Por Memória Globo

Frame de vídeo/Globo

Às 16h20 de 2 de outubro de 1992, uma sexta-feira, 341 policiais da Tropa de Choque de São Paulo receberam ordens para invadir o Pavilhão 9 da Casa de Detenção, no Complexo do Carandiru. Os soldados deveriam conter uma rebelião dos presos. Vinte minutos após a invasão, a PM abandonou o local. Na ação, mais de 100 presos foram mortos. O fato ficou conhecido como Massacre do Carandiru e entrou para a história como a mais violenta ação dentro de uma penitenciária brasileira. 

Em setembro de 2002, os últimos detentos deixaram o Carandiru e foram transferidos para unidades do interior do estado de São Paulo. O complexo penitenciário foi desativado e, em seguida, demolido.

Reportagem de Caco Barcellos sobre a invasão da Polícia Militar ao Carandiru, Jornal Nacional, 05/10/1992.

Reportagem de Caco Barcellos sobre a invasão da Polícia Militar ao Carandiru, Jornal Nacional, 05/10/1992.

Primeiras informações e imagens

O Jornal Nacional de 3 de outubro exibiu uma reportagem de Isabela Assumpção com imagens do motim no presídio, com presos correndo sobre os telhados dos pavilhões e parentes do lado de fora do prédio desesperados à espera de notícias.

Reportagem de Isabela Assumpção sobre o início da rebelião dos presos do Carandiru e os rumores de que o número de mortos seria superior a 100, Jornal Nacional, 03/10/1992.

Reportagem de Isabela Assumpção sobre o início da rebelião dos presos do Carandiru e os rumores de que o número de mortos seria superior a 100, Jornal Nacional, 03/10/1992.

Os presos do Pavilhão 9 haviam queimado colchões e incendiado as celas. A tropa de choque cercou o Carandiru, e os policiais entraram com cães, bombas e armas pesadas. Os detalhes da tragédia, no entanto, só seriam divulgados depois. O balanço oficial da Secretaria de Segurança Pública contabilizava 111 mortos, 35 feridos e 3.500 tiros disparados, tendo 540 acertado seus alvos. Todos os mortos eram detentos.

No domingo, 4 de outubro, o Fantástico noticiou a abertura de dois inquéritos, um da polícia civil e outro da polícia militar, além de uma sindicância interna na Casa de Detenção para investigar o excesso de violência dos policiais na invasão. No programa, foram ao ar as primeiras imagens do interior do presídio, fotos feitas por uma comissão de representantes de entidades de defesa dos direitos humanos, obtidas pelo repórter Caco Barcellos.

Reportagem de Caco Barcellos com fotos exclusivas do interior do Carandiru após a invasão. Fantástico, 04/10/1992.

Reportagem de Caco Barcellos com fotos exclusivas do interior do Carandiru após a invasão. Fantástico, 04/10/1992.

TESTEMUNHO DOS SOBREVIVENTES

Autor do livro Rota 66, no qual denunciava a existência de um esquadrão da morte dentro da Polícia Militar de São Paulo, Caco Barcellos foi um dos primeiros jornalistas a entrar no presídio depois do massacre. Isso aconteceu no dia 5 de outubro, quando o acesso ao Pavilhão 9 foi liberado à imprensa.

O Jornal Nacional daquela noite exibiu uma matéria em que o repórter mostrava as marcas da destruição do Carandiru e ouvia a versão dos sobreviventes sobre a atuação policial. Segundo os depoimentos, a violência havia começado na escadaria de acesso ao segundo andar. Os presos contaram ainda que muitos feridos foram atirados dos andares mais altos pelo vão do elevador .

Autor do livro Rota 66, no qual denunciava a existência de um esquadrão da morte dentro da Polícia Militar de São Paulo, Caco Barcellos foi um dos primeiros jornalistas a entrar no presídio depois do massacre. Isso aconteceu no dia 5 de outubro, quando o acesso ao Pavilhão 9 foi liberado à imprensa.

O Jornal Nacional daquela noite exibiu uma matéria em que o repórter mostrava as marcas da destruição do Carandiru e ouvia a versão dos sobreviventes sobre a atuação policial. Segundo os depoimentos, a violência havia começado na escadaria de acesso ao segundo andar. Os presos contaram ainda que muitos feridos foram atirados dos andares mais altos pelo vão do elevador .

REPERCUSSÃO NACIONAL E INTERNACIONAL

Na sexta-feira seguinte, 9 de outubro, a falência do sistema carcerário brasileiro foi tema do Globo Repórter. O programa apresentou uma reportagem de Tonico Ferreira mostrando que a tragédia no Carandiru refletia a situação calamitosa dos presídios em todo o país.  A repercussão internacional do massacre também foi apresentada no programa. 

Reportagem de Tonico Pereira sobre a repercussão internacional do massacre no Carandiru, Globo Repórter, 09/10/1992.

Reportagem de Tonico Pereira sobre a repercussão internacional do massacre no Carandiru, Globo Repórter, 09/10/1992.

O Massacre do Carandiru atingiu o alto escalão do governo de São Paulo. Em 7 de outubro, o secretário de Segurança Pedro Franco de Campos, responsável pela ordem de invasão do presídio, pediu demissão do cargo. No mesmo dia, o então governador de São Paulo, Luiz Antônio Fleury, reconheceu que a atuação da PM fora criminosa. O diretor do Carandiru, José Ismael Pedrosa, e mais três oficiais envolvidos no massacre foram afastados, entre eles o comandante do Gate, Wanderley Mascarenhas, que admitiu ter disparado rajadas de metralhadora contra os presos. 

