Coronavírus

Por Laís Modelli, G1


Compare: o que Ernesto Araújo falou na CPI e o que disse quando estava no Itamaraty

Compare: o que Ernesto Araújo falou na CPI e o que disse quando estava no Itamaraty

A CPI da Covid ouviu nesta terça-feira (18), na condição de testemunha, o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo. Entre outros pontos, os senadores cobraram explicações sobre críticas à China, mobilização do Itamaraty para compra de cloroquina da Índia e sobre a demora em aderir ao Covax Facility e adquirir vacinas.

Em resumo, o chanceler afirmou:

  • Jamais ter provocado desavenças com o governo chinês;
  • não ter dificultado a adesão do Brasil ao consórcio internacional Covax Facility, liderado pela OMS;
  • que a condução da pandemia jamais esteve alinhada com o governo de Trump;
  • e que a cloroquina negociada com a Índia foi um pedido do Ministério da Saúde porque acreditava-se, em abril de 2020, que o medicamento era eficaz.

Antes, o chanceler:

Araújo esteve à frente do Itamaraty entre janeiro de 2019 e março de 2021. A gestão foi marcada, entre outras polêmicas, por negacionismo da pandemia e desavenças com a China, um dos principais parceiros comerciais do Brasil e também importante exportador de insumos para a vacina.

Em seu depoimento, o chanceler responsabilizou o Ministério da Saúde em várias ações das quais o Ministério das Relações Exteriores participou, como a importação da cloroquina e remédios sem eficácia para tratar a Covid e a decisão de aderir à cota mínima, de 10%, do consórcio Covax Facility para aquisição de vacinas, e não uma cota para imunizar 50% da população, conforme foi ofertado ao Brasil.

Ernesto Araújo: 'Não vejo, nos exemplos mencionados, hostilidade com a China'

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Relação com a China

DECLARAÇÃO NA CPI: Araújo disse: "Jamais promovi nenhum atrito com a China, seja antes, seja durante pandemia, de modo que o resultado que obtivemos na consecução de vacinas e outros aspectos decorre de uma política externa de acordo com nossos objetivos, mas não era de alinhamento aos Estados Unidos nem de enfrentamos com a China."

ATOS NO MINISTÉRIO: Enquanto ministro, Araújo:

Artigo de Ernesto Araújo sobre o coronavírus foi debatido na CPI — Foto: Reprodução

O QUE MAIS DISSERAM NA CPI SOBRE O TEMA? Senadores fizeram diversas questões sobre se houve impacto dessas críticas nas negociações para a compra de vacinas, insumos e equipamentos relacionados à pandemia. Araújo negou qualquer desavença com o governo chinês e qualquer responsabilidade no atraso e percalços nas negociações do imunizante vindo da China.

O relator da CPI, Renan Calheiros, rebateu o chanceler, citando um artigo assinado por Araújo intitulado "Chegou o comunavírus", publicado em abril de 2020. No texto, Araújo afirmou que "o vírus aparece, de fato, como imensa oportunidade para acelerar o projeto globalista. Este já se vinha executando por meio do climatismo ou alarmismo climático, da ideologia de gênero, do dogmatismo politicamente correto, do imigracionismo, do racialismo ou reorganização da sociedade pelo princípio da raça, do antinacionalismo, do cientificismo”.

Araújo negou que o artigo tenha sido sobre o governo chinês. “Eu acho que esclarecer isso é importante. O artigo não é absolutamente contra a China. A leitura do artigo deixa isso claro. A China é mencionada lateralmente em um ponto do artigo, em que comento a tese do texto de base, que diz que a China não é o modelo de sociedade comunista que ele tem em mente", disse o ex-ministro, falando que o artigo era sobre o livro "Vírus", de Slavoj Žižek.

Quando questionado qual a responsabilidade de os comentários sobre o coronavírus nas negociações entre Brasil e China sobre insumos e vacinas, Araújo respondeu: "Nenhuma". "Nada do que eu tenha feito pode ter levado a qualquer percalço no recebimento de insumos [da China e da Índia]", disse o depoente.

Relação com os EUA

DECLARAÇÃO NA CPI: Araújo disse: "Não houve alinhamento com os EUA ou qualquer outro país, houve uma aproximação. Mas o Brasil só entrou e embarcou em iniciativas do governo brasileiro. Jamais entramos em iniciativas só por que era iniciativa dos americanos", comentou

ATOS NO MINISTÉRIO: Sob a gestão de Araújo, o Brasil recebeu dos Estados Unidos dois milhões de unidades de cloroquina. Na época, em nota, o Itamaraty disse que a hidroxicloroquina seria usada “como profilático para ajudar a defender enfermeiros, médicos e profissionais de saúde do Brasil contra o vírus”.

Em setembro de 2020, Araújo recebeu o secretário de estado dos Estados Unidos, Mike Pompeo, em Boa Vista. O representante americano chegou provocar aglomeração e o ato foi criticado como apoio à reeleição de Trump.

