Por Marcela Mattos, Gustavo Garcia e Sara Resende, G1 e TV Globo — Brasília


Executivo da Pfizer diz na CPI que governo ignorou ofertas de vacina

Executivo da Pfizer diz na CPI que governo ignorou ofertas de vacina

Nas mais de cinco horas de depoimento à CPI da Covid nesta quinta-feira (13), o gerente-geral da Pfizer para a América Latina, Carlos Murillo, relatou aos senadores as seis vezes em que a farmacêutica tentou, sem sucesso, vender a vacina contra a Covid-19 ao governo brasileiro.

Murillo foi convocado a explicar à comissão parlamentar de inquérito as tratativas com o Brasil sobre o imunizante.

Na sessão, ele contou que as propostas da farmacêutica foram feitas entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021.

O cronograma inicial da Pfizer previa a entrega, caso não houvesse atrasos, de 1,5 milhão de doses ainda em 2020 e outras 2,5 milhões até março deste ano – o que não aconteceu, já que as negociações não avançaram.

De acordo com o executivo, ainda no ano passado foram cinco propostas – todas não acatadas – de venda de 30 ou 70 milhões de doses ao Brasil. Em fevereiro deste ano houve mais uma tentativa, dessa vez de 100 milhões de doses.

O acordo entre o governo brasileiro e a Pfizer somente foi fechado em 19 de março, com a previsão inicial de entrega de 100 milhões de doses. Na última terça-feira (11), o Ministério da Saúde anunciou a aquisição de mais 100 milhões de doses.

As primeiras doses da Pfizer começaram a chegar ao país somente no fim de abril. De acordo com o Ministério da Saúde, até o momento foram distribuídas 1,6 milhão de doses.

“Eu queria dizer que nós estamos diante de uma teoria que orientou este governo. Este governo foi orientado para deixar o povo brasileiro largado para adquirir imunidade de rebanho. Naturalmente, não investiu naquilo que é o instrumento para construir imunidade coletiva, que é a imunização”, afirmou o senador Rogério Carvalho (PT-SE).

“Este governo não fez isolamento, [mas] impediu isolamento. Este governo proibiu o uso de máscaras e expandiu a pandemia”, acrescentou o senador.

CPI da Covid: Depoimento do gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo

CPI da Covid: Depoimento do gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo

Reuniões

A CPI quis saber com quem o executivo da Pfizer se reuniu para tratar das vacinas. Murillo contou que, no âmbito do Ministério da Saúde, as negociações aconteciam principalmente com o ex-secretário-executivo Élcio Franco.

Com o então ministro Eduardo Pazuello, segundo disse, foram somente dois contatos — o primeiro, conforme o relato, em novembro do ano passado, quando já haviam sido ofertadas as vacinas ao menos cinco vezes.

Na ocasião, Pazuello ligou para o executivo dizendo estar “à disposição para continuarmos a conversação”, segundo Murillo. Somente no dia 22 de dezembro, ele e o então ministro se reuniram pela primeira vez.

Carlos Murillo também contou que teve reuniões com o ministro da Economia, Paulo Guedes, com o secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, Carlos da Costa, e com o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten.

O gerente da Pfizer confirmou que enviou uma carta endereçada ao presidente da República, Jair Bolsonaro, ao vice Hamilton Mourão e a ministros ainda em setembro do ano passado, e só obteve uma resposta dois meses depois, quando recebeu um e-mail de Wajngarten.

Segundo Murillo, as negociações aconteciam com o Ministério da Saúde. Ele admitiu à CPI, no entanto, que havia o “entendimento” de que as conversas com Wajngarten seriam “de uma possível coordenação dele”, mas negou qualquer tipo de “negociação paralela”.

“Não tivemos negociação paralela com o senhor Wajngarten. A Pfizer procurou diferentes autoridades governamentais durante o processo para assegurar que o processo ia caminhar”, disse.

Pfizer confirma reunião com Wajngarten e Carlos Bolsonaro

Pfizer confirma reunião com Wajngarten e Carlos Bolsonaro

Carlos Bolsonaro

Carlos Murillo também confirmou a participação do vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, e do assessor especial da Presidência Filipe Martins — o mesmo que, segundo a Polícia Legislativa, cometeu crime de preconceito durante uma audiência no Senado — em reunião com a empresa durante as tratativas sobre a venda de vacina.

Segundo o executivo, entre os participantes da reunião estavam o ex-secretário de Comunicação Social Fabio Wajngarten; a diretora jurídica da empresa, Shirley Meschke; e a gerente de relações governamentais Eliza Samartini.

O encontro aconteceu no Palácio do Planalto e tinha como objetivo discutir entraves relacionados aos aspectos legais da aquisição do imunizante.

A informação sobre a reunião foi repassada por Shirley Meschke durante o depoimento de Murillo à CPI. No início da sessão, ele havia sido questionado pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) sobre a participação de Carlos e Filipe em reuniões com representantes da empresa.

Murillo disse que não poderia confirmar a participação dos dois em reuniões das quais não participou e chegou a dizer que a empresa somente tratou com "autoridades oficias do governo do Brasil". O relator, então, ameaçou convocar as duas representantes da Pfizer para prestar esclarecimentos. Duas horas depois, o gerente-geral da farmacêutica confirmou a presença de Carlos Bolsonaro e Filipe Martins.

'Cláusulas leoninas'

Murillo ainda comentou o argumento do Ministério da Saúde de que a Pfizer exigia "cláusulas leoninas" no contrato.

Em janeiro, a pasta divulgou uma nota em que apontava que a farmacêutica pediu que o Brasil renunciasse à soberania de ativos no exterior como garantia de pagamento pelas doses da vacina.

Entre outras dificuldades apontadas pelo governo brasileiro à época, estavam pedidos de isenção da Pfizer em caso de efeitos colaterais da vacina e de não punição em caso de atraso na entrega das doses.

Em março, porém, o governo brasileiro acabou acatando o contrato conforme inicialmente previsto, depois que o Congresso aprovou medida autorizando a aceitação das cláusulas. Murillo ressaltou que as cláusulas foram assinadas pelos 110 países com os quais a empresa firmou contrato.

“Não concordo com o qualificativo de cláusulas leoninas. Nesta pandemia, a Pfizer correu um risco sem precedente em uma situação sem precedente, que requeria que todo mundo colaborasse com esse processo. Por isso é que a Pfizer exigiu a todos os países as mesmas condições que exigiu para o Brasil”, afirmou o executivo.

VÍDEOS: executivo da Pfizer na CPI

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