Rio Massacre do Jacarezinho

Mortes do Jacarezinho: Secretário de Polícia Civil diz que investigações vão esclarecer se houve execuções e defende ocupação de territórios

Na entrevista coletiva sobre o caso na semana passada, delegados haviam garantido que não houve execuções, negando acusações das familias dos mortos na operação
Allan Turnowski, secretário de Polícia Civil Foto: Gustavo Azeredo em 14-5-2009 / Agência O GLOBO
Allan Turnowski, secretário de Polícia Civil Foto: Gustavo Azeredo em 14-5-2009 / Agência O GLOBO

RIO — Após a polícia garantir que não houve execuções de suspeitos na operação do Jacarezinho — em respostas durante a primeira entrevista coletiva sobre o caso — o secretário de Polícia Civil,  Allan Turnowski, agora afirmou que é necessário aguardar as investigações antes de se tomar "conclusões precipitadas" e prometeu "transparência absoluta", com apoio do Ministério Público do Rio, na apuração. Em entrevista ao telejornal RJTV, da TV Globo, o secretário voltou a defender a ação policial, por entender que o confronto partiu de traficantes e que se tratava de uma situação excepcional, como determina a decisão do STF para permissão de operações em comunidades atualmente. Além disso, explicou ser a favor de uma política de ocupação de territórios, como era no período de UPP, mas que a decisão depende do governador.

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Houve execução?

Ingadado se houve execuções na operação, como acusam parentes dos mortos e instituições de defesa dos direitos humanos e a Ordem dos Advogados do Brasil, que citam até assassinatos após suspeitos estarem rendidos, o secretário disse que a resposta será dada pelas investigações. Durante a entrevista, ele foi perguntado mais de uma vez sobre as declarações de delegados, na primeira coletiva sobre o caso, que garantiam que a única execução na operação teria sido a do policial morto. Turnowski confirmou as respostas, mas disse que "não foram dadas" por ele. Na coletiva de quinta-feira, o subsecretário Rodrigo Oliveira e os delegados Felipe Curi, diretor do Departamento Geral de Polícia Especializada, e Fabricio Oliveira, chefe da Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais (Core), que acompanharam Turnowski na ocasião, negaram acusações de execução.

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O secretário afirmou não possuir elementos para acreditar em execução.

— Quando a polícia entra dentro de ambiente confinado, e foram várias casas segundo noticiado, o traficante tem duas opções: ou faz a família refém ou se esconde para ir para o confronto. As marcas que vi na televisão foram de confronto. Não houve família refém ou negociação, então a princípio nao tenho nada de concreto que me leve à execução. Porém MP (Ministério Público) desde o início está com a Polícia Civil, acompanhou os exames dos corpos, criou força-tarefa. Então a transparência será absoluta. Mas não podemos concluir antes de apurar.

A investigação será isenta?

Turnowski respondeu sobre as garantias de isenção sobre a investigação, principalmente considerando que, nos primeiros depoimentos à imprensa, representantes da Polícia Civil já afirmavam que não houve execução. Fato que, segundo o próprio Turnoswski, só pode ser esclarecido com a devida investigação.

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— A investigação que vai levar se houve ou não execução, assim como dizer se houve eventual chacina ou massacre. Julgaram antes da investigação. Com relação às testemunhas, uma disse que seu filho foi morto a facadas, e o exame não deu isso. Outra outra disse que o companheiro foi comprar pão, e que era trabalhador, mas vimos que eram traficantes fortemente armados, com prova contra todos eles —  disse o secretário, que defendeu a legalidade da operação diante da decisão do Supremo Tribunal Federal. —  Hoje a gente chegou a um protocolo de atuação, de comunicar o MP e acompanhar a investigação. Não é excepcional um traficante numa laje entrando em casa de morador? Tiro na cabeça de policial? Granadas dentro do Jacarezinho? A Polícia trabalhou dentro da legalidade.

Força-tarefa do Ministério Público

Nesta terça, o Ministério Público do Rio anunciou a criação de uma força-tarefa para acompanhar as investigações da Polícia Civil sobre o caso. Logo após o anúncio, Turnowski elogiou a iniciativa, em entrevista à TV Globo.

— É um apoio necessário. Precisamos de controle externo do MP para que as conclusões cheguem com confiança para a população. Temos apoio hoje de mais de 90% da população sobre nossa ação (afirmou, sem citar qualquer fonte).  — disse o secretário, que deu novas informações sobre episódios anteriores à operação. — Uma semana antes, líderes de uma facção disseram na cadeia que não aceitariam mais ação nos nossos territórios porque nós não combateríamos milícia. Primeiro tem o abuso de se mandar esse recado e segundo que no início dessa gestão prendemos 17 milicianos. Hoje, neutralizamos sete sem um tiro. Ou seja, a ação da polícia vai sempre de acordo com a reação.

O secretário explicou que o comportamento da polícia é uma reação a ataques.

— A reação da polícia depende da ação do criminoso. Traficantes do Jacarezinho atiravam para matar policial. No início da operação, balearam um policial na cabeça. Hoje é uma luta do Estado contra facção criminosa.

'Todos os corpos foram periciados'

O secretário também foi indagado sobre a acusação de ausência de perícia em todos os corpos de mortos durante a operação , o que ele negou. Além disso, a retirada de corpos antes da perícia no local, como denunciado por moradores, não prejudicaria o trabalho de investigação sobre a cena do crime, defendeu Turnowski.

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Como noticiou O GLOBO, registros de ocorrência mostram que 24 dos 27 corpos de suspeitos foram removidos sem perícia no local. Pelos registros, também é possível identificar que as mortes aconteceram em pelo menos dez pontos da favela. Não há, porém, informações sobre perícia em muitos dos locais.

— Todos os corpos foram periciados. Dentro de uma comunidade sob tiro, o policial tem que preservar a vida dele em primeiro lugar. Vamos imaginar que alguém atropelou uma pessoa e fugiu com o carro. Não posso fazer a perícia sem o carro? Consigo. É mesma coisa na comunidade. Vai dar para periciar pela parede, a troca de tiro, o local onde se encontrou o corpo. Tudo faz parte da investigação. Peço para que aguardem as investigações — explicou ele, que citou episódio de uma perita que teria sido alvo de tiros durante o trabalho na comunidade: — O terreno estava tão instável, eles estavam tão agressivos que uma perita nossa foi agredida a tiros, e se não é a Core fazendo a segurança, ela estaria morta.

As operações garantem segurança à sociedade?

Em uma pergunta enviada pelo presidente da ONG Rio de Paz, Antonio Carlos Costa, o secretário respondeu sobre as garantias que ações policiais dão de segurança para a sociedade e sobre qual a melhor política de segurança para o estado.

— Garanto que o Rio está muito mais seguro sem esses 27 criminosos neutralizados. Sobre a política de segurança, operações fazem com que esses agentes criminosos não sejam exemplo para criança. Acreditamos na política de segurança, até de ocupação, mas sempre com a polícia na frente. Não há como conviverem cidadão da comunidade, o traficante e a polícia. Ou é o traficante ou a polícia.

Volta de ocupação de territórios

Sobre uma política de segurança para o estado, Turnowski se posicionou a favor do retorno de um projeto de ocupação de territórios conflagrados, como era no período das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), apesar de suas críticas sobre o aviso prévio das operações, o que resultava na migração dos traficantes para outras regiões do estado.

—- Ocupação de território sou a favor. Com polícia e depois entram os serviços. Está sendo estudado e pode voltar, mas é decisão do governador.