O massacre foi noticiado no mundo inteiro. Nos Estados Unidos, centenas de emissoras de TV exibiram imagens da rebelião. Jornais americanos e europeus usaram palavras como “sangrento”, “atrocidade” e “massacre”. O Brasil foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização de Estados Americanos (OEA), o maior organismo de monitoramento do respeito aos direitos humanos no continente. A acusação baseava-se nas evidências de uso indiscriminado da violência, como o fuzilamento de presos com armas como fuzis Colt AR-15, submetralhadoras HK e Beretta. 

OS RESPONSÁVEIS

A Justiça Militar abriu um inquérito e indiciou 121 policiais militares. Um ano depois, em outubro de 1993, o Jornal Nacional informou que o processo continuava em andamento sem nenhum resultado prático. 

Em 1996, o caso foi transferido para a Justiça Comum, mas, durante o período, grande parte das acusações – como as de lesão leve e grave – prescreveu. Muitos dos envolvidos continuaram na polícia, alguns tendo sido inclusive promovidos. 

Em resposta à ação movida pela mãe de um dos detentos que pedia indenização pela morte do filho, ainda em 1996, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que a ação da PM na invasão do Carandiru havia sido legítima. O Jornal Nacional do dia 4 de maio divulgou trecho do documento que declarava que “a culpa foi das vítimas, que iniciaram a rebelião, destruíram todo um pavilhão do Carandiru e forçaram a sociedade, através da Polícia Militar, a se defender”. A reportagem que destacou essa decisão da Justiça foi de José Roberto Burnier.

Reportagem de Roberto Burnier sobre a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que considera legítima a ação da Polícia Militar na invasão ao Carandiru, Jornal Nacional, 04/05/1996.

Reportagem de Roberto Burnier sobre a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que considera legítima a ação da Polícia Militar na invasão ao Carandiru, Jornal Nacional, 04/05/1996.

UBIRATAN GUIMARÃES

Em 28 de novembro de 2000, o Jornal Nacional anunciou o julgamento do coronel da reserva Ubiratan Guimarães, que comandara a invasão do Carandiru. Em oito anos, o processo sobre o caso já acumulava 150 volumes e mais de 20 mil páginas. O julgamento começou em 20 de junho de 2001 e durou dez dias. As sessões foram acompanhadas pelo repórter Caco Barcellos. Mas o tribunal não pôde ser filmado, e a Globo teve que usar simulação feita por computador para mostrar a  localização dos defensores, acusação, juiz, júri e réu . O perito Osvaldo Negrini, que fizera o laudo do massacre, explicou aos jurados que 75% dos presos morreram nas celas por disparos feitos de fora para dentro, concluindo que não houvera confronto e que a intenção da polícia era matar. 

Reportagem de Caco Barcellos sobre o julgamento do Coronel Ubiratan Guimarães, que comandou a invasão ao Carandiru, Jornal Nacional, 20/06/2001.

Reportagem de Caco Barcellos sobre o julgamento do Coronel Ubiratan Guimarães, que comandou a invasão ao Carandiru, Jornal Nacional, 20/06/2001.

Ubiratan Guimarães foi responsabilizado por 111 mortes e cinco tentativas de homicídio. Foi condenado a 632 anos de prisão em regime fechado. Entretanto, sendo réu primário, tendo comparecido a todas as etapas do processo e mantido endereço fixo, o coronel pôde recorrer da sentença em liberdade. Cinco anos mais tarde, a sentença foi anulada, e Ubiratan foi absolvido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Ele foi encontrado morto no seu apartamento, com um tiro no abdome, em 9 de setembro de 2006. 

JULGAMENTO

Em 2013 teve início um novo julgamento dos policiais envolvidos no massacre. Por causa do número grande de réus e vítimas, foi dividido conforme os pavimentos do antigo pavilhão da Casa de Detenção.

Em abril, 26 policiais da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar) que invadiram o 2º pavimento do Pavilhão 9 foram a júri. Eles respondiam por 15 das 111 mortes que aconteceram no massacre. A Globo acompanhou os depoimentos das testemunhas, advogados, promotores e réus. A acusação afirmava que os policiais agiram com excesso, já a defesa, que o processo não deixava claro a conduta de cada policial durante a invasão. 

Depois de seis dias de julgamento, foi anunciada a sentença na madrugada de domingo, 21 de abril. Vinte e três policiais do batalhão tático foram condenados a 156 anos de prisão pela morte de 13 presos. Três foram absolvidos por não terem entrado junto com a tropa no 2º pavimento. E duas mortes foram retiradas do processo por não haver comprovação de que foram causadas por policiais.

A segunda fase do julgamento começou em 29 de julho daquele ano. Dessa vez, 25 policiais, também da Rota, foram condenados a 624 anos de prisão pelas mortes de 52 detentos que aconteceram no 3º pavimento do Pavilhão 9. A sentença foi anunciada na madrugada do dia 3 de agosto. 

Em março de 2014, dez policiais do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) foram a julgamento pela morte de oito detentos no 5º pavimento do pavilhão durante o massacre. Todos foram condenados a 96 anos de prisão, com exceção de um que, por ter antecedentes criminais, teve pena de 104 anos. 

A quarta e última etapa do julgamento chegou ao fim em 2 de abril de 2014,  quando 15 policiais do COE (Comando de Operações Especiais) foram condenados a 48 anos de prisão pela morte de quatro detentos do 4º pavimento. No final, 73 policiais foram condenados por 77 das 111 mortes que aconteceram no massacre. Todos, no entanto, podem recorrer em liberdade. Três réus foram absolvidos por falta de provas. 

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