a dizer que vai defender que o Brasil receba US$ 1 bilhão em ajuda internacional como pagamento por créditos de carbono relativos à redução do desmatamento no período entre 2006 e 2017, anterior ao governo Bolsonaro, e vai insistir no discurso de que o país tem a receber US$ 133 bilhões — uma conta baseada no mercado livre de créditos de carbono da Califórnia, mercado que ainda não foi regulamentado no âmbito do Acordo de Paris sobre o Clima.

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Apesar dos problemas enfrentados pelo governo Bolsonaro na área ambiental, um empresário do setor de transportes ouvido pelo GLOBO disse que a eloquência e a assertividade do ministro teriam superado as expectativas iniciais. Salles reafirmou as metas assumidas pelo Brasil ainda em 2015, por ocasião do Acordo de Paris: desmatamento ilegal zero e redução de 43% na emissão de gases do efeito estufa até 2030, na comparação com a base de 2005. Segundo um empresário, o Brasil poderá antecipar algumas medidas ou parte das metas previstas para 2030, mas Salles não indicou quais seriam estes pontos.

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Salles reconheceu que muitos empresários têm preocupações com a imagem do Brasil por questões ambientais, mas reforçou a tese de que o Brasil tem feito mais pelo tema que muitas nações que atacam o governo federal.

Um empresário que pediu para que seu nome ficasse no anonimato disse que "foi uma explanação de como o Brasil vai se posicionar, não teve troca de ideias. O ministro do Meio Ambiente mostrou com argumentos para defender sua posição, de que o Brasil faz mais que outros países, que não devemos ser vilões, e que é hora de outros países contribuírem", afirmou. Além de evitar se expor, a busca pelo sigilo foi reforçada depois que Salles, no encontro, pediu diretamente que os empresários "não falassem da reunião com a imprensa".

No total, 27 executivos participaram do encontro, que contou também com a presença do embaixador Leonardo Athayde, diretor do departamento de Meio Ambiente do Itamaraty — o chanceler Carlos França e o presidente Bolsonaro não compareceram. A plateia foi angariada pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, próximo a Bolsonaro, que falou durante o encontro. Na visão de um dos participantes, Salles buscou tranquilizar o empresariado e disse que o Brasil buscará reafirmar seu compromisso de acabar com o desmatamento ilegal. Em nota, a Fiesp, que na terça-feira já havia organizado um encontro de 50 empresários com o presidente e 10 ministros de seu governo, classificou o encontro como bem sucedido:

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"A reunião transcorreu em um clima amistoso e a expectativa dos empresários é positiva em relação ao pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro, amanhã (22/4) na Cúpula de Líderes sobre o Clima, convocada pelo presidente dos EUA, Joe Biden", informou a Fiesp, que destacou que o ministro frisou a necessidade de regulamentar o mercado de créditos de carbono, no qual o Brasil tem grande interesse. "Os empresários concordaram que esta regulamentação é fundamental e destacaram também que é importante haver ações de curto prazo que mostrem o comprometimento do Brasil com o combate ao desmatamento ilegal."

Além da falta de debate em um encontro promovido menos de 24 horas antes do início da cúpula virtual, empresários envolvidos na temática ambiental falaram ao GLOBO, também sob anonimato, que o encontro promovido nesta quarta-feira carece de representatividade. Embora entre os 27 presentes houvesse empresários de fato preocupados com a questão ambiental, não foram convocadas entidades que estão formulando propostas para o clima.

Um líder da área ambiental afirmou que "alguns dos executivos que participaram do encontro podem até ter considerações ambientais, mas ali não estavam as pessoas que encabeçam o diálogo ambiental no meio ambiental. Parecia mais uma reunião de amigos que um diálogo aberto com toda a sociedade produtiva brasileira", afirmou.

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De acordo com a Fiesp, estiveram presentes no Paulo Skaf (Fiesp), Alexandre Negrão (Aeris), André Bier Gerdau Johannpeter (Gerdau), Carlos Alberto de Oliveira Andrade (Caoa), Dan Ioschpe (Ioschpe-Maxion), Edgard Corona (Bio Ritmo/Smart Fit), Eugênio De Zagottis (Raia Drogasil), Fernando Cestari de Rizzo (Tupy), Fernando Galletti de Queiroz (Minerva Foods), Flávio Rocha (Riachuelo), Francisco Gomes Neto (Embraer), Frank Geyer Abubakir (Unipar Carbocloro), Jerome Cadier (Latam), João Guilherme Sabino Ometto (São Martinho), Juliana Azevedo (Procter & Gamble), Lorival Nogueira Luz Junior (BRF), Marcelo Melchior (Nestlé), Marcos Lutz (ex-Cosan), Paulo Sousa (Cargill), Ricardo Perez Botelho (Energisa), Roberto Fulcherberguer (Via Varejo), Roberto Lopes Simões (Braskem), Rubens Menin (MRV), Rubens Ometto (Cosan), Salo Davi Seibel (Duratex), Victório de Marchi (Ambev) e Wesley M. Batista Filho (JBS).