Ernesto Araújo e Mike Pompeo, após anúncio de fundo para proteger a biodiversidade da Amazônia, em setembro de 2019 — Foto: Yuri Gripas/Reuters

O QUE MAIS DISSERAM NA CPI SOBRE O TEMA? Quando questionado por Renan Calheiros por que os EUA doaram dois milhões de unidades de cloroquina, remédio sem eficácia, e não de vacinas contra a Covid, Araújo afirmou que, na época de Trump, o governo americano não considerava doar vacinas para os países.

"São situações diferentes. Na estratégia deles [governo Trump] não havia disponibilidade dos imunizantes", afirmou. "No caso das vacinas, os EUA adotaram a proibição de exportação. Isso não foi dirigido ao Brasil, mas se colocou como uma barreira. Mas houve elementos concretos na qual a boa relação com o governo Trump nos ajudaram", disse o chanceler.

Adesão à iniciativa Covax

DECLARAÇÃO NA CPI: Araújo disse: "Jamais fui contra a iniciativa Covax. Assim que o Covax tomou forma, no começo de julho de 2020, após coordenação interna do Brasil, eu mesmo assinei carta dizendo que Brasil tinha interesse em entrar".

ATOS NO MINISTÉRIO: Sob a gestão de Araújo:

"Transferir poderes nacionais à Organização Mundial de Saúde, sob o pretexto (jamais comprovado!) de que um organismo internacional centralizado é mais eficiente para lidar com os problemas do que os países agindo individualmente é apenas o primeiro passo na construção da solidariedade comunista planetária", escreveu Araújo em abril de 2020.

O presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei que permite o país adquirir as vacinas do Covax somente em março deste ano. Diante do acordo firmado, o país deve um total de 42 milhões de doses e vai custar R$ 2,5 bilhões.

O QUE MAIS DISSERAM NA CPI SOBRE O TEMA? Ainda sobre o tema, outra polêmica envolvendo a inciativa Covax foi a quantidade de vacinas adquirida pelo Brasil. O acordo previa a possibilidade de cada país participante de optar por uma cobertura vacinal de 10% a 50% da sua população, mas o Brasil se decidiu pelo mínimo, de comprar o suficiente para imunizar apenas 10% dos brasileiros.

"A pergunta é clara: por que o senhor optou por 10%, contrário aos 50% de que o Brasil tinha direito?", questionou o senador Renan Calheiros mais de uma vez.

"Essa decisão [de optar pelo quantitativo de 10%], eu não conheço. Foi uma decisão, entendo, tomada pelo Ministério da Saúde", disse Araújo, culpando o então ministro da Saúde Eduardo Pazuelo.

Esforços para compra de cloroquina

DECLARAÇÃO NA CPI: Sobre esforços para comprar cloroquina da Índia, Araújo disse: “Naquele momento, em março, havia uma expectativa de que houvesse eficácia no uso da cloroquina para o tratamento da Covid, não só no Brasil. Havia notícias sobre isso de vários lugares do mundo. Houve uma grande corrida aos insumos da hidroxicloroquina e baixou precipitadamente o estoque de cloroquina. Fomos informados por isso pelo Ministério da Saúde no Brasil”.

ATOS NO MINISTÉRIO: Em setembro, quando já havia estudos apontando a ineficácia do medicamento, Araújo defendeu o medicamento em reunião com outros ministros das Relações Exteriores: "Sobre tratamento, o Brasil desenvolveu protocolos com bons resultados, empregando medicamentos não utilizados em outros lugares, especialmente a hidroxicloroquina, que, infelizmente, foi politizada, mas que está salvando vidas. E também estamos prontos para cooperar nessa área com qualquer país."

O QUE MAIS DISSERAM NA CPI SOBRE O TEMA? Segundo reportagem publicada no jornal "Folha de S. Paulo", telegramas trocados entre o Itamaraty e a Índia mostram que o então ministro Araújo queria garantir fornecimento de cloroquina mesmo após alerta de que o medicamento era ineficaz no tratamento da Covid. Os documentos mostram que Araújo consultou empresas e acionou o corpo diplomático no exterior em busca do medicamento.

Araújo confirmou a intermediação que fez como ministro das Relações Exteriores para a compra de cloroquina. "Sim, houve essa troca de mensagens". Porém, o chanceler justificou que acreditava-se na época que a cloroquina seria eficiente contra a infecção e que os estoques do medicamento estavam em baixa.

Calheiros lembrou o chanceler, no entanto, que, àquela altura das trocas dos telegramas com a Índia, a Organização Mundial da Saúde já havia interrompido os testes com cloroquina por razões de segurança, e que várias entidades médicas do Brasil já haviam alertado para os riscos de efeitos colaterais. Em sua defesa, Araújo lembrou que a OMS chegou a retormar o estudo com a cloroquina, mas não relembrou que logo depois, em junho, a organização suspendeu definitivamente os testes.

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