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Política

Novas frentes da CPI da Covid miram atuação do Planalto na crise da Saúde

Investigações incluem pressão da Casa Civil por vacinas e divulgação de fake news pelo 'gabinete do ódio'
Sessão da CPI da Covid 24/06/2021 Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Sessão da CPI da Covid 24/06/2021 Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

BRASÍLIA —  Enquanto apura indícios de corrupção e de omissão em relação à compra de vacinas, a cúpula da CPI da Covid volta a sua mira para o Palácio do Planalto. Integrantes da comissão têm reunido informações sobre a atuação durante a pandemia de ministros do governo, de aliados mais próximos de Jair Bolsonaro e dos filhos do presidente. O objetivo é mapear os principais personagens da cadeia de comando do grupo suspeito de praticar irregularidades no Ministério da Saúde.

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A CPI da Covid recebeu informações de que decisões estratégicas e políticas na Saúde foram disparadas pelo Planalto ao então número dois do Ministério da Saúde, Elcio Franco, sem passar pelo então ministro, Eduardo Pazuello. Franco, que ocupava o posto de secretário executivo, era o responsável pelas negociações de vacinas. O contato direto, segundo os dados em poder da CPI, se dava com a Casa Civil, à época comandada por Walter Braga Netto.

Outro foco do colegiado tem como personagem central Roberto Dias, ex-diretor de Logística do ministério. Ele confidenciou a pessoas próximas que recebia pressão do Planalto para que o processo de compra da vacina indiana Covaxin andasse com mais rapidez. Durante o depoimento de Dias, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que o ex-diretor recebia ordens diretas da Casa Civil. E, nas palavras do senador, Dias preparou “um dossiê” com essas informações.

— O senhor sabe que o senhor fez um dossiê para se proteger. Eu estou afirmando, eu não estou achando. Nós sabemos onde está esse dossiê e com quem está. Não vou citar nomes para que a gente não possa atrapalhar as investigações. O senhor recebeu várias ordens da Casa Civil por e-mail, lhe pedindo para atender... Era “gente nossa”, “essa pessoa é nossa”. Isso foi durante o tempo todo em que Vossa Excelência está nesse cargo — afirmou Aziz.

O ex-diretor de logística foi preso em flagrante pela comissão por perjúrio, pagou fiança e foi liberado.

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Senadores admitem, entretanto, que esta frente ainda necessita de mais informações que corroborem os dados já em análise.

Ainda assim, a ideia de convocar Braga Netto para prestar depoimento tem sido semeada por oposicionistas desde o início dos trabalhos da comissão. Há um receio, no entanto, de que a medida poderia criar um desgaste institucional com as Forças Armadas, já que Braga Netto é o ministro da Defesa.

— Eu já apresentei requerimento de convocação do general Braga Netto, já apresentei requerimento de convocação do (Luiz Eduardo) Ramos (ex-titular da Secretaria de Governo, hoje na Casa Civil). Entendo que eles têm explicações a prestar — disse Alessandro Vieira (Cidadania-SE), suplente da comissão.

Sem convocação

Por ora, não está nos planos da cúpula da CPI convocar Braga Netto ou Ramos , como afirmou Aziz.

Nos próximos dias, o colegiado também pretende levantar mais informações sobre suspeitas de fraudes em contratos envolvendo hospitais federais no Rio de Janeiro — que eram administrados por um militar aliado de Pazuello. O caso foi revelado em maio pelo “Jornal Nacional”.

Mirando no Planalto, a CPI também tem se planejado para colher o depoimento do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni. Para senadores da oposição, o aliado do presidente Bolsonaro é suspeito de coagir uma testemunha-chave para a comissão, o servidor Luis Ricardo Miranda, do Ministério da Saúde. Em entrevista ao GLOBO, ele denunciou indícios de irregularidades no processo de importação da vacina indiana Covaxin. Onyx acusou o funcionário público e o seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), de terem forjado um documento que, na verdade, existia e se encontrava no sistema do governo federal. O relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), pediu a convocação de Onyx para explicar o episódio — Aziz já acenou positivamente.

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Em outra frente, a CPI está olhando com lupa a relação entre o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e o empresário Francisco Maximiano, dono da Precisa Medicamentos, que fechou um contrato de R$ 1,6 bilhão com o Ministério da Saúde para fornecer vacinas Covaxin. Aliados do primogênito do presidente, como uma servidora do Planalto e advogados, estão mira do colegiado, que analisa ainda movimentações financeiras a partir das quebras de sigilos bancários.

Flávio chegou a intermediar um encontro de Maximiano com representantes do BNDES para tratar da possibilidade de empréstimo para uma outra companhia do empresário, conforme revelou a revista “Veja”. O senador afirma que, na ocasião, Maximiano apresentou uma proposta para instalação de fibra ótica no Nordeste. Flávio negou qualquer relação com as negociações em torno da Covaxin e afirmou que Renan tem em seu gabinete um organograma com sua foto e a de pessoas com as quais se relaciona para lhes acusar seja do que for.

Gabinete do ódio

A CPI da Covid também esquadrinha a atuação do chamado “gabinete do ódio”, grupo que reúne assessores do Planalto responsáveis pela comunicação do presidente, suspeitos de disseminar notícias falsas, inclusive na pandemia. Esses auxiliares e outras cinco pessoas ligadas a Carlos e Eduardo, filhos de Bolsonaro, tiveram os sigilos telefônico e telemático quebrados pela comissão.

Procurados pelo GLOBO, Onyx, Ramos e Braga Netto não se manifestaram, assim como Eduardo e Carlos Bolsonaro. A assessoria de Flavio Bolsonaro compartilhou vídeos divulgados anteriormente nas redes sociais nos quais o senador nega ter qualquer relação comercial ou financeira com o empresário Francisco Maximiano, da Precisa.

Os personagens centrais das próximas investigações

Onyx Lorenzoni

Para senadores, ele tentou coagir duas testemunhas da CPI, o servidor Luis Ricardo Miranda e seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), ao levantar suspeitas de que eles teriam forjado um documento que, na verdade, existia e estava no sistema do governo.

Walter Braga Netto

A CPI pura se a Casa Civil, então comandada por Walter Braga Netto, hoje à frente da Defesa, expedia ordens diretamente para a secretaria-executiva do Ministério da Saúde, que concentrou os processos de compra de vacinas.

Eduardo Pazuello

A cúpula da Comissão Parlamentar de Inquérito pretende levantar mais informações sobre suspeitas de fraudes em contratos envolvendo hospitais federais no Rio de Janeiro. Essas unidades de saúde eram administrados por um militar aliado do ex-ministro.

Flávio Bolsonaro

O primogênito do presidente Jair Bolsonaro intermediou um encontro do empresário Francisco Maximiano, dono da Precisa Medicamentos, com com representantes do BNDES para tratar de temas de interesse de uma outra empresa de Maximiano.

Carlos Bolsonaro

A CPI esquadrinha as suspeitas de que o chamado gabinete do ódio, formado por assessores do Palácio do Planalto que seriam ligados a Carlos Bolsonaro, teria disseminado notícias falsas durante a pandemia, inclusive sobre temas ligados à Covid-19.