Política Amazônia

Falta de dados oficiais trava fiscalização de madeira ilegal no Brasil

Segundo instituto da Amazônia, área explorada ilegalmente no Pará é mais do que o dobro da autorizada
Pirataria. Homens do Exército em operação para apreender madeira ilegal em Porto Velho: identificação do que é irregular ou não é feita por pesquisadores Foto: Cb Estevam / CComSEx
Pirataria. Homens do Exército em operação para apreender madeira ilegal em Porto Velho: identificação do que é irregular ou não é feita por pesquisadores Foto: Cb Estevam / CComSEx

RIO - Apesar de o Brasil ter o Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), há uma defasagem nos dados relativos às madeiras que circulam pelo território nacional, o que dificulta a fiscalização desse mercado. Isso se dá porque o sistema federal, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), é alimentado pelas secretarias de Meio Ambiente dos esta dos — e as pastas não o fazem de forma consistente. Além disso, os maiores produtores de madeira no país, Pará e Mato Grosso, têm sistemas próprios e, mesmo integrados ao Sinaflor, não passam suas informações ao Ibama.

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O sistema nacional foi lançado em 2018 e, caso tivesse seus dados completos, teria informações desde o início do projeto para a exploração da madeira até o destino final das toras extraídas.

— Só que sem os estados fornecendo as informações, o sistema não serve para muita coisa, não é possível saber o que é legal ou ilegal — diz a ex-presidente do Ibama Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima. — Cabe ao Ibama cobrar os dados, mas isso não é feito.

Informações cruzadas

Hoje, a identificação do que é legal ou não é feita por entidades de pesquisa, como o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e o Instituto Centro de Vida (ICV), que cruzam as informações de autorizações para exploração florestal com imagens de satélites.

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De acordo com o último levantamento do Imazon, com dados relativos a 2018, a exploração em áreas não autorizadas no Pará era, pelo menos, mais de duas vezes maior do que em áreas autorizadas: quase 27 mil hectares contra 11 mil hectares. Já no Mato Grosso, apesar de as áreas autorizadas serem maiores, a taxa de ilegalidade ainda é alta. Em 2019, dos 217 mil hectares explorados, quase 37%, ou 80 mil hectares, são em áreas sem autorização. Ainda não há um estudo consolidado que mostre esse percentual na região Amazônica como um todo.

Ainda segundo o levantamento, até aquele ano, 24% das autorizações para exploração florestal no Pará tinham inconsistências, como área autorizada para exploração desmatadas ou degradadas por queimadas.

— Quando você tem uma autorização para explorar, isso gera um crédito. Se você têm um crédito, por exemplo, para explorar dez mil metros cúbicos de madeira, mas sua área só é capaz de produzir dois mil, esse resto está vindo de um outro lugar, que não deve ser autorizado. Por isso a rastreabilidade é tão importante — explica o pesquisador do Imazon Carlos Souza Jr.

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Ainda que as taxas que indicam a ilegalidade da madeira sejam altas, elas estão longe dos patamares já vistos. No Pará, o uso de área não autorizada chegou a ser oito vezes maior do que a autorizada, o que representava, em hectares, uma diferença de 372 mil para 45 mil, em 2008. Já no Mato Groso, essa relação era de 91 mil hectares de área não autorizada para 36 mil hectares autorizados, em 2007.

A diminuição pode ser justificada com a queda drástica da produção de madeira no Brasil nas últimas duas décadas, que foi de 28,3 milhões de metros cúbicos de toras extraídas legalmente para 8,8 milhões, de acordo com o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). No entanto, a entidade observa que há uma migração da atividade madeireira para as regiões mais centrais da Amazônia.

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O Ibama informou que o Pará e o Mato Grosso conseguiram liminares na Justiça para não aderir ao Sinaflor. O instituto recorreu da decisão. Já a Secretaria do Meio Ambiente do Pará informou que judicializou a questão por uma exigência do Ibama de inserir dados antigos no sistema nacional, mas que não foi dado tempo necessário para isso. O Mato Grosso não respondeu.