Brasil Meio Ambiente

Desmatamento na Amazônia bate recorde em 12 anos, mostra relatório do ISA

Instituto Socioambiental destaca que, em em dois anos de governo Bolsonaro, devastação do bioma aumentou 48,31%; unidades de conservação e terras indígenas foram afetadas
Grandes campos em desmatamento próximo à BR319, na cidade de Realidade (AM) Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
Grandes campos em desmatamento próximo à BR319, na cidade de Realidade (AM) Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

RIO — Um levantamento divulgado nesta quarta-feira pelo Instituto Socioambiental (ISA) aponta que, em 2020, a taxa de desmatamento na Amazônia Legal Brasileira foi a maior em 12 anos. Dentro das unidades de conservação, este índice avançou 48,3% no biênio 2019-2020, o primeiro do mandato de Jair Bolsonaro, em comparação a 2017-2018.

A análise foi feita a partir do detalhamento de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que apontam ainda que, somente no ano passado, 1.085.100 hectares de floresta foram destruídos, sendo o Pará o estado mais atingido.

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Nas terras indígenas, o desmatamento no biênio 2019-2020 avançou 42,5%. Das 382 áreas analisadas pelo Inpe, 174 registraram devastação em seu interior.

Segundo o estudo, entre as 20 terras com maior histórico de pressões e conflitos com garimpeiros, grileiros e madeireiros, o desflorestamento cresceu, em média, 534% nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro.

As unidades de conservação (UCs) de uso sustentável administradas pelo governo federal foram as mais áreas mais afetadas pelo aumento do desmate no último biênio, com alta de 129,8% em relação ao visto entre 2017 e 2018. Sua gestão é feita pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e que tem sofrido com cortes orçamentários nos últimos anos. As UCs federais perderam aproximadamente 52.187 hectares de floresta no ano passado.

Seguindo a mesma tendência, as Áreas de Proteção Ambiental geridas pelo Ministério do Meio Ambiente tiveram um aumento de 90,8% na taxa de desmatamento, enquanto nas estaduais a alta foi de 58,2%. As áreas mais destruídas foram as florestas nacionais do Jamanxim e de Altamira.

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Para Alana Almeida de Souza, pesquisadora do ISA e especialista em Sensoriamento Remoto, a devastação indicada pelo levantamento é reflexo da atuação impune de atividades ilegais, como o garimpo, a grilagem de terras, a invasão de madeireiros e grandes empreendimentos. O campo, assim, sofre impactos como o aumento do conflito por terras, a perda de biodiversidade, a contaminação de rios e o prejuízo à saúde de populações locais.

— No governo de Bolsonaro e (do ministro do Meio Ambiente) Ricardo Salles o que enxergamos são casos de punição de servidores que tentam combater as invasões e a intensificação do desmatamento — aponta Souza, autora do levantamento do ISA. — Vemos a impunidade favorecer o próprio ministro, envolvido em irregularidades na extração de cargas de madeira da Amazônia.

Souza destaca, também, a redução do orçamento dedicado a ações de fiscalização, o que contradiz a promessa do governo de acirrar o combate a delitos ambientais:

— É surpreendente ver que quase 50% da floresta está sendo destruída, ao mesmo tempo em que o governo diz que reduzirá o desmatamento até o ano que vem — destaca a pesquisadora. — Desmatar implica em violência no campo, contaminação da água por mercúrio por conta do garimpo, interferência na cadeia alimentar de animais e extermínio de povos e da biodiversidade.

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Ações do Ministério do Meio Ambiente

A uma semana da Cúpula de Líderes sobre o Clima, ocorrida em abril, o governo federal apresentou o Plano Amazônia 2021/2022, que visa nortear a conservação do bioma nos próximos dois anos. O programa, no entanto, não apresenta dados sobre o efetivo e os recursos necessários para cumprir seu objetivo — considerado pouco ambicioso — de reduzir a taxa de desmatamento a até 8,7 mil km². Trata-se de um valor 16% superior ao visto em 2018, último ano antes do início do mandato de Jair Bolsonaro.

Na contramão, o polo de agronegócio no Sul do Amazonas, que começou a ser desenhado por ruralistas em 2019 e ganhou apoio do governo federal, transformou-se numa nova frente de desmatamento, grilagem e conflitos por terra na Amazônia. A área, batizada de Amacro — iniciais de Amazonas, Acre e Rondônia —, reúne 32 municípios dos três estados e integra um levantamento feito pelo Greenpeace que aponta os atuais eixos de grilagem de terras na Amazônia. Ela se junta a localidades que chamam atenção há mais tempo, como Altamira, Novo Progresso e São Félix do Xingu, no Pará.

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A destruição da floresta em ritmo acelerado tem repercutido no exterior e pode impedir a ratificação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia (UE) , que considera esforços de mitigação contra efeitos do aquecimento global.

Procurado pelo GLOBO, o Ministério do Meio Ambiente ainda não retornou.

*Estagiária, sob supervisão de Renato Grandelle