Política CPI da Covid

Documento sobre Covaxin que Palácio do Planalto diz que não existe está em sistema do Ministério da Saúde

Material obtido pelo GLOBO contradiz versão apresentada pelo ministro Onyx Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência
O ministro Onyx Lorenzoni Foto: Fatopress/12-1-2021 / Agência O Globo
O ministro Onyx Lorenzoni Foto: Fatopress/12-1-2021 / Agência O Globo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto contestou a existência e autenticidade de um recibo sobre a importação de doses da vacina Covaxin que foi apresentado por um servidor numa denúncia feita ao presidente Jair Bolsonaro. Mas o documento, obtido pelo GLOBO, está disponível no sistema do Ministério da Saúde, ao qual integrantes do governo têm acesso.

Em um pronunciamento sem direito a questionamentos, o ministro Onyx Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência, e o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Élcio Franco levantaram suspeitas com relação a uma cópia de uma fatura de importação apresentada por Luis Ricardo Miranda e seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), sobre a compra da Covaxin. O servidor disse, em entrevista ao GLOBO, ter avisado o presidente Jair Bolsonaro das suspeitas em relação ao processo de importação.

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No pronunciamento no Palácio do Planalto, Onyx e Élcio Franco afirmaram que há indícios de que a fatura apresentada pelos irmãos Miranda não era verdadeira ou teria sido forjada para prejudicar o presidente Bolsonaro. Com base nisso, o governo pediu uma investigação para Polícia Federal, a Procuradoria-Geral da República e a Controladoria-Geral da União (CGU).

— É evidente que vamos pedir que os peritos da PF façam a análise dos dois documentos. São evidentes as diferenças entre eles — alegou Onyx.

Primeira versão do documento

O documento contestado pelo ministro está disponível no sistema do Ministério da Saúde e pode ser acessado por integrantes do governo. O recibo tem a data de 19 de março de 2021 e, segundo Luis Ricardo Miranda, foi o motivo para que ele contrariasse seus chefes e se recusasse a dar aval ao processo.

O pagamento antecipado no valor de U$ 45 milhões era endereçado para a Madison Biotech, apontada como uma subsidiária da Bharat Biotech, fabricante da vacina Covaxin, que não constava do contrato assinado com o Ministério da Saúde.

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Além disso, a fatura previa a aquisição de 300 mil unidades da vacina. A Precisa afirmou se tratar de um “erro material” por estar se referindo a frascos, cada um com 10 doses de vacina.

Segunda versão

Após o envio do primeiro recibo, um novo documento foi encaminhado ao Ministério da Saúde. Desta vez, a Precisa corrigiu o total de doses de 300 mil para 3 milhões, mas ainda manteve a previsão de pagamento antecipado.

Segundo o relato de Miranda, no dia 20 de março, ele e seu irmão se reuniram com o presidente Jair Bolsonaro e o alertaram sobre as pressões que Luis Ricardo estaria sofrendo e sobre a previsão de pagamento adiantado à subsidiária da Bharat Biotech. Ainda de acordo com o servidor, Bolsonaro teria prometido que levaria o assunto à Polícia Federal.

Terceira versão

Três dias depois do encontro, em 23 de março, o Ministério da Saúde continuou o processo de importação da vacina. Em um e-mail, um servidor da pasta pediu a uma executiva da Precisa Medicamentos que a empresa retificasse a fatura justamente porque o documento ainda continha a previsão de pagamento adiantado.

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O funcionário enviou o e-mail às 22h35 do dia 23 de março, segundo documentos obtidos pelo GLOBO. A empresa respondeu às 22h54 informando que pediu a correção do documento e que o estava enviando naquele momento.

Procurada, a Precisa argumenta que corrigiu o “erro material” sobre o pagamento antecipado em 20 minutos após ser acionada pelo ministério. A empresa confirma a existência dos três documentos, contrariando a versão do governo.

Questionado sobre o fato de o documento apresentado pelo servidor do ministério da Saúde ao presidente Bolsonaro ser idêntico àquele que consta no sistema do Ministério da Saúde, Onyx Lorenzoni não se manifestou.