Campanha Rio Abraça a Vacina, que foi feita a jato pela agência Propeg, contratada pelo Estado do Rio

Rio Abraça a Vacina: campanha de R$ 13 milhões do Estado do RJ foi contratada a jato

Uma campanha publicitária de R$ 13 milhões, que vem sendo veiculada nos últimos dias pelo governo do Estado do Rio com o slogan “Rio Abraça a Vacina“, sofreu questionamentos dentro do próprio Poder Executivo.

Pareceres jurídicos internos da Secretaria da Casa Civil lançaram dúvidas a respeito do processo de contratação da agência Propeg para o serviço. Isso porque a Superintendência de Publicidade da pasta deu um prazo de apenas dois dias úteis para que as empresas interessadas apresentassem suas propostas.

A Propeg acabou sendo a única agência que concordou em realizar o serviço, dizendo na resposta à convocação feita pela Casa Civil que “já estava trabalhando em uma campanha sobre este tema para apresentar ao governo” mesmo antes de o estado demonstrar oficialmente interesse.

O retorno dado pela empresa despertou as questões sobre a impessoalidade do processo de contratação. As outras quatro agências habilitadas – Artplan, Agência 3, Binder e Nacional – foram unânimes em declinar a realização do trabalho por causa do pouco tempo dado para a realização do projeto.

Por e-mail (íntegra de perguntas e respostas no fim do texto), a assessoria de imprensa da Casa Civil defendeu a legalidade da contratação da Propeg para a campanha “Rio Abraça a Vacina” e afirmou que “dada a urgência do assunto e os prazos praticados no dia a dia de uma agência de publicidade, o tempo solicitado para o retorno não foge à prática de mercado”.

Fundo de Saúde

Os R$ 13 milhões voltados para a publicidade foram retirados do Fundo Estadual de Saúde. Há previsão de que possam ser gastos mais R$ 17 milhões em eventuais etapas posteriores de campanha. Os recursos para a Propeg foram empenhados – reservados para pagamento – no fim de fevereiro.

Atualmente, há cinco agências habilitadas para realizar a propaganda do Estado do Rio. Pelas regras em vigor, sempre que há um projeto de publicidade de mais de R$ 6 milhões, é preciso fazer uma consulta pública para escolher, entre as cinco, qual a empresa que realizará o trabalho.

As agências de publicidade são as mesmas desde 2015, e o contrato se encerra no fim deste mês. Os procedimentos de uma nova licitação estão em andamento, com previsão para realização do certame em meados de abril.

“Inviável”

Toda a seleção da vencedora foi realizada entre os dias 21 e 26 de janeiro. Apesar disso, o processo só foi inserido no Sistema Eletrônico de Informações (SEI), que permite a consulta pública dos documentos, no dia 27 daquele mês.

Não foram anexadas cópias dos e-mails que mostram dia e horário precisos em que a Casa Civil fez a convocação das agências, mas a assessoria de imprensa da pasta informou que todos foram enviados no dia 21 de janeiro.

A Propeg foi justamente a primeira a responder, às 18h05m do próprio dia 21. Entre 9h34m e 11h33m do dia 22, as outras quatro agências declinaram. A Binder disse, por exemplo: “Gostaríamos muito de atender sua solicitação mas o job é bastante extenso e, com o prazo estabelecido, se torna inviável atender satisfatoriamente”.

A Nacional afirmou: “Agradecemos o envio do convite e gostaríamos muito de poder participar, uma vez que trata-se de um assunto tão importante para o Rio e toda a sua população, porém infelizmente a Nacional não conseguiria entregar um trabalho de qualidade no prazo estipulado”.

“Conhecimento anterior”

No dia 10 de fevereiro, ao analisar a contratação, a assessora jurídica da Casa Civil Julia Romero Magalhães Soares fez o primeiro alerta sobre a possibilidade de a Propeg ter tido “conhecimento anterior” da realização da campanha, o que poderia ter prejudicado o procedimento de seleção.

“Compete a esta Assessoria Jurídica orientar o gestor para que se certifique se a Propeg foi, de alguma forma, beneficiada por ter, eventualmente, conhecimento anterior às demais empresas da campanha que seria contratada pela Administração Estadual, com eventual reabertura de prazo compatível para formulação e apresentação de propostas de campanhas publicitárias por outras agências.

Aqui, releva destacar que todo e qualquer procedimento e/ou contratação realizados pelo Poder Público deve observar os princípios consagrados no art. 37 da Constituição Federal, em especial a moralidade administrativa e os corolários da publicidade e transparência dos atos administrativos”, destacou a assessora.

“Princípio da impessoalidade”

O procurador do Estado Gabriel Pacheco Ávila, assessor-chefe da assessoria jurídica da Casa Civil, também demonstrou preocupação em relação aos mesmos fatos levantados pela outra assessora:

“Endosso as preocupações acerca do procedimento de escolha da agência responsável pela campanha e, assim, a recomendação de exame da questão pelos Ordenadores, de forma a se assegurar a correição do procedimento de execução contratual e a devida observância do princípio da impessoalidade. Chama-se atenção, aqui, para o curto prazo concedido para manifestação de interesse das agências cuja situação foi apontada como causa de impossibilidade pelas demais agências”.

Apesar disso, no dia 22 de fevereiro, a Superintendência de Publicidade deu andamento ao processo, que culminou no empenho para a Propeg.

