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Número de mortes por Covid-19 mais que triplica entre adultos de 30 a 49 anos

Aumento de óbitos nessa faixa etária foi o maior nos primeiros sete meses deste ano comparado a todo 2020, aponta levantamento de Época; especialistas destacam impacto da vacinação em idosos
Paciente em UTI de hospital na cidade de Ribeirão Preto (SP) Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Paciente em UTI de hospital na cidade de Ribeirão Preto (SP) Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

RIO - Embora tenham aumentado em quase todas as faixas etárias ao longo de sete meses de 2021, as mortes por Covid-19 no Brasil cresceram mais entre adultos com idades de 30 a 49 anos, na comparação com todo o ano passado. Nesta faixa etária, os óbitos em decorrência ou por suspeita da doença mais que triplicaram nesse período, segundo levantamento feito por Época baseado no Portal da Transparência do Registro Civil, com dados de todos os cartórios brasileiros.

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O número de vítimas da doença também foi maior que o dobro em outras duas faixas etárias levando em conta o mesmo período. Adultos entre 50 a 59 anos morreram 170,5% a mais, enquanto aqueles de 20 a 29 anos, 152,4%. A partir dos 60 anos, a alta começa a ser bem menor, o que atesta o impacto da vacinação nesses grupos. Entre os acima de 90 anos, houve queda na quantidade de mortes.

Especialistas apontam que o cenário é reflexo do recrudescimento da pandemia, que atingiu sua fase mais crítica no último semestre, e consequentemente, da falta de acesso ao sistema de saúde em meio a seu colapso. Segundo eles, apesar da alta generalizada de mortes, o impacto foi menor em idosos devido à vacinação, já que este grupo foi o primeiro a ser imunizado.

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A faixa etária em que se observou aumento mais significativo foi a de 30 a 39 anos, cujos óbitos por Covid-19 cresceram 219,2% até o último dia 23. Entre 40 a 49 anos, o salto foi de 207% no mesmo período comparado com os números contabilizados desde março do ano passado, quando foi registrada a primeira morte por coronavírus no Brasil. Juntos, esses grupos correspondem a pouco menos de um terço dos habitantes do país e integram a população economicamente ativa (PEA), que vai dos 15 aos 65 anos, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Maior exposição

De acordo com a infectologista Rosana Richtmann, do Instituto Emílio Ribas, essa faixa etária foi mais afetada em termos proporcionais devido à maior circulação do vírus somado ao fato de essa parcela da população estar sendo vacinada somente a partir dos últimos meses. Além disso, ela explica que é um grupo mais exposto no dia a dia.

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— A maioria dessa população tem que sair de casa, trabalhar, pegar transporte público. A exposição acaba sendo maior e em locais de alta circulação viral, onde há mais oportunidade de se entrar em contato com o vírus. Tem a ver com o vírus circulando e com o fato de essa população só estar sendo vacinada agora — disse Richtmann.

— Muitas mortes poderiam ter sido evitadas se a gente tivesse uma assistência melhor. Tem gente que não conseguiu nem ter assistência. Isso tem a ver também com toda a infraestrutura nacional.

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Piora da pandemia

Em meados de março, o Brasil começou a entrar em sua fase mais crítica da pandemia, com recordes diários de infecções e óbitos por Covid-19. Impulsionada pelo surgimento da variante Gama, também identificada como P.1, a segunda onda no país resultou no colapso da rede de saúde em meio à sobrecarga das UTIs, que operavam além da capacidade. Até o final de abril, menos de 14% da população brasileira havia sido vacinada com pelo menos uma dose, segundo dados da plataforma Our World in Data.

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Para o infectologista Julio Croda, professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) e pesquisador da Fiocruz, o excesso de mortes está associado ao sistema de saúde combalido e à falta de gestão da pandemia. Ele ressalta que não há estudos que comprovem que a variante Gama agrave as infecções, embora seja mais transmissíveis

— O excesso de óbito é isso: quando você tem um colapso do sistema de saúde e as pessoas que poderiam ser salvas inclusive de outras doenças não têm acesso. É por conta da tragédia que a gente viveu. A variante gama ajudou por ser mais transmissível, mas foi a nossa falta de políticas públicas para a contenção do vírus que favoreceu isso. Faltou gestão da pandemia — afirmou Croda.

Além da Covid-19, os dados do Portal de Transparência do Registro Civil podem incluir óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).

Vacinação dos mais jovens

Entre os adolescentes, o aumento também foi menos acentuado, da ordem de 62,2% na faixa etária de 10 a 19 anos. Para os especialistas, tal dado comprova que esse grupo deve ser imunizado por último, após o término da vacinação nos maiores de 18 anos. Já os menores de 9 anos morreram 55% a menos esse ano, segundo o painel do registro civil, cujos dados são atualizados diariamente, conforme prazos estipulados por lei e sujeitos a correções.

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— Crianças e adolescentes têm representado uma fração sempre muito menor, são menos acometidos proporcionalmente em comparação às outras idades. Provavelmente por terem menos receptores ao vírus. Essa razão não é muito clara, mas é provável que tenha a ver com essa adesão do vírus nas vias respiratórias que na criança é menor — explica o infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

— Esses dados demonstram que esse grupo deve ser o último a ser vacinado. É o que menos aumenta, confirmando que é menos acometido.

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Mesmo no fim da fila da imunização, não se exclui a necessidade de os adolescentes serem vacinados. Isso porque eles contribuem para a transmissão do vírus. A proteção desse grupo contra a doença, portanto, representaria uma ação importante no controle da pandemia.

— É indiscutível que o impacto nessa faixa etária é bem diferente do impacto nas demais. Vai chegar a hora desse pessoal se vacinar. E precisa. Há estudos mostrando que adolescente é bom transmissor do vírus. Não é só pensando na proteção do adolescente, mas em termos de controle da pandemia. A prioridade, porém, é acabar toda a população acima de 18 anos — defende Richtmann.