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Política

André Mendonça recorre a Omar Aziz, adversário de Bolsonaro, e ajusta discurso na reta final por vaga no STF

Advogado-Geral da União intensifica campanha no Senado por posto de Marco Aurélio Mello e pede voto a presidente da CPI
André Mendonça em solenidade no
Palácio do Planalto Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
André Mendonça em solenidade no Palácio do Planalto Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

BRASÍLIA — Com a disputa pela vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) entrando na reta final — o ministro Marco Aurélio Mello se aposenta hoje —, o advogado-geral da União, André Mendonça, intensificou a campanha no Senado e direcionou os pedidos de apoio até mesmo a um dos maiores opositores do presidente Jair Bolsonaro: o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM). Na tentativa de quebrar resistências, Mendonça tem pregado, junto a outros senadores, um receituário feito sob medida: critica a Operação Lava-Jato, promete não criminalizar a política e defende a separação entre os Poderes — ponto sensível aos que se queixam da “judicialização” da atividade parlamentar.

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Mesmo com a peregrinação, os obstáculos ainda são significativos: ainda que Bolsonaro tenha afirmado que o plano é indicar o advogado-geral da União, a campanha por Mendonça ainda não atraiu o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), como revelou ontem o colunista Lauro Jardim, do GLOBO. Na oposição, Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, já expôs que a aprovação terá dificuldades.

Ligação providencial

Na última quinta-feira, Mendonça participou de um jantar com os senadores Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso; Soraya Thronicke (PSL-MS); Zequinha Marinho (PSC-PA); e Luís Carlos Heinze (PP-RS). O encontro ocorreu na casa do advogado Fábio Medina Osório, ex-advogado-geral da União. Por volta das 23h, Soraya recebeu uma ligação de Aziz — a parlamentar passou o celular a Mendonça, que aproveitou a oportunidade para pedir o voto do opositor de Bolsonaro.

Pastor presbiteriano, Mendonça disse para Aziz que, se o deputado Silas Câmara (Republicanos-AM) não o convencesse a apoiá-lo, ninguém mais conseguiria cumprir a tarefa. Pastor da Assembleia de Deus, Câmara foi eleito deputado pelo Amazonas, mesmo estado de Aziz, e é uma liderança proeminente da bancada evangélica no Legislativo. Bolsonaro afirmou reiteradas vezes que o seu próximo indicado ao STF seria alguém “terrivelmente evangélico”.

Para reforçar o pleito, o advogado-geral da União disse a Aziz: “Você tem aqui alguém que vai lutar pelo senhor”. O presidente da CPI respondeu que Mendonça não precisava se preocupar com ele e que poderia contar com o seu apoio na busca pelos votos no Senado. Aziz, entretanto, fez um alerta: acrescentou que era importante Bolsonaro entrar em ação, ou seja, utilizar a força do governo para ajudar na articulação.

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Bolsonaro e Aziz têm travado uma disputa pública. O presidente da República já chamou o senador de “bandido”. O parlamentar, crítico ferrenho da gestão do governo federal na pandemia, desafiou o titular do Palácio do Planalto a responder publicamente se foi avisado sobre as suspeitas de irregularidades na compra da vacina Covaxin.

Para chegar ao Supremo, o indicado é sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Caso passe pelo crivo do colegiado, o nome segue à apreciação do plenário, onde são necessários 41 dos 81 votos para aprová-lo. A votação é secreta.

Com relação a outro adversário, a tarefa será mais complexa: para Renan, o nome do advogado-geral da União deverá ser rejeitado na Casa.

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— Bolsonaro se preocupou em buscar um “terrivelmente evangélico” e não alguém que preencha os requisitos necessários para uma vaga tão importante como é a de um ministro do Supremo Tribunal Federal — disse o senador ao GLOBO.

Sabendo dessa ferrenha resistência — Davi Alcolumbre (DEM-AP), ligado ao governo, tampouco tem se empenhado pelo advogado-geral da União — , Mendonça procurou o ex-presidente José Sarney, que exerce influência sobre lideranças do MDB no Senado, incluindo Renan. O objetivo do advogado-geral da União em construir uma ponte com Sarney foi o de desfazer a imagem de “lavajatista”, já que, ao longo da carreira, atuou em pautas anticorrupção — parlamentares implicados na operação desconfiam que o escolhido de Bolsonaro poderá impulsionar a agenda no Supremo.

Governo otimista

Apesar do cenário incerto para Mendonça, são raríssimos os casos em que o Senado reprova indicados ao Supremo. Isso aconteceu apenas cinco vezes em 131 anos de existência da Corte — todas elas em 1894, no governo do marechal Floriano Peixoto. Para evitar que a história se repita, o Planalto escalou os senadores Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso, e Fernando Bezerra (MDB-PE), líder no Senado.

— Avalio que, oficializada a indicação de Mendonça pelo presidente, a aprovação dele será certa. Até pelo trabalho que Mendonça tem feito de conversa e interlocução com o Senado — disse Gomes.