Política CPI da Covid

Governo faz 'mutirão' e pede que ministérios preparem defesa contra 23 possíveis acusações na CPI da Covid

Lista inclui desde pressão de Bolsonaro por cloroquina à militarização de ministérios
O ministro da Economia, Paulo Guedes, conversa com o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Planalto em março deste ano: integrantes do governo estão na mira da CPI da Pandemia Foto: EVARISTO SA / AFP
O ministro da Economia, Paulo Guedes, conversa com o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Planalto em março deste ano: integrantes do governo estão na mira da CPI da Pandemia Foto: EVARISTO SA / AFP

BRASÍLIA — Preparando uma "operação de guerra" para a instalação da CPI da Covid nas próximas semanas, o Palácio do Planalto pediu a vários ministérios um relatório de todas as ações tomadas no combate à pandemia, principalmente em relação a temas em que o governo é mais atacado. Como o GLOBO revelou neste domingo , o Planalto montou um comitê de crise para se preparar para a CPI instalada no Senado.

O documento, enviado por e-mail, foi revelado pelo portal UOL e obtido também pelo GLOBO. Na divisão, cada ministério ficou encarregado de responder algumas das acusações feitas ao governo como, por exemplo, a de que o presidente Bolsonaro pressionou os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich a aprovarem o uso da hidroxicloroquina.

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Ao todo, são 23 acusações listadas pelo governo, divididas entre 13 ministérios. Parte dos pontos levantados tem como base um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a gestão do Ministério da Saúde na pandemia e uma investigação do Ministério Público Federal do Amazonas (MPF-AM), que já resultou em ação de improbidade contra Eduardo Pazuello e outras cinco autoridades da pasta e da secretaria estadual de Saúde.

O documento enviado aos ministérios é uma demonstração da preocupação do governo diante da CPI. O governo deseja produzir um arsenal para a defesa do ex-ministro Pazuello e também para blindar Bolsonaro.

A ideia é que o ex-ministro da Saúde, que deve assumir um cargo no Planalto, dedique o seu tempo a se debruçar sobre uma série de documentos, dados e informações oficiais que reforcem a narrativa de que o governo não foi omisso na pandemia nem na crise de falta de oxigênio em Manaus em janeiro. Também estará a sua disposição um grupo de trabalho formado por integrantes de diferentes ministérios — que fornecerá subsídios para defender as ações do governo.

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O plano envolve até a tentativa de interlocução com pessoas próximas ao senador Renan Calheiros (MDB-AL), indicado como relator da comissão. Nos últimos dias, o governo procurou uma aproximação com o ex-presidente José Sarney, que conversa semanalmente com Renan. O presidente Bolsonaro também ligou para Renan Filho, governador de Alagoas e primogênito do senador.

Para integrantes da CPI no Senado, a operação montada no Palácio do Planalto já era esperada e o objetivo será tentar desviar os assuntos para as acusações de corrupção nos estados e municípios.

— O objetivo vai ser fazer com que ela não avance, mas os fatos são evidentes, gritantes — afirmou Humberto Costa (PT-PE).

Responsável por propor a CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também minimizou a estratégia:

— O único confronto que estamos preocupados na CPI e contra a pandemia e o vírus. Se o presidente e seu governo têm a consciência que estão fazendo a coisa certa não precisam temer.

A tentativa de conter ou se aproximar de Renan também é vista com desconfiança. Apesar da procura por Sarney e a ligação para Renan Filho, pessoas próximas ao senador afirmaram que a possibilidade de o ex-presidente se envolver no assunto em defesa de Bolsonaro é pequena.

Além disso, a política de Alagoas pesa na postura de Renan e dificulta qualquer tentativa de aproximação com o Planalto: os principais adversários de Calheiros no estado estão mais próximos de Bolsonaro: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), e o senador Fernando Collor (PROS).

Confira quais acusações o governo espera ter de enfrentar e qual ministério ficou responsável pela resposta:

1 - O Governo foi negligente com o processo de aquisição e desacreditou a eficácia da CoronaVac (que atualmente se encontra no Plano Nacional de Imunização)

Saúde; Ciência e Tecnologia; Relações Exteriores

2 - O Governo minimizou a gravidade da pandemia (negacionismo)

Saúde

3 - O Governo não incentivou a adoção de medidas restritivas

Saúde

4 - O Governo promoveu tratamento precoce sem evidências científicas comprovadas

Saúde

5 - O Governo retardou e negligenciou o enfretamento à crise no Amazonas

Saúde; Defesa

6 - O Governo não promoveu campanhas de prevenção à Covid

Saúde; Comunicações

7 - O Governo não coordenou o enfrentamento à pandemia em âmbito nacional

Saúde; Ciência e Tecnologia; Defesa; Advocacia-Geral

8 - O Governo entregou a gestão do Ministério da Saúde, durante a crise, a gestores não especializados (militarização do Ministério)

Saúde; Economia

9 - O Governo demorou a pagar o auxílio-emergencial

Ciência e Tecnologia; Economia; Secretaria de Governo; Cidadania

10 - Ineficácia do Pronampe

Economia; Cidadania

11 - O Governo politizou a pandemia

Relações Exteriores; Secretaria de Governo

12 - O Governo falhou na implementação da testagem (deixou vencer os testes)

Saúde; Secretaria de Governo

13 - Falta de insumos diversos (kit intubação)

Saúde; Relações Exteriores

14 - Atraso no repasse de recursos para os Estados destinados à habilitação de leitos de UTI

Saúde; Economia; Secretaria de Governo

15 - Genocídio de Indígenas

Saúde; Defesa; Justiça; Gabinete de Segurança Instituicional; Mulher, Família e Direitos Humanos

16 - O Governo atrasou na instalação do Comitê de Combate à Covid

Saúde; Secretaria de Governo

17 - O Governo não foi transparente e nem elaborou um Plano de Comunicação de enfrentamento à Covid

Saúde; Comunicações; Secretaria de Governo

18 - O Governo não cumpriu as auditorias do TCU durante a pandemia

Saúde; Advocacia-Geral da União; Economia

19 - Brasil se tornou o epicentro da pandemia e "covidário" de novas cepas pela inação do Governo

Saúde; Ciência e Tecnologia; Secretaria de Governo

20 - Gen. Pazuello, Gen. Braga Netto e diversos militares não apresentaram diretrizes estratégicas para o combate à Covid

Saúde; Ciência e Tecnologia; Defesa; Secretaria de Governo

21 - O Presidente Bolsonaro pressionou Mandetta e Teich para obrigá-los a defender o uso da hidroxicloroquina

Saúde

22 - O Governo recusou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer

Saúde

23 - O Governo Federal fabricou e disseminou fake news sobre a pandemia por intermédio de seu gabinete do ódio

Saúde; Economia; Gabinete de Segurança Institucional