Cenas antes da pandemia

As peças da campanha “Rio Abraça a Vacina” têm sido divulgadas nos últimos dias em diversos veículos, incluindo emissoras de TV. No início do vídeo de 1 minuto, disponível no YouTube, as pessoas se abraçam sem máscara em belas paisagens do Rio de Janeiro, em “cenas gravadas antes da pandemia”.

A partir de 20 segundos, já se remete à atual fase, com as pessoas com máscara. Apenas nos últimos 20 segundos do vídeo há a referência a medidas de prevenção necessárias como evitar aglomerações e usar máscara.

Na proposta inicial da Propeg que foi enviada ao governo estadual, sequer havia pessoas com máscaras nas peças estáticas da campanha, o que acabou mudando na versão final.

Outro lado

Abaixo a íntegra das perguntas do blog com as respostas enviadas pela Secretaria da Casa Civil:

  • Em primeiro lugar, queria saber se a Casa Civil tem ideia de qual a razão de a Propeg ter preparado uma campanha mesmo antes de ser oficialmente informada da necessidade.

“A apresentação de campanhas proativamente, independentemente de demanda do Governo do Estado, é uma prática usual do mercado publicitário, ou seja, de acordo com a conjuntura ou a situação do momento, a agência cria uma campanha e apresenta para o Governo. É uma prática esperada pelos clientes”.

  • No processo administrativo, não constam os e-mails enviados às agências. Exatamente em que data e horário eles foram enviados e qual exatamente o prazo que foi dado? Uma das agências falou em 48 horas.

“No processo consta a cópia da ata da Sessão Pública que literalmente descreve as etapas da seleção, responsável pela escolha da agência com base no Anexo X do Edital de Publicidade 2015, que corresponde ao Procedimento de Seleção Interna das empresas contratadas. Ressaltando que sobre tal e-mail como instrumento convocatório, informamos que se encontra no processo administrativo que tem como objeto a própria Sessão Pública por pertinência temática, onde apenas para esclarecer é configurado na seguinte ordem: convocação – ata de sessão – resultado da seleção.

Sobre a data e o prazo, informamos que foi encaminhado para todas as empresas contratadas no dia 21/01/2021, com até 48 (quarenta e oito horas) ÚTEIS de prazo com data para entrega até 26/01/2021. Neste sentido verifica-se que o prazo concedido foi até acima do estipulado”.

  • Por que foi dado um prazo tão curto se efetivamente o empenho para a agência só ocorreu em 22 de fevereiro e a campanha só começou a ir ao ar agora em março?

“Dada a urgência do assunto e os prazos praticados no dia a dia em uma agência de publicidade, o tempo solicitado para retorno não foge a prática de mercado.

Inicialmente, informamos que a tramitação de um processo administrativo é composta por atos complexos, com a participação de vários setores e de agentes públicos diversos, onde tratando-se de processo administrativo de Campanha de Publicidade, exige legalmente várias etapas, que se iniciam os procedimentos preparatórios nos seguintes setores: Secretaria de Estado de Saúde (órgão demandante da campanha em questão), a sua Chefia de Gabinete, Gabinete do Secretário, Assessoria de Comunicação, até a Secretaria da Casa Civil, Subsecretaria Geral, Assessoria de Gestão Estratégica, Superintendência de Publicidade, Diretoria Geral de Administração e Finanças, Assessoria Jurídica Especial e Coordenadoria de Planejamento DGAF.

Tendo em vista os diversos procedimentos que são realizados antes de uma campanha publicitária ir efetivamente ao ar, é necessário que a criação seja aprovada pelos órgãos competentes muito tempo antes de sua veiculação, por conta das diversas etapas descritas acima.

Assim, o prazo entre a apresentação, aprovação, processos administrativos internos, produção e veiculação da referida campanha está totalmente dentro do realizado usualmente.

Neste sentido, todas as Agências contratadas foram devidamente comunicadas pela Superintendência de Publicidade, rigorosamente no mesmo dia e horário, sobre a realização da Sessão Pública para a escolha da Agência que prestaria os serviços, fato este retratado na própria Ata da sessão respectiva.

Tal procedimento retrata o respeito não só ao princípio da impessoalidade, mas da legalidade, moralidade, publicidade e da eficiência do artigo 37 caput da Constituição Federal, além da isonomia no tratamento igualitário dispensado pela gestão do contrato, perante as empresas contratadas”.

  • Por que os documentos dessa contratação só entraram no SEI no dia 27 de janeiro se a sessão pública que definiu a contratada ocorreu no dia 26? 

“Não há obrigatoriedade prevista em lei, da gestão do contrato inserir no sistema no mesmo momento, mais uma vez faz parte da discricionariedade do agente público”.

*Imagem em destaque: Reprodução da campanha “Rio Abraça a Vacina”

3 comentários

  1. Interessante que o Governador Interino Claudio Castro, vem fazendo promessas aos diversos Municípios da Baixada e do Grande Rio, porém não consegue fazer um CALENDÁRIO ÚNICO DE VACINAÇÃO, para ser seguido por todos os Municipios do Estado do Rio de Janeiro. Está uma verdadeira bagunça, como sempre foi a saúde do Estado. Entretanto, contrata empresa de publicidade para fazer Campanha da Vacina – ” Rio Abraça a Vacina” – no valor de 13 milhoes, com previsão de gasto de 17 milhões, dinheiro este retirado do Fundo Estadual de Saúde